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O fagote é um dos instrumentos de som mais grave da orquestra. E é logo visualmente destacado no oceano de instrumentistas de uma sinfônica por seu longo tubo de madeira reluzente de 2 metros e meio e o finíssimo tubo de prata-de-lei. Este tubo curvo liga a palheta dupla – como a do oboé – soprada pelo músico ao corpo do fagote. A curvatura do tubo em U modifica a sonoridade.
E é justamente ela que espanta quando seu timbre destaca-se num solo. A sonoridade gaiata encantou compositores ao longo dos séculos; seus graves sustentam a base da harmonia das madeiras, suporte essencial numa orquestra.
Este timbre característico é definido por seu tubo cônico (diferente de clarinete e flauta, que têm tubos cilíndricos). Este tubo também afeta sua projeção sonora e torna o instrumento facilmente audível acima dos demais instrumentos.
Agora, produzir som no fagote é um processo ao mesmo tempo delicadíssimo e complexo: o fagotista coloca a extremidade da palheta dupla entre os lábios, retraindo-os levemente para dentro da boca sem tocar nos dentes. Sopra continuamente entre as palhetas e as faz vibrar uma contra a outra. A vibração das duas canas faz vibrar a coluna de ar existente dentro do fagote, produzindo assim o tom base do instrumento (que pode ser modificado pelo uso de chaves).
As orquestras em geral mantêm dois fagotes. O primeiro toca no registro agudo e o segundo no grave; o segundo fagote possui uma função mais harmônica do que melódica. Em meados do século 18, o fagote tocava as mesmas notas do violoncelo nas orquestras. Mas emancipou-se pelas mãos de Haydn, Mozart e Beethoven. É do fagote o solo mais famoso da música do século 20: os compassos iniciais da “Sagração da Primavera”, de Stravinsky, obra-prima de 1913.
É dura a vida do fagotista além dos limites da orquestra. Há, porém, músicos altamente criativos como Alexandre Silvério, por exemplo. Ele toca na Osesp, mas também lidera o Alexandre Silvério Quinteto que toca jazz e música instrumental brasileira.
Contei toda esta história só para apresentar o divertido CD desta semana na Cultura FM, do fagotista português Rui Lopes, radicado em Basel, na Suíça. Ele se intitula “Close Encounters”, ou encontros íntimos, literalmente, e tem o seguinte subtítulo: obras para fagote e quarteto de cordas. Os compositores não são conhecidos, mas esta música é muito saborosa. Dos seis, você já deve ter ouvido falar de ao menos três: Saint-Saëns, Astor Piazzolla e Wynton Marsalis. Os demais são dois contemporâneos – Marcelo Nisinman, 53 anos, e Helena Winkelmann, de 49 – e um do século 18, Édouard Pay.
A graça está nas sonoridades inesperadas que surgem do encontro do timbre característico do fagote com as cordas. O quarteto que o acompanha é o Gringolts.
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