Deve acontecer com você também. É frequente, quando estou trabalhando, surgirem no meu monitor mensagens como:
- Lembra desta atriz nos anos 80? É de partir o coração como ela está agora.
- Consegue resolver este enigma? Apenas pessoas de QI elevado são capazes!
- Pai e filho tiram a mesma foto por anos seguidos: tente não chorar com a nona
Se estou nas redes sociais, a mesma coisa. Enunciados bem escritos e convidativos para o clique, imagens instigantes, temas que normalmente me interessariam. Tudo amarradinho para que eu clique... E clique... E clique... E clique...
Eu simplesmente não clico, e elas continuam aparecendo. Estas mensagens fazem parte do meu cotidiano de tal maneira que quase não reflito o quanto elas são invasivas, grosseiras e, na maior parte dos casos, mentirosas.
Felizmente, nem tudo é jogo na internet. Tem também o trigo, dos bons. Nas minhas redes sociais, começou a aparecer recentemente uma série de tiras do carioca André Dahmer justamente sobre isso: a presença dos algoritmos em nossas vidas.
Separei cinco destas tiras para ilustrarem esta coluna. Repare nelas: são fórmulas prontas, artificias, toscas. E, mesmo assim, você deve ter se deparado com algumas delas na sua timeline nas últimas 24 horas.
Dahmer não é novato. É um artista talentoso com décadas de atuação – eu conheci seu trabalho com “Malvados”, no início deste século, uma tira com humor ácido e inteligente sobre nós, humanos, e nossos egoísmos, futilidades e afins. Já havia crítica social lá, e todos esses elementos se mantiveram em “Quadrinhos dos Anos 10”, outra série que eu admirava justamente por ser um retrato – sempre bem inteligente e bem-humorado – da nossa sociedade.
E agora Dahmer aparece com este personagem sem nome (pelo menos até onde eu saiba), com um uniforme cafona retrofuturista invadindo a vida das pessoas com fórmulas prontas, artificias, toscas, invasivas, grosseiras e, na maio parte dos casos, mentirosas. Sim, você já viu estes seis adjetivos neste texto: antes, eles falavam da realidade. Agora, descrevem o personagem que esfrega esta realidade em nossa cara.
Afinal, quem quer receber, sem solicitar, mensagens como:
- Sete exercícios para fazer na cama;
- Conheça a planta que vai queimar gorduras;
- Dez hábitos das pessoas mais inteligentes do mundo.
Eu decididamente nunca solicitei nada parecido. E, infelizmente, recebo mesmo assim. O curioso é que eu nunca havia percebido o quanto essa invasão à minha privacidade é frequente, incansável e insuportável. Nunca, até ler esta série do André Dahmer.
Como estas tiras são recentes, ainda não foram reunidas em livros. Mas você pode as ler nas redes sociais do Dahmer, como em seu Instagram. Eu recomendo: são quadrinhos de qualidade, que nos fazem rir e refletir. O que podemos pedir mais?
Bom eu sei o que posso pedir mais: uma redução drástica nas mensagens prontas, artificias, toscas, invasivas, grosseiras e, na maio parte dos casos, mentirosas que recebo via algoritmos.
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