Fundação Padre Anchieta

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Foto de Felix Broede (Divulgação)
Foto de Felix Broede (Divulgação) Isabelle Faust

Isabelle Faust, 49 anos, já se firmou há muito tempo como uma das mais notáveis violinistas do nosso tempo, ao lado de Gidon Kremer, Itzhak Perlman a alguns outros raros mestres no instrumento.

Como os citados, construiu uma personalidade própria, um DNA artístico. Assim,. por exemplo, Perlman gravou com Oscar Peterson depois de ter percorrido todo o repertório convencional para o seu instrumento; e como Kremer empreendeu ao longo de sua carreira batalhas pela divulgação da obra de compositores reprimidos e marginalizados pela União Soviética estalinista, primeiro com Arvo Pärt e mais recentemente com Miecszlaw Weinberg.

Faust, de seu lado, sempre acrescenta em suas gravações alguma característica que faça delas acontecimentos artísticos de exceção. Mesmo quando revisita obras muitas vezes gravadas. É o caso da “História do Soldado”, o misto de narrativa, pocket-ópera e espetáculo de cabaré – tudo isso junto e mais um pouco – assinado por Igor Stravinsky e seu amigo escritor suíço Charles-Ferdinand Ramuz, em 1918. A Primeira Guerra Mundial terminava. E ambos revisitaram um dos mais atávicos e sempre presentes mitos da humanidade, o do Fausto, para contar, num espetáculo cênico-musical, digamos assim, tudo o que o ser humano é capaz de fazer em nome de seus desejos, vaidades e sede de poder: um soldado vende sua alma ao diabo, simbolizada pelo único bem de valor que possui, seu violino. Os instrumentos utilizados representam as personagens que participam da história: soldado, princesa, diabo.

Ele troca seu violino por um livro mágico capaz de lhe propiciar toda a riqueza que possa imaginar – esta é a oferta do Diabo a que ele sucumbe. Com o detalhe de que terá de ensinar o Diabo a tocar violino. Anos se passam, o Diabo não aprende, e ele percebe que caiu numa armadilha.Tenta desfazer o trato. E, claro, não consegue.

Faust lidera um grupo de grandes músicos tocando instrumentos de época – sim, dos anos 1910 do século passado. Vejam até onde chega o preciosismo da música historicamene informada. No caso, as sonoridades tornam-se mais ácidas, ásperas, em relação aos instrumentos modernos atuais. A formação instrumental é: violino e contrabaixo, clarinetes e fagote, trompete, trombone e percussão. Destaque para o incrível Lorenzo Coppola nos clarinetes.

Outro detalhe: o álbum da Harmonia Mundi sai em três montagens diferentes: em inglês, em francês e em alemão. Optei pela versão francesa no CD desta semana: o narrador é Dominique Horwitz, que também faz o soldado e o diabo.

O álbum traz ainda Isabelle Faust em duas outras obras de Stravinsky: no “Duo Concertante” que ele compôs para excursionar no início dos anos 1930 com o violinista Samuel Dushkin. Uma leitura apaixonante, em que ela é acompanhada ao piano por Alexander Melnikov, seu parceiro preferencial no repertório violino-piano. E, cereja no bolo, uma execução formidável da “Elegia”, para violino solo, composição de 1944, já do período norte-americano do compositor.


A cada semana o crítico musical João Marcos Coelho apresenta aos ouvintes da Cultura FM as novidades e lançamentos nacionais e internacionais do universo da música erudita, jazz e música brasileira. CD da Semana vai ao ar de terça a sexta dentro da programação do Estação Cultura e Tarde Cultura.