Fundação Padre Anchieta

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Cem dias depois da chegada da pandemia de covid-19 ao Brasil, quem ainda está se esforçando para cumprir a quarentena em casa – o que significa continuar renunciando a saídas que não sejam essenciais – tem se assustado ao circular pelas ruas.

A constatação é de que muita gente já adotou uma postura de normalidade, sem a preocupação de evitar saídas desnecessárias. Há aqueles que parecem considerar que tudo se resolve apenas usando máscara, enquanto outros tantos nem isso têm feito.

Sensação de pânico

“Estou percebendo uma reversão absurda nos conceitos”, diz a produtora aposentadora e ceramista Norma Santos, 61 anos. “Quem continua tomando as precauções adequadas está sendo visto com estranheza, como se fosse exagero.”

Norma segue firme na decisão de continuar em quarentena até que surjam indícios claros de controle da situação – ou seja, a queda sustentada, por pelo menos duas semanas, no número de contaminações.

Ela demorou 25 dias para dar a primeira saída da quarentena e, desde então, esteve poucas vezes nas ruas – e sempre por razões realmente necessárias. Desde que aderiu ao isolamento social, sequer encontrou pessoalmente a filha única, Alice, 23 anos, embora ambas morem em São Paulo. “Decidimos fazer assim, por mim e por ela, que tem asma. A gente se fala umas quatro vezes por dia, mas o abraço está fazendo muita falta”, conta Norma.

Nas ocasiões em que precisou sair de casa, ela diz ter sentido algo parecido com pânico, por conta das atitudes descuidadas das outras pessoas. São essas atitudes que a tornam pessimista quanto à volta da normalidade em curto prazo. “Não vejo como a situação possa mudar nos próximos meses”, avalia.

Questão de sobrevivência

Há quem esteja precisando romper o isolamento pela necessidade de retomar o trabalho. É o caso da florista Marina Gurgel Prado, 34 anos, sócia da floricultura A Bela do Dia, sediada na Vila Madalena, em São Paulo.

A floricultura ficou quase três meses fechada, entre 16 de março e 11 de junho. Os salários dos sete funcionários só puderam ser honrados porque cerca de 80 clientes aceitaram continuar pagando a assinatura durante esse período, como crédito para quando as atividades do estabelecimento fossem retomadas. “Agora precisamos trabalhar dobrado para honrar esses compromissos”, diz Marina.

A decisão de reabrir a floricultura se baseou na constatação de que não havia mais como adiar: o negócio não sobreviveria se continuasse fechado. E os compromissos com os clientes precisavam ser cumpridos.

Revolta com o descaso

Todas as precauções possíveis foram tomadas. “Os clientes não estão circulando pela loja, como antes. O atendimento é no balcão”, descreve Marina. O horário de funcionamento foi reduzido e a equipe está fazendo uma escala para diminuir o número de pessoas no local. As recomendações de higienização de ambientes compartilhados, como banheiro, computador e bancada, são rigorosas.

Equipamentos de proteção individual foram comprados para os funcionários – incluindo máscaras, óculos, avental e um face shield para cada um. Além disso, os lanches fornecidos à equipe estão sendo entregues em embalagens individuais.

“Diante de tudo isso, da necessidade de voltar ao trabalho para sustentar famílias e de todos os cuidados que estamos tendo, é revoltante ver cenas das pessoas simplesmente passeando pelas ruas e pelos parques”, diz Marina.

A florista até poderia ter, supostamente, uma postura mais relaxada em relação à doença. O marido foi contaminado logo no início, com comprovação por exame, e tanto ela quanto os dois filhos pequenos, de um ano e de três anos e meio, tiveram sintomas, embora não tenham sido testados para covid-19.

Na casa do milhão

Neste mês, o Ministério da Saúde publicou uma portaria com orientações para a suposta retomada segura do convívio social e das atividades em locais públicos. Foi um reforço para regras já conhecidas, como a necessidade de evitar aglomerações, uso de máscaras, higienização das mãos, limpeza de objetos e ambientes, isolamento de doentes em casos suspeitos.

Nesse mesmo dia, ironicamente, o Brasil ultrapassou a simbólica marca de um milhão de casos confirmados de covid-19, sem qualquer indício de que a disseminação do vírus tenha alcançado o auge no país e começado a retroceder.

O Ministério ressaltou que as orientações servem como referência para as decisões das prefeituras e dos governos estaduais, que devem se basear nos dados epidemiológicos locais.

Não é salvo-conduto

Mas, afinal de contas, quando é que poderemos nos sentir realmente seguros ao sair de casa? A resposta dos epidemiologistas, neste momento, é praticamente unânime: ainda não é hora para relaxar, mesmo que você more numa região do país supostamente menos afetada.

As medidas recomendadas pelo Ministério não devem ser vistas, portanto, como um salvo-conduto para passeios dispensáveis. Servem, no máximo, como referência para quem está realmente precisando sair de casa e para que os estabelecimentos comerciais se adaptem às exigências do “novo normal”.

Quem puder ficar em casa, deve continuar fazendo isso, ainda que se submetendo a um sacrifício dobrado. Primeiro, por se manter distante de passeios e atividades de lazer ao ar livre. Segundo, por ter que lidar com o descuido de quem foi contagiado pela falsa sensação de normalidade.