Desmatamento no Cerrado gera conflito entre tatus e criadores de abelhas

A destruição contínua do bioma tem reduzido os recursos para o tatu-canastra, a maior espécie de tatu do mundo, causando um conflito com produtores de mel. Agora, apicultores do Mato Grosso do Sul se juntaram para tentar salvar o animal, as colmeias e as abelhas.


Leandro Machado - Da BBC News Brasil em São Paulo

20/04/2022 10h54
Divulgação ICAS
O tatu-canastra é a maior espécie de tatu do mundo: mede 1,6 metro e pesa cerca de 50 quilos

O tatu-canastra é a maior espécie de tatu do mundo: pesa 50 quilos e mede 1,6 metro entre o focinho e a ponta do rabo. Ele também tem uma das maiores unhas da natureza: 14 centímetros no terceiro dedo, uma afiada garra que ele usa para cavar tocas. Porém, a vida não está nada fácil para o tatu-canastra. O constante e crescente desmatamento do Cerrado, um de seus principais habitats, está reduzindo sua oferta de comida, além de jogá-lo em um conflito inesperado com criadores de abelhas.

Com pouca opção de cupins e formigas para comer, o Priodontes maximus (nome científico do bicho) tem atacado e destruído colmeias no Mato Grosso do Sul, em busca de larvas de abelhas para se alimentar. O "vandalismo" do tatu está causando prejuízos de milhares de reais para os produtores de mel no Estado - há relatos de apicultores que, em represália, mataram o raro animal, um crime ambiental.

No entanto, um grupo de criadores sul-mato-grossense está tentando resolver o conflito em busca de paz e conservação. Nos últimos meses, dezenas deles se reuniram com biólogos e pesquisadores para desenvolver um guia de convivência com o tatu-canastra. Quem seguir as recomendações ganha um certificado internacional de proteção da espécie, o que pode gerar benefícios financeiros na hora de vender o mel.

Cerca de 700 apicultores atuam no Mato Grosso do Sul, responsáveis por 21 mil colmeias. Muitos recorrem a áreas silvestres e de plantação de eucaliptos para instalar as abelhas, locais próximos a tocas do tatu. As colmeias costumam ficar longe da presença de humanos para evitar ataques de abelhas - por isso, os apicultores só ficam sabendo da ação do canastra horas e até dias depois do ocorrido.

Arquivo Pessoal
Cerca de 700 apicultores produzem mel no Mato Grosso do Sul atualmente

Em locais onde a vegetação nativa permanece intacta, o animal tem recursos à vontade para se alimentar. Porém, em pontos cercados por estradas, pastagens e lavouras, o alimento fica escasso e os tatus atacam as colmeias para sobreviver, segundo o biólogo Arnaud Desbiez, pesquisador e coordenador do Programa de Conservação do Tatu-canastra, realizado pelo Instituto de Conservação de Animais Silvestres (ICAS) e pelo Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ).

"Hoje, o habitat do tatu é extremamente fragmentado. Por isso, muitas vezes ele fica isolado em um desses fragmentos, sem muitas opções de alimentos. Ele acaba procurando as colmeias para comer as larvas", explica Desbiez.

De hábitos noturnos, o canastra aprende rápido como destruir caixas de colmeias durante a noite. Vídeos gravados pela equipe de pesquisa coordenada por Desbiez mostram sua persistência: ele fica em pé, se pendura, puxa e empurra as caixas até conseguir acesso às larvas, derrubando o mel e soltando as abelhas.

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