Ana Cláudia Leocádio - AGÊNCIA CENARIUM
BRASÍLIA (DF) - Um grupo de indígenas Guarani Kaiowá da Terra Indígena (TI) Panambi-Lagoa Rica, de Douradina (MS), fechou a Esplanada dos Ministérios, na tarde desta quinta-feira, 8, em Brasília. O protesto foi realizado em frente ao edifício do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) para pressionar a pasta a recebê-los e ouvir as reivindicações pelo fim da violência no território, que nos últimos dias deixou dezenas de feridos.
Com cantos e cartazes, os indígenas pedem que o MJSP retire os grupos de fazendeiros e homens armados que estão de prontidão no território, que foi retomado pelos Guarani Kaiowá em 2005. A Terra Indígena está em processo de demarcação pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), porém o procedimento foi suspenso pela Justiça Federal em 2016 e segue parado.
De acordo com o representante da Atyguasu Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul no Conselho Nacional dos Povos Indígenas (CNPI), Gilmar Veron Alcântara, desde o início da semana, eles tentavam um encontro com o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, mas não houve resposta. Bastaram dez minutos de protesto, fechando a Esplanada dos Ministérios, para que uma comitiva de indígenas fosse recebida.
“Durante essa reunião quem nos atendeu foi a secretária Sheila de Carvalho e também o secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo. Relatamos para ele a situação que nós estamos vivenciando lá no Mato Grosso do Sul”, disse Alcântara. As principais reivindicações, relatou, são pelo fim da violência conta os guarani-kaiowá, com o reforço da segurança, e retirada dos grupos armados pelos fazendeiros, e a celeridade no processo de demarcação da Terra Indígena.
No relato de Alcântara, o secretário nacional de Segurança Pública assegurou que será criado um comitê emergencial, em conjunto com outros ministérios, como o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Funai, Ministério Público Federal, exclusivamente para tratar dos problemas relacionados ao povo Guarani Kaiowá de Mato Grosso do Sul.
“Ele (o comitê) vai tratar exclusivamente com relação à questão da própria demarcação, para dar prioridade na demarcação, para dar também serenidade no processo que teve os conflitos, as pessoas que feriram, que atacaram nossa comunidade para que a gente possa ter justiça”, afirmou.
O cacique da TI Panambi Lagoa Rica, em Douradina, Celso Alziro, disse que são cerca de dois mil indígenas na área retomada, localizada a pelo menos 60 metros de distância das caminhonetes com seguranças armados, que passam, muitas vezes, a noite com os faróis acesos sobre os acampamentos, causando medo e desconforto nos indígenas.
Alziro relata que no último ataque ele foi chamado pelo chefe da Força Nacional para ser avisado de que nada poderia ser feito se ele não se retirasse com os indígenas do local, caso houvesse um tiroteio. Em seguida, ocorreu o tiroteio que feriu dez pessoas, cinco em estado grave, segundo o cacique. Agora, ele espera retornar à TI e conversar com o novo comandante da Força Nacional, uma vez que o Ministério da Justiça reforçou o contingente de soldados para evitar novos episódios de ataques contra os indígenas.
“Se não tiver demarcação para o povo guarani vai continuar sempre assim, nós morrendo. Eles não morrem porque têm armas, nós só tem (sic) apenas maracá, ‘tacuapu’ e reza. É isso”, disse Alziro, ao final da reunião no MJSP.
Também integravam a comitiva no MJSP, a antropóloga do povo Atyguasu Guarani Kaiowá, Valdelice Veron, que relatou os atos de violência ocorridos nos últimos meses na Terra Indígena, o coordenador da Atyguasu, Norivaldo Mendes, e membros do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
O indígena guarani kaiowá Otávio João, que estuda Licenciatura em Educação do Campo na Universidade Federal de Dourados (MS), disse que só não é atingido pelos tiros porque se esconde e que agora está estudando para defender na academia as teses da ancestralidade de seu povo naquele território.
Uma de suas armas será a defesa do trabalho de final de curso intitulado “Memória Ancestral do Povo Guarani Kaiowá antes da chegada dos colonos, antes de surgir o projeto dos governos CAND (colônia agrícola de Dourados)”. Com isso, espera desmontar os argumentos dos ruralistas, que sustentam ser donos das terras naquela região bem antes dos indígenas Guarani Kaiowá.
Segundo a Funai, a TI Panambi-Lagoa Rica foi delimitada pela autarquia em 2011. Possui 12.196 hectares, porém a demarcação foi impedida por ações judiciais que estão no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), que fica em Dourados, município de Mato Grosso do Sul.
A CENARIUM procurou o MJSP para comentar as reivindicações dos indígenas em reunião realizada nesta quinta-feira, 8, e destacar quais ações efetivamente serão empregadas na região para garantir a proteção dos povos originários. Até o fechamento da reportagem não houve retorno.
Levantamento de áreas
Na última terça-feira, 6, a ministra dos Povos Indígenas (MPI), Sônia Guajajara, participou de diálogos com os indígenas guarani kaiowá e com ruralistas e fazendeiros, em Mato Grosso do Sul, após os ataques do fim de semana.
De acordo com informações da pasta, ficou acordado após encontro com o governador do MS, Eduardo Riedel (PSDB), que o Estado e o MPI farão um levantamento das áreas alvo de disputa para encontrar soluções.
“Não tenho dúvida que todos esses conflitos que estão se acirrando agora são por conta da lei do marco temporal, a 14.701. Todas as terras que estão judicializadas no Brasil serão mapeadas. Temos que olhar uma a uma e ver quais dessas terras têm condições de serem destravadas”, declarou a ministra na ocasião.
Guajajara disse, ainda, que os estados alvos de denúncias diárias contra indígenas, além do Mato Grosso do Sul, são Rio Grande do Sul, Paraná e Bahia, e que o ministério irá “sistematizar todas essas áreas para apresentar uma proposta ao presidente Lula para destravar esses processos demarcatórios e acabar com os conflitos”.
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