Fundação Padre Anchieta

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O tuíte é agudo: “Estudante pode ir à praia, ao shopping e ao bar. Só não pode ir para a escola”. A denúncia contra uma suposta hipocrisia na política de isolamento social vigente nem precisou dos 280 caracteres permitidos pela rede social para estabelecer um “máximo divisor comum” e simplificar o assunto da abertura das escolas, como numa fração matemática.

Quantitativamente, as proporções 8/16 e 1/2 são equivalentes ao indicarem metade de algo e, por isso, aceita-se a redução lógica. Mas praia, shopping, bar e escola não parecem representar ambientes semelhantes a ponto de possibilitar uma comparação isonômica. Trata-se de tentativa de tornar o complexo simples, missão prática e semanticamente impossível dado o antagonismo entre os termos.

A discussão sobre a volta das aulas presenciais envolve uma variedade de temas complexos e que, portanto, não podem ser simplificados numa frase de efeito. Iniciativas para facilitar e resumir as coisas todas podem estar baseadas em boas intenções. No entanto, seus efeitos comprometem a tomada de decisão que, neste caso, deveria seguir rígidos critérios éticos e sociais por envolver dois direitos fundamentais: saúde e educação.

Anterior à pandemia, o desejo de simplificar é inerente ao raciocínio humano desde sempre, mas ganhou especial atenção na comunicação pela internet. O próprio Twitter nasceu com a promessa de resumir uma notícia a 140 caracteres, limite das publicações na rede social até meados de 2017, quando a empresa dobrou a cota para atender às necessidades de seus usuários.

Recentemente, os utilizadores do serviço ampliaram esse limite por conta própria com a adoção dos “fios”, sequência de tuítes que somados viram um “textão”. Paradoxalmente, enquanto a imprensa tentava se afastar da amplitude para não parecer velha e prolixa, novas tecnologias buscaram ampliar sua abrangência em nome da relevância. É a vida real dando aquele capote na vida idealizada e resumida do virtual.

Em 1976, o arquiteto e designer gráfico Richard Saul Wurman cunhou o termo “arquitetura da informação”, posteriormente utilizado também para descrever e disciplinar a organização informativa em ambientes complexos compartilhados, como sites e softwares. O norte-americano logo esclareceu que não se tratava de uma tentativa de simplificar esses espaços, o que seria impossível, mas de “tornar o complexo claro” para quem os utiliza (Information Architects, 1997).

É o que faz o professor na sala de aula virtual ou presencial, se esforça para ser claro ao abordar temas complexos. Não parece razoável que pontos importantes sejam suprimidos da informação transmitida para parecer mais palatável. Fosse assim, já não teríamos mais as dolorosas aulas de geometria e aritmética no currículo escolar dos jovens.

Da mesma forma, para avançar na discussão sobre a reabertura das escolas em meio à pandemia, talvez seja adequado refletir sobre a frase de Wurman e não tentar reduzir um tema tão cheio de especificidades a uma opinião, apenas. Muitos cidadãos e negócios são impactados pelo sistema educacional e merecem ser ouvidos. O poder público tem o dever de considerar todos eles em suas decisões. Faltando apenas dois meses para o encerramento do ano letivo, a motivação se afasta da falácia do prejuízo pedagógico.

Cabe a governantes e gestores de escolas públicas e privadas dar transparência às razões contra e a favor da volta às aulas presenciais. É importante deixar sobre a mesa todas as informações de que dispuserem para que pais, alunos, professores, profissionais de segurança, de limpeza e de administração, além da tia da cantina e do tio da portaria – entre tantos outros trabalhadores envolvidos nesse gigante ecossistema chamado educação – possam deliberar conscientemente sobre a questão.

A própria democracia é uma maneira de tornar clara a complexa convivência entre as pessoas em um mesmo espaço, com o estabelecimento de regras e acordos sociais. É esse regime político que garante as liberdades individuais, como a de expressão e a de zelar pela própria vida. Assim, qualquer pessoa pode comparar escolas a praias e a shoppings, se quiser. Mas, certamente, não deverá ser um tuíte simplificador o detentor do poder de decidir pela saúde alheia.

Ricardo Fotios é jornalista, professor universitário e pesquisador de temáticas relacionadas ao uso de tecnologias no ecossistema da comunicação. É autor de Reportagem Orientada pelo Clique (Appris, 2018) e pesquisador associado ao ESPM MediaLab.