A jornalista Mariany Alves Bittencourt traz em Reflorescer crônicas com histórias reais de mulheres que passaram pelo processo de transição capilar. Para ela, a questão está além da tendência vista pelas redes sociais nos últimos anos. O lançamento feito pela editora Malê é o primeiro livro da escritora.
"Dizer que a transição capilar 'está na moda' é desconhecer as questões raciais, é uma ignorância mesmo. Porque se 'está na moda' como dizem é algo de um tempo, certo? Há mais de 15 anos vemos mulheres falando sobre cabelo cacheado. Claro que agora com a internet tudo viralizou, mas sempre existiu; é bem mais sobre identidade e autoconhecimento", diz escritora.
Em entrevista ao site da TV Cultura, a escritora, formada pela Universidade Federal de Santa Cataria (UFSC), revela o processo de escrita e comenta que o livro surgiu como projeto de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) no jornalismo. "Eu vi ali uma oportunidade de falar sobre um assunto que ninguém tinha falado ainda. Até para fazer a pesquisa, não achei muita informação, então, entendi que precisava escrever por mim e por outras mulheres", diz Bittencourt.
O processo de transição capilar nada mais é do que o tempo em que você fica sem fazer procedimentos químicos para que seu cabelo cresça em sua forma natural. "Diferente do que muita gente pensa, este é um momento que vai além da estética", diz a escritora. Para Mariany, esse período envolve bastante aceitação, amor-próprio, crises de autoestima e muito autoconhecimento.
O movimento de transição capilar para voltar aos cabelos cacheados, crespos e ondulados cresceu muito rápido entre as brasileiras desde meados de 2015. Porém, por ser um processo cheio de dúvidas e nomenclaturas, é normal que as iniciantes se sintam bem perdidas, e muitas desistem no caminho. A jornalista Mariany Bittencourt revela seu próprio período de transição capilar. "Foi um processo de muitas descobertas, porque eu acredito que é um momento de reencontro. Como repórter somos ensinados a não falar sobre nós mesmos, mas acho que isso humanizou minha pesquisa e me fez ter um carinho maior com as histórias", diz.
Racismo e padrão de beleza
Em um dos últimos capítulos de Reflorescer, a escritora faz menção a um episódio de racismo na Copa do Mundo Feminina 2019. A jogadora Wendie Renard foi criticada pela torcida brasileira por ter "cabelo ruim" e "duro". Em resposta, a boleira escreveu uma mensagem motivacional nas suas redes, ignorando os ataques disse: “Aos 7 anos, quando comecei a jogar futebol, se me dissessem que um dia jogaria uma Copa do Mundo no meu país, em estádios cheios e diante de milhões de telespectadores, eu nunca teria acreditado. Gostaria de dizer a cada criança que você deve sonhar, lutar, acreditar em você mesmo e sobretudo nunca desistir. Obrigado por estes momentos mágicos”, escreveu.
Algumas artistas como Bruna Marquezine, Camila Pitanga e Camila de Lucas, falaram abertamente sobre o período de transição, desconstruindo a ideia de que a beleza está nos fios longos e lisos. Recentemente, em suas redes sociais, a atriz Mel Maia comentou a desistência do processo. "Hoje eu desisti da transição capilar. Decidi que não vou mais fazer transição. Eu não queria que as meninas que começaram a fazer [transição] por minha causa, desistissem também", disse em seus stories.
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"É um processo longo e para algumas mulheres é muito dolorido. Por isso que falar que 'está na moda' é algo vazio e sem sentido. Engloba vários corpos, brancos e negros, várias histórias e momentos. É um período de reconstrução própria", finaliza a escritora.
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