Bianca Diniz - AGÊNCIA CENARIUM
MANAUS (AM) — Em 7 de setembro de 1822, o Brasil proclamou sua independência do domínio português, um marco frequentemente exaltado como símbolo de libertação. Especialistas defendem, no entanto, que essa mudança política não resultou em transformações sociais significativas. A população negra, que compunha uma parcela substancial da sociedade brasileira, permaneceu escravizada, enquanto o sistema escravocrata continuou a garantir os privilégios de uma elite minoritária.
Em entrevista à CENARIUM, a jornalista e mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam) Luciana Santos explica que a Independência, apesar de simbolizar uma ruptura formal com a coroa portuguesa, não significou uma verdadeira emancipação para a população negra, que continuou desumanizada e tratada como propriedade. “A Independência do Brasil não trouxe liberdade para os negros, que continuaram sendo tratados como propriedade." afirma.
A continuidade do sistema escravocrata após a Independência é evidenciada na Constituição de 1824, a primeira do País, que vigorou até a Proclamação da República. Luciana ressalta que a carta constitucional não abordou a escravidão em nenhum momento, perpetuando assim a exploração de pessoas negras. "As leis penais, por outro lado, se tornaram mais severas, pois a elite temia uma revolta negra semelhante à do Haiti", completa a especialista.
A omissão da escravidão na Constituição de 1824 reflete o apagamento histórico das resistências negras, que ainda hoje é perpetuado na historiografia oficial. Para Luciana, ao excluir as narrativas negras, a história oficial limita a compreensão plena do impacto estrutural da escravidão na formação social, política e econômica do Brasil, dificultando a construção de uma visão mais justa da realidade brasileira.
"Essa invisibilização não é acidental; faz parte de uma estratégia deliberada de manutenção do poder, que impede a sociedade de refletir de forma crítica sobre a perpetuação das desigualdades raciais no Brasil", ressalta.
A especialista também conta à CENARIUM que o movimento quilombola e as organizações negras seguem firmes na luta pela reparação histórica e pela plena efetivação de seus direitos constitucionais. A regularização fundiária, assim como o acesso a políticas públicas inclusivas, continua a ser uma das demandas centrais dessas comunidades, que enfrentam uma realidade marcada pela exclusão e pelo abandono do Estado.
Para os quilombolas, o 7 de Setembro não simboliza apenas a ruptura com o colonialismo português, mas um marco da persistente luta por uma independência que, para eles, permanece incompleta. "A Independência consolidou os privilégios de uma elite e relegou a população negra à margem da cidadania. A nossa luta por liberdade e justiça social continua até hoje", conclui Luciana.
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