Beatriz Araújo - AGÊNCIA CENARIUM
MANAUS (AM) – Com o tema “Sistema Judiciário Brasileiro e Povos Indígenas: Diálogos Iniciais para Sensibilização, Justiça e Reparação“, a Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Amazonas (OAB-AM) promoveu um evento alusivo ao Dia Internacional dos Povos Indígenas, na Escola Superior de Magistratura do Amazonas (Esmam), nesta segunda-feira, 12, localizada na Zona Centro-Sul de Manaus. O encontro resultou em uma relação de recomendações para os membros do Judiciário, Executivo e Legislativo do Amazonas.
O debate foi realizado em forma de mesa de conversa sob a coordenação da Comissão de Amparo e Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da OAB-AM, presidida pela advogada Inory Kanamari, com a participação da promotora de Justiça do Ministério Público do Amazonas (MP-AM), Romina Brito, do promotor do MP-AM, Vitor Fonseca, e da professora de Direito na Toronto Metropolitan University, Priscylla Joca (via videoconferência), mediados pela jornalista Paula Litaiff, diretora de Redação da CENARIUM.
A cerimônia de abertura do evento contou com a presença do presidente da OAB-AM, advogado Jean Cleuter, e do diretor da Esman, desembargador Flávio Pascarelli. Para Cleuter, a iniciativa contribui para o aperfeiçoamento do Judiciário.
"A OAB do Amazonas vem trabalhando para contribuir com o melhoramento do sistema judiciário por meio de eventos como este". O desembargador Pascarelli parabenizou a atuação da presidente da Comissão dos Povos Originários. "Importante iniciativa que é consonante ao trabalho do Judiciário", disse.
O debate foi norteado, inicialmente, pela conclusão do trabalho de pesquisa da professora Priscylla Joca em parceria com Inory Kanamari, via a Organização Não Governamental (ONG) Mayuruna, no qual retratou os desafios de povos originários no acesso ao Judiciário na cidade de Atalaia do Norte (a 1.126 quilômetros de Manaus).
"A pesquisa teve como objetivo realizar escuta sobre as demandas do Povo Matsés acerca
de violações aos seus direitos e sobre as dificuldades que enfrentam no acesso à Justiça", apontou a professora, que disse ter observado a ausência da magistrada da comarca do município, gerando prejuízo na análise das ações para a posterior emissão de sentenças.
De acordo com Priscyla, a magistrada estabelecia um prazo de cinco dias para que os documentos fossem entregues ao Judiciário. O tempo de viagem da aldeia até a cidade é de 15 dias, sendo assim, o tempo era insuficiente e o processo era arquivado. "A situação é um retrato das dificuldades enfrentadas pelos povos originários no Amazonas", observou a professora.
Inory Kanamari afirmou que a falta de profissionais que conheçam a realidade dos povos também dificulta o acesso aos direitos e ao Judiciário, além da inexistência de magistrados indígenas. “A falta de magistradas e outros profissionais do sistema de Justiça que possam estar próximos da realidade vivida pelos povos indígenas traz consequências profundas, não só para o acesso à Justiça, mas também para a efetivação de outros direitos”, argumentou.
Visibilidade
Ainda de acordo com Inory Kanamari, o evento realizado na Esman é uma oportunidade de dar visibilidade aos povos indígenas e trazer à luz a realidade vivida por eles. “O evento é extremamente importante porque leva mais de nós para a sociedade. Somos o Estado mais indígena do Brasil, mas, infelizmente, não somos conhecidos e reconhecidos, isso gera muito preconceito, nos afasta do sistema de Justiça e por isso nós precisamos estar em espaços que nos permitam ter visibilidade”, reivindicou.
O promotor e membro do Grupo Nacional de Direitos Humanos (GNDH), Vitor Fonseca, destacou as medidas que devem ser adotadas pela Defensoria Pública, Tribunal de Justiça, Tribunal de Contas, Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), entre outros órgãos para assistir os povos originários.
“As instituições públicas precisam desenvolver um protocolo de ação para casos que envolvam pessoas indígenas, todos precisam estar capacitados para atender os povos indígenas, inclusive com intérpretes, se for necessário. Verificar as necessidades específicas, colocar em prática a interculturalidade, tudo isso precisa ser pensado. O acesso à Justiça efetivo precisa passar por esse olhar para os povos indígenas”, sugeriu.
A promotora Romina Brito e membro do Grupo Nacional dos Direitos Humanos (GNDH), Romina Brito, afirmou que tem expandido os estudos para contribuir no combate ao preconceito com os povos. “Nós temos ampliado o nosso conhecimento, pois o combate ao preconceito só acontece com conhecimento e proximidade com os povos indígenas”, disse.
Mediadora da roda de conversa, a jornalista Paula Litaiff destacou os fatores norteadores do evento que foram: a análise do cenário atual do sistema judiciário do Amazonas e seu atendimento nas comunidades indígenas, a carta de recomendações para as esferas governamentais, o combate à xenofobia nos espaços de poder e a ampliação da cobertura jornalística sobre o assunto.
“Sabemos que há uma invisibilização da realidade judiciária nas comunidades indígenas do Amazonas e de todo o Brasil seja por ignorância seja por xenofobia, e a imprensa é fundamental na cobertura destes desafios. Apesar de previstos na Constituição Federal desde 1988, os direitos dos povos indígenas são omitidos todos os dias e é nossa obrigação, como jornalistas, resgatar essa pauta junto aos poderes vigentes, independentemente, de datas celebrativas", apontou Litaiff, durante o evento.
Assista ao vídeo completo do debate no canal da Escola Superior de Magistratura (Esmam), no YouTube.
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