Ouça o álbum completo:
Músicos clássicos não gostam, ou não sabem, improvisar. Músicos populares adoram improvisar, não sabem seguir uma partitura e dela extrair todas as suas possibilidades mesmo respeitando o texto musical.
Estes são mantras deformados que vêm sendo repetidos automaticamente ao longo do tempo. Assim, um pianista fabuloso como Keith Jarrett, por exemplo, que estudou música clássica para valer, não teria “autoridade” para tocar um concerto de Mozart. Do outro lado da cerca, o músico clássico parece um sujeito de smoking numa roda de samba.
Felizmente, já estamos distantes deste tipo de preconceito gratuito. Mesmo que parte da crítica clássica ainda empine o nariz diante do Mozart de Jarrett, a fluidez entre os gêneros praticamente anulou diferenças. Sâo todos músicos, afinal.
É isso que um álbum recém-lançado provou mais uma vez, ao reunir a violinista clássica Emily Davis com seu marido Andrew Robb, contrabaixista de jazz. A aventura híbrida foi gestada pelo casal durante a pandemia, mas só agora o álbum chega ao streaming.
Em seu site emilydavisviolinist.com, Emily faz reflexões interessantes sobre esta aventura: “Quando olho para minhas três décadas tocando violino, sou grata pelos professores maravilhosos que tive. No entanto, percebo que existe um botão interno de pânico ligado ao meu medo de cometer erros, algo que acredito que a maioria dos músicos com formação clássica compartilha. Passamos horas praticando diligentemente oito compassos de um concerto de Mozart para o correto fraseado, entonação, vibrato, articulação, cor, caráter, etc... Colocamos exigências irrealistas sobre nós mesmos, instiladas por nossa educação, buscando a perfeição no que fazemos. Não é de admirar que a ideia de retirar essas camadas praticadas, para fazer algo no momento, pareça praticamente impossível! Este é, portanto, o desafio: aprender a abraçar as coisas que soam ‘erradas’. ”
Ela se espantou ao constatar que Andrew Robb “trabalha a partir de uma intensa compreensão harmônica e rítmica, como se tivesse um dicionário de ideias na cabeça para vasculhar em ritmo, criando novas músicas no calor da hora. Este conhecimento teórico, que me assusta, fornece uma base para a liberdade de improvisar. Sem essa experiência, um bom ponto de partida para o álbum foi redescobrir melodias que amo”
É por isso que o repertório do álbum mistura Lili Boulanger com Franz Schubert, Gershwin e a dupla Rodgers e Hammerstein, Manuel Ponce e até Zequinha de Abreu e Tom Jobim.
A cada semana o crítico musical João Marcos Coelho apresenta aos ouvintes da Cultura FM as novidades e lançamentos nacionais e internacionais do universo da música erudita, jazz e música brasileira. CD da Semana vai ao ar de terça a sexta dentro da programação do Estação Cultura e Tarde Cultura.
REDES SOCIAIS