O fenômeno das adaptações de livros para o cinema e streaming continua movimentando não apenas as bilheteiras e as plataformas de vídeo, mas também as livrarias.
A relação entre literatura e audiovisual tem se mostrado cada vez mais cooperativa e impulsionadora para o mercado editorial. A transformação de obras literárias em produções cinematográficas ou televisivas não apenas amplia o alcance das histórias, mas também costuma gerar um expressivo aumento nas vendas dos livros originais.
Exemplos recentes desse impacto podem ser observados nas obras da escritora Colleen Hoover, que dominou as listas de mais vendidos da Amazon no Brasil em 2024. 'É Assim que Acaba' alcançou o terceiro lugar, seguido por 'É Assim que Começa'. O livro 'Verity' aparece em oitavo.
Para aprofundar essa discussão e entender melhor como as adaptações influenciam o comportamento dos leitores, o portal da TV Cultura entrevistou Rafaella Machado, editora-executiva das editoras Record e Verus.
"Hoje em dia, não é toda adaptação que converte em vendas. Temos muita oferta de streaming e nem todas as obras geram esse efeito. Mas quando existe um fandom forte, a história acaba se retroalimentando: quem leu quer ver o filme e quem viu o filme muitas vezes passa a procurar o livro", explica Rafaella.
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O caso de 'É Assim que Acaba' é um exemplo claro dessa dinâmica. Segundo o grupo editorial Record, o livro teve seu melhor desempenho de vendas em 2024 justamente em agosto, mês de estreia da adaptação nos cinemas brasileiros. O mesmo fenômeno se repetiu com 'Verity'. O suspense alcançou o maior número de exemplares vendidos até então em novembro de 2024, quando a atriz Anne Hathaway foi anunciada como protagonista do longa. O recorde foi superado apenas em abril de 2025, após a divulgação da data de estreia do filme, prevista para maio de 2026. Vale ressaltar que ambos os livros estão entre os mais vendidos da Editora Record na Bienal do Livro de 2025.
A entrevistada destaca que o impacto costuma ser mais visível após o lançamento da produção audiovisual. "O maior aumento nas vendas acontece depois que o filme ou a série estreiam. Muitas vezes os direitos são comprados, mas a adaptação não vai para frente, o que deixa o público em expectativa, mas sem efeito imediato nas vendas", afirma. Para aproveitar esse momento, a editora costuma adotar estratégias como o lançamento de sobrecapas com a arte do filme , parcerias com livrarias em shoppings com cinema para oferecer ingressos, e o envio de influenciadores literários para assistir às produções em primeira mão e gerar burburinho.
A interação entre livro e filme também tem papel importante na formação de novos leitores. Rafaella acredita que as adaptações funcionam como um incentivo à leitura, especialmente para quem ainda não conhecia o livro original. "A adaptação audiovisual muitas vezes democratiza o acesso. Ela estimula o não leitor a buscar o livro. Vimos isso acontecer com ‘É Assim que Acaba’, que ganhou um novo fôlego depois do filme", explica. Ela complementa que uma adaptação bem recebida pelo público gera curiosidade no espectador para mergulhar mais na história, se emocionar novamente, e entender as diferenças entre a obra original e a adaptação.
A editora-executiva também ressalta que o envolvimento dos autores nas adaptações pode ser decisivo para o sucesso nas livrarias. "Geralmente, quando é uma obra que tem muito leitor, muito fã, eles costumam envolver a autora nessa parte da adaptação do roteiro. E isso costuma fazer com que a obra seja mais bem sucedida". A fidelidade à história original é crucial, pois a frustração dos fãs com uma adaptação muito diferente pode colocar em risco o sucesso da produção audiovisual. No entanto, Rafaella pontua que o risco é geralmente maior para a produção audiovisual do que para o livro, já que o sucesso do livro já está estabelecido.
Segundo ela, o maior desafio do mercado editorial continua sendo alcançar o público que não tem o hábito de leitura. "A gente tem uma base de leitores que, para o tamanho do nosso país, ainda é pequena. Por isso, quando a adaptação é bem feita, ela acaba funcionando como um convite para que mais pessoas conheçam o universo do livro", completa.
Rafaella conclui que a indústria editorial só tende a ganhar com as adaptações audiovisuais, pois mesmo que uma adaptação não seja bem-sucedida ou muito diferente do original, as vendas do livro não são impactadas negativamente.
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