Ao chegar para seu check-up anual de saúde, Kwanmueang impõe respeito.
Com quase três metros de altura até os ombros, pesando pelo menos quatro toneladas e com presas espetaculares que se curvam juntas até quase se tocarem, este elefante tailandês de 18 anos é uma visão imponente.
No entanto, ele e seu criador (ou mahout), Sornsiri "Lek" Sapmak, estão passando por dificuldades.
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Ele costumava ganhar a vida com a participação de Kwanmueang em cerimônias para ordenar novos monges, ou vestido como um elefante de guerra para reencenar batalhas históricas. Tudo isso parou durante os confinamentos impostos pela pandemia de covid-19.
Mais elefantes são usados para o turismo na Tailândia — acima de 3 mil — do que em qualquer outro lugar do mundo. Diferentemente de outros países com populações cativas, os da Tailândia são quase todos de propriedade privada. Sendo assim, o colapso do turismo durante a pandemia teve um impacto devastador sobre os elefantes e seus donos, que não ganham mais o suficiente para cuidar deles.
Mesmo com o início da recuperação do turismo, outra ameaça paira sobre essa indústria única. Preocupações éticas sobre como os animais em cativeiro são mantidos e treinados estão levando muitos visitantes estrangeiros a boicotar os shows de elefantes, que antes eram uma atração clássica para os turistas, levantando questões sobre se o turismo de elefantes pode voltar ao que era antes da covid-19.
Lek e Kwanmueang voltaram para o vilarejo natal de Lek na província de Surin — uma região cujo povo é famoso por sua habilidade em manter, treinar e, no passado, capturar elefantes.
Lek não está sozinho. Centenas de outros elefantes retornaram a Surin de pontos turísticos como Phuket e Chiang Mai, onde ganharam dinheiro fazendo truques ou dando carona para visitantes estrangeiros.
Caminhar por esses vilarejos é uma experiência desarmante. Quase todas as casas têm um ou mais elefantes acorrentados em seus quintais ou descansando sob as árvores. Você se acostuma a ver os enormes animais caminhando pela estrada, seus mahouts montados em seus pescoços largos, e ao dirigir você aprende a ter cuidado ao passar por eles.
Boonyarat "Joy" Salangam possui quatro elefantes, que ela e seu parceiro trouxeram de Phuket quando o turismo fechou em 2020. Um deles é um bebê brincalhão, que vive com a mãe em um cercado que Joy construiu na frente de casa.
"A covid parou tudo", diz ela. "Os mahouts, os donos e os elefantes estão todos desempregados. Nos acampamentos turísticos, as fêmeas são mantidas separadas dos machos, mas aqui todos andam juntos, e os elefantes têm feito sexo. Não os forçamos. Eles fazem isso em seu próprio tempo. Então a população está aumentando."
Joy conta que pensou em vender seu bebê elefante para arrecadar fundos — eles chegam a valer tanto quanto um carro de luxo —, mas ela se preocupa com o quão bem ele seria tratado. Joy morou quase toda a vida com a mãe dele, de 39 anos, herdada dos avós.
Os mahouts também podem viver por décadas com o mesmo elefante — às vezes, optando por dormir com eles, levando-os a lagos ou rios para se banhar à noite e observando de perto sua saúde. Isso tem sido um desafio com a covid.
Os elefantes são caros. Um adulto precisa comer de 100 a 200 kg de comida por dia e beber até 100 litros de água. Sem nenhuma outra renda, donos como Joy têm feito transmissões ao vivo com seus animais nas redes sociais, enquanto pedem doações.
Às vezes, isso é feito da própria casa, enquanto os elefantes brincam ou tomam banho, ou eles pedem a um amigo que ande de moto para filmá-los em suas caminhadas noturnas. Os espectadores podem pagar online para que os elefantes ganhem cestas de bananas realizando truques, mas isso não é ideal para a saúde deles.
A dieta deles deve consistir principalmente de diferentes tipos de folhas e grama, mas com tantos elefantes voltando para a região, é difícil encontrar o suficiente para eles.
"Estamos descobrindo que eles estão com problemas digestivos por causa da mudança na alimentação", afirma Nuttapon Bangkaew, veterinário que faz check-ups gratuitos oferecidos pelo Elephant Kingdom, um projeto que começou há sete anos para melhorar o bem-estar dos elefantes em Surin.
"Quando os mahouts ou donos de elefantes voltam para casa, eles não têm renda. Então, eles não têm dinheiro para comprar grama ou comida para eles. Eles têm que fazer essas transmissões ao vivo nas redes sociais para ganhar dinheiro, mas isso causa problemas de saúde."
Os elefantes são nativos da Tailândia, mas a população selvagem encolheu de cerca de 100 mil há um século, para talvez apenas de 3 mil a 4 mil hoje. No passado, muitos foram capturados e usados na indústria madeireira, mas quando isso foi proibido no final dos anos 1980 para proteger o que restava das florestas do país, eles começaram a ser usados para entreter os turistas.
Nos primeiros shows, eles demonstravam sua habilidade com as toras de madeira. Mas, com o boom do turismo na Tailândia, começaram a oferecer também passeios montados nos elefantes e a exibição de artimanhas dos animais, como pintar ou jogar futebol. O grupo ativista World Animal Protection (WAP) estima que, antes da covid, os elefantes geravam até US$ 770 milhões por ano para a Tailândia.
O WAP é um dos vários grupos que tentam acabar com o uso de elefantes para entretenimento, argumentando que a prática não é natural e sempre envolve técnicas de treinamento cruéis. Muitos turistas já estão buscando maneiras mais éticas de conhecer os elefantes na Tailândia. Algumas empresas de turismo na Europa e na América do Norte não enviam mais clientes para acampamentos de elefantes que incluem montar nos animais ou banho.
Surgiu então um novo nicho na indústria do ecoturismo para atender a essas preocupações.
Saengduean "Lek" Chailert, pioneira no turismo ético de elefantes, abriu o Elephant Nature Park, ao norte de Chiang Mai, na década de 1990 — tanto como um refúgio para animais feridos quanto para explorar maneiras melhores de permitir que turistas e elefantes interajam.
"Queríamos ser totalmente éticos, focar na conservação. Então decidimos interromper os programas de banhos e alimentação de elefantes para turistas", diz ela.
Isso custou metade de suas reservas. E, segundo ela, as operadoras de turismo disseram que não poderiam enviar clientes para lá porque todo mundo "quer tocar e abraçar os elefantes, quer colocar as mãos neles".
Mas hoje, diz Lek, há cartazes por toda parte em Chiang Mai anunciando "sem ganchos, sem correntes, sem montar".
"Eu verifiquei em Koh Samui — antes havia tantos acampamentos fazendo passeios de elefante e agora restam apenas dois. Em Phuket, sobraram apenas alguns lugares, e em Chiang Mai, apenas dois."
No entanto, o turismo ético de elefantes tem seus limites. Dos mais de 200 acampamentos que funcionavam antes do fechamento imposto pela covid, apenas 11, incluindo o de Lek, obtiveram a aprovação do WAP.
Lek tem um terreno grande, com cerca de 100 hectares, ao longo do Rio Mae Taeng. É espaço suficiente para os 122 elefantes que ela tem — 45 deles resgatados de empresas falidas durante a covid — poderem vagar livremente sem estarem acorrentados.
Outros acampamentos não têm essa opção. Um deles, também em Chiang Mai, que anuncia "passeios éticos com elefantes", permite tomar banho com humanos. Diz que, por não ter meios para construir um cercado suficientemente grande, precisa acorrentá-los à noite, para a segurança dos elefantes e dos humanos.
Alguns na indústria dizem que tudo bem; que é preciso haver uma abordagem mais equilibrada entre os abusos que costumavam caracterizar a indústria e a demanda de grupos de direitos dos animais para que todo entretenimento com elefantes acabe.
"Montar elefantes pode ser parte de um sistema para cuidar deles", diz Theerapat Trungprakan, que dirige a Thai Elephant Alliance Association, um grupo de proprietários de elefantes e operadoras de negócios.
"Eles conseguem ir a lugares diferentes, ir a uma cachoeira, por exemplo, onde podem beber água de melhor qualidade, ou nadar lá. Também aumenta a segurança para o elefante ir com humanos, porque há perigos como pesticidas ou cabos de eletricidade que vão além do julgamento de um elefante."
Ele descreve alguns dos argumentos dados por grupos de direitos dos animais como emocionais e melodramáticos, e acredita que santuários éticos podem ser menos saudáveis, porque sem humanos sendo pagos para montar nos animais, os elefantes têm menos oportunidades de fazer longas caminhadas.
Há dois debates agora sobre o futuro dos elefantes em cativeiro na Tailândia. Um é sobre o que os humanos devem e não devem fazer com eles. E o outro, uma questão maior, é sobre que opções práticas existem para sustentar uma população tão grande de animais enormes e longevos.
"Eu tenho uma lista de desejos na minha cabeça, e no topo da lista de desejos está acabar com o cativeiro de todos os animais selvagens, mas sabemos que isso não vai acontecer", diz Edwin Wiek, um dos mais proeminentes ativistas de defesa dos animais na Tailândia.
Ele fundou a Fundação de Amigos da Vida Selvagem da Tailândia há 21 anos para resgatar animais feridos e mantidos ilegalmente. Ele tem 24 elefantes resgatados que vagam livremente em um curral de 16 hectares.
"O cenário ideal seria ter elefantes semisselvagens, como os que mantemos aqui, em grandes cercados naturais em que eles possam caminhar, tomar banho, correr ou procurar comida, como fariam na natureza."
Mas ele admite que seria um projeto caro com poucos adeptos, já que a Tailândia abriga 3 mil elefantes em cativeiro.
"Receio que a maioria dos elefantes, pelo menos três quartos deles, ainda precise encontrar uma renda alternativa. E isso significa que ainda haverá muitos lugares em que passeios de elefante, banho de elefante e alimentação de elefantes por turistas serão parte da rotina diária."
É mais provável que isso aconteça quando turistas de países como China, Rússia e Índia começarem a viajar para a Tailândia novamente, pois eles tendem a aproveitar mais os espetáculos de entretenimento antiquados de elefantes, que geralmente estão incluídos em seus pacotes turísticos.
O que Edwin Wiek acredita que deveria acontecer é impedir a procriação de elefantes domésticos — para que a população caia a um nível em que todos possam ser mantidos nessas condições ideais, semisselvagens, visitados por um número menor de turistas dispostos a pagar apenas para vê-los, e não tocá-los.
Assim, diz ele, o governo poderia voltar sua atenção para o gerenciamento de uma população selvagem crescente, criando corredores que permitissem a eles se deslocar entre os parques nacionais da Tailândia e fragmentos de floresta sem entrar em conflito com os humanos.
Mas a Tailândia não tem uma estratégia para isso. Na verdade, a regulamentação dos elefantes domésticos é uma confusão, dividida entre três ministérios que não estão coordenados entre si.
Então, o futuro dessas criaturas magníficas fica em grande parte nas mãos dos seus donos, muitos deles ainda em situação financeira precária.
Os mahouts estão contando os dias para que os turistas voltem aos números de antes, mas também temem que o único negócio que muitos deles conhecem possa estar ameaçado pela mudança de gostos.
Levar seus elefantes de Phuket para Surin custou a Joy mais de US$ 2 mil. Ela diz que não pode se dar ao luxo de voltar para lá até ter certeza de que os shows estão atraindo grandes multidões novamente.
"Neste momento, é muito difícil para nós, porque não temos dinheiro suficiente. Os elefantes e os humanos estão desempregados. Ainda haverá shows? Acho que haverá, mas não tantos, porque alguns turistas estrangeiros pensam que nós, aqueles que criam elefantes, não os amam, que os torturamos com ganchos para fazê-los se apresentar. Acho que as coisas vão mudar."
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/geral-64151738
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