Fundação Padre Anchieta

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Vou dizer pra vocês porque gosto do Maradona. Gosto do Maradona pela exuberância passional. E nesse quesito ninguém chegou nem perto dele. Vejo em Diego um discurso, um jeito de ser, que sempre o fez do povo. E, por tabela, um grande signo do futebol. E nada me tira da cabeça que é por isso que os argentinos o amam tanto, lhe ergueram uma igreja até. Um modo de viver que pode não ser correto mas que é inquestionavelmente transparente. Diferente daquele discurso polemicamente estudado de certas figuras que conhecemos e que teimam em transformar a mais banal das declarações num jogo. Com Maradona nunca teve essa.

Ele foi em campo o que tem sido fora dele, um exagerado. Um exagerado em tudo, até na barriga que anda cultivando para desconforto daqueles que ao dar de cara com ela em vídeos espalhados pelo whatsapp - ou algo que o valha - torcem o nariz achando que El Pibe é mesmo um esculachado. Coisa que ele é também. Como já escrevi em outro momento Pelé fez aqueles que o viram jogar se sentirem um tanto na condição de elegidos. Eu vi Pelé jogar virou uma espécie de mantra dos abençoados. Jamais cai e nem cairia na armadilha de comparar um ao outro. Mas se Pelé me escapou da memória, Maradona não. Ainda hoje o lembro em campo com assombro. E só os que partilharam desse testemunho ou têm rodagem suficiente para ter visto outros gigantes jogarem bola é que saberão exatamente do que se trata.

Lembro não só o vigor físico, a velocidade, a coragem pra encarar zagueiros e defensores que, em geral, inevitavelmente sabiam que se jogassem limpo iriam ficar para trás. Maradona não estava nem aí. Partia para cima. Maradona fazia mais. Fazia a gente começar a curtir um jogo bem antes de a bola começar a rolar só por ter nos dado a certeza de que estaria lá. Dom Diego teve a capacidade dos nobres, a de permanecer até o último minuto em campo jogando como um moleque. O mais abusado dos moleques. Falando nisso. Acho que a imagem que melhor retrata esse argentino maluco é uma na qual ele, com cerca de uns doze anos talvez, está agachado e abraça com carinho um jogador do Corrientes , que era o time da pai dele.

O homem está em prantos. Tem um colar justo pendurado no pescoço, está sujo de terra, tem as chuteiras gastas e as meias arriadas. Tinha acabado de perder a final do Torneio Evita para o Entre Ríos. O olhar do menino Diego ao lado dele é aflito, sugere que não há consolo naquele tipo de abismo em que o futebol costuma jogar os homens. Mas o impressionante na cena é notar de alguma forma que aquele Maradona imberbe já sabia disso, já tinha entendido tudo. Sei que ele tinha acabado de virar um sessentão, falaram bastante dele. Eis que ele volta a ser notícia. Coloca o mundo da bola em luto. Mas a qualquer tempo esse argentino nos servirá de prova de que nada apaga a fina arte de jogar bola, nem a ácida fórmula do politicamente correto.

Vladir Lemos é jornalista, apresentador Revista do Esporte e diretor de Esporte da TV Cultura.