Fundação Padre Anchieta

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Apesar de ter empurrado o Brasil para a maior recessão em quase um século, a crise do coronavírus é uma oportunidade única para que o país faça a lição de casa e repense a forma como gasta seus recursos, até para conseguir ajudar aqueles que mais precisam neste momento.

A avaliação é da economista-chefe do Santander, Ana Paula Vescovi, que foi secretária do Tesouro, secretária-executiva do Ministério da Fazenda e presidente do conselho de administração da Caixa durante o governo Michel Temer.

Para ela, a recuperação da economia brasileira será bastante gradual, e o Brasil deverá chegar ao final da crise com uma relação dívida bruta/PIB (Produto Interno Bruto) de quase 100%. Um cenário sombrio para um país emergente, que mais gasta do que arrecada há sete anos.

Melhorar o ambiente de negócios, estimular o empreendedorismo, intensificar o uso da tecnologia e reavaliar despesas que não são efetivas em melhorar a vida dos mais pobres é, mais do que nunca, fundamental, na sua avaliação.

“É uma situação social que demanda pressa”, resume. Veja abaixo a entrevista concedida por Ana Paula ao 6 Minutos.

Com qual cenário você trabalha para a recuperação pós pandemia? Abril foi o fundo do poço, o mês de queda mais intensa da atividade, e reflete mais diretamente a parada súbita, a quarentena. A partir de maio, temos indicadores de que a economia começa a se recuperar. O segundo trimestre é o auge da crise, e no terceiro trimestre veremos uma recuperação, uma volta gradual. Mas todos sabemos que vamos sair da crise com a demanda menor em relação ao pré-pandemia.

No terceiro trimestre veremos uma recuperação, mas não total, e firmas vão sucumbir nesse meio tempo, a própria capacidade da economia voltar vai ser afetada. A partir da normalização da economia, do fim do processo de isolamento, acreditamos em uma recuperação bastante gradual.

O que será necessário para que o Brasil se recupere? O Brasil entrou nessa crise sem ter concluído seu processo de ajuste. Não havia se recuperado ainda da crise econômica que teve seu auge em 2015, 2016.

Estávamos no sétimo ano de deficit fiscal, com uma agenda de modernização da economia brasileira, de melhoria do ambiente de negócios. Veio a crise, e suspendeu-se essa discussão para que desse lugar a medidas de enfrentamento ao impacto do coronavírus.

É importante que em algum momento possamos voltar a essas medidas.

Teremos 18 a 20 milhões de desempregados, um nível de informalidade muito alto, e tudo isso vai nos levar a uma urgência de melhorar o ambiente de negócios, estimular o empreendedorismo, a inovação, para que possamos inserir essas pessoas no mercado de trabalho.

É uma situação social que demanda pressa.

Essa situação pode trazer oportunidades? Sim. Quem estuda a história das pandemias nos ensina que esses processos no passado não foram disruptivos, mas aceleraram tendências que já estavam acontecendo.

A pandemia vai sim contribuir para a aceleração do processo de entrada do Brasil na economia digital.

A adoção de tecnologias, por mais inexorável que seja por causa da pandemia em si, tem uma dinâmica própria, mas não é suficiente para trazer todos os benefícios.

É preciso representar a política educacional para desenvolver as habilidades da economia digital, e ter também outro olhar sobre a gestão pública. Precisamos sim ter um estado eficiente.

A economia digital traz uma enorme possibilidade aos governos: é uma forma de chegar melhor e mais fácil aos cidadãos, poder fazer política pública mais focalizada, e ter uma forma de repensá-las dentro das seguintes restrições: precisa chegar a quem mais precisa, o estado precisa ser mais efetivo para os mais vulneráveis, e ao mesmo tempo se respeitar nossas restrições fiscais.

Vamos sair da crise com uma dívida de 100% do PIB, e isso é muito para um país em desenvolvimento. O mundo inteiro está gastando, mas o Brasil é diferente. Estar exposto a um desequilíbrio das contas públicas por 7 anos é muito tempo.

O Brasil precisa continuar implementando a agenda de reformas, mas isso é factível no cenário atual, de recessão e necessidade de apoio do governo no Congresso? Acho bastante factível, não fácil. Reconheço a dificuldade de serem feitas muitas discussões profundas em um quadro de vulnerabilidade social como o que vivemos. Mas tivemos um sinal de que é possível, com a aprovação do novo marco do saneamento.

Quais os riscos que o Brasil corre do ponto de vista econômico? Entramos na crise com a inflação baixa, juros em mínima histórica e a própria crise tem um impacto deflacionário. Conseguiremos sustentar esse cenário de inflação e juros baixos por um tempo, e isso nos concede algum tempo para implementar as reformas.

Mas estamos menos resilientes e mais vulneráveis a choques. O risco é termos muitos choques inesperados, demorarmos demais para reagir e a dívida pública não parar de crescer.

Se esse risco continuar aumentando, a tendência é que os juros futuros, que é o que interessa para decisões de investimento, comecem a aumentar. Caso não haja uma reação, isso vira risco de inflação lá na frente. Mas temos condições para discutir as reformas, temos algum tempo pra fazê-lo.

Qual a sua avaliação sobre o auxílio emergencial? Ele deve se tornar permanente? O programa foi pensado para sustentar a renda das pessoas em função do isolamento social. No momento em que o isolamento for relaxado, o auxílio tem seu papel cumprido.

Mas é claro que vamos sair com faturas da crise: desemprego mais alto, informalidade maior, e menos condições das empresas de empregarem.

Por isso, devemos repensar as políticas sociais. Gastamos muito e gastamos mal. Nosso nível de gasto social é muito elevado e chega pouco a quem mais precisa.

Temos uma oportunidade ímpar de redesenhar o gasto social, dado que os que mais precisam terão demandas importantes. O estado tem que olhar para eles.

A digitalização permite ganho de eficiência, e somado a isso, a reforma administrativa abre espaço para se fazer um ajuste. Há um aspecto importante da reforma administrativa: a avaliação de desempenho dos servidores. No setor privado, somos frequentemente avaliados. Precisamos reforçar o alinhamento entre servidores e sociedade. Isso também é produtividade.

Mas não tem bala de prata, não vamos conseguir uma saída única para um processo como esse.

Em que o governo gasta mal em termos de políticas sociais? Temos um ótimo programa, o Bolsa Família, que realmente beneficia a população que mais precisa.

Outros programas não têm a mesma característica, como o abono salarial, o salário família. Alguns desses programas só direcionam 20% aos mais pobres.

E estamos em um momento em que os recursos são escassos e ficaram ainda mais escassos. Além de maior demanda social, temos o cobertor ainda mais curto.

Se não equacionarmos, levaremos o Brasil a um baixo crescimento, ao risco de volta da inflação. Não tem saída fácil.