Fundação Padre Anchieta

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Recentemente, temos conversado com mais ênfase no Brasil sobre os monumentos, o que eles representam e como eles, de certa forma, mostram o que validamos e enaltecemos enquanto sociedade.

Parte dessa reflexão foi inspirada na narrativa de Rita von Hunty, na qual ela gera a seguinte reflexão: O que fazer com a estátua de um racista? De um genocida de uma população originária? De um escravagista? De um torturador?  Devemos prestar homenagem vitalícia? O ponto forte na reflexão é deixar claro que, ao questionarmos por que determinadas figuras históricas são eternizadas em detrimento de outras, não se trata de questionar a história do país em si, mas que narrativa de história de país temos escolhido fazer.

Primeiramente, e antes de mais nada, declaro expressamente que sou contra qualquer tipo de manifestação de vandalismo e violência. Dito isso, a minha reflexão aqui talvez seja o que cada um de nós entende como violência. Pois bem, atearam fogo à estátua de Borba Gato, monumento de 1963.

Mas, quem foi ele? Borba Gato (1649-1718) foi um bandeirante paulista escravagista que matava, escravizava e violentava povos originários enquanto desbravava o Brasil. Além de Borba Gato, somente em São Paulo, temos também monumentos aos Bandeirantes, heróis da Travessia do Atlântico, Anhanguera (filho), Imperador Augusto, homenagem a Duque de Caxias, Pedro Álvares Cabral, entre outros. Reforço, esses monumentos não somente registram e contam a nossa história, mas também qual perspectiva histórica estamos escolhendo privilegiar.

Em contraponto a este acontecimento, no dia 25 de julho, participei de uma caminhada com a temática Heroínas Negras, no Centro da Cidade de São Paulo. O objetivo era poder falar e celebrar o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, data que foi cunhada em 1992, após um encontro de mulheres negras na República Dominicana, para falar sobre a dupla opressão de raça e gênero.

Durante a caminhada, pudemos falar sobre diversas mulheres negras, incríveis e proeminentes, Tereza de Benguela, Carolina Maria de Jesus, Lélia Gonzalez, Maria Felipa de Oliveira, Ryane Leão, Luiza Mahin, Ruth de Souza, Sueli Carneiro, Adriana Barbosa, Djamila Ribeiro, entre tantas outras.

Mulheres que batalharam pela libertação de um povo, por igualdade, por justiça. Mulheres intelectuais que marcaram e marcam diversas gerações. Pois bem, nesta caminhada, a guia Débora Pinheiros, da Black Bird-Guia Negro e da Diáspora Black, nos informou que em São Paulo temos cinco monumentos de pessoas negras, sendo quatro delas de homens, Luiz Gama, Zumbi dos Palmares, Tebas e Marighella. E a única estátua de uma mulher negra é a Mãe Preta, monumento localizado no Largo Paissandu, representando uma ama de leite.

Durante o período escravocrata, amas de leite eram as mulheres negras obrigadas a amamentar outras crianças, quando a mãe biológica por algum motivo não poderia fazê-lo. Mas, o traço mais cruel dessa realidade é o de que essas mulheres negras muitas vezes sequer podiam amamentar os próprios filhos, pois eram afastadas deles durante a sua infância. Em outras palavras elas deixavam de amamentar seus próprios bebês para amamentar os filhos das sinhás.

É sobre isso que quero refletir aqui! Por que batalhamos tanto para manter estátuas históricas de homens brancos, que tiveram trajetória de vida tão duvidosa, mas não conseguimos neste mesmo país, em 2021, ter a estátua de uma mulher negra, em destaque, enaltecida, com nome e sobrenome, destacando os seus feitos?

O que isso diz sobre nós enquanto sociedade? A população jamais chegaria ao ponto de incendiar uma estátua, como forma de protesto, se estas conversas relevantes, honestas e transformadoras estivessem – de fato – sendo endereçadas na agenda pública brasileira. Em Bristol, no Reino Unido, por exemplo, a estátua de uma manifestante negra, a estudante Jen Reid, com o punho erguido, foi colocada no lugar de uma obra que homenageava o escravocrata britânico Edward Colston.

A nova estátua chama-se A Surge of Power, ou em tradução livre Uma Onda de Poder, e nos faz refletir sobre a nova sociedade que queremos construir com uma perspectiva de coconstrução de direitos igualitários a todos e todas, sejam homens, mulheres, brancos, negros, indígenas, amarelos, heterossexuais, LGBTQPIA+.

Nessa nova perspectiva, respaldados na garantia de direitos humanos, de direito à vida, de direito à integridade, enaltecendo personalidades históricas que realmente nos fizeram caminhar rumo a uma sociedade mais igualitária e justa para todos. Hoje como sociedade civil organizada, seguimos tendo que forçar essa reflexão, essa conversa e essa mudança.