Fundação Padre Anchieta

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Com o volume crescente de conteúdo publicado todos os dias nas redes sociais, fica cada vez mais complexa a tarefa de destacar uma publicação nesse oceano de posts, vídeos e stories. Por isso, é de se esperar que muitas estratégias de produção e distribuição sejam lançadas para gerar engajamento com o usuário. Mas nem todas as iniciativas criadas para este fim têm respaldo em estudos confiáveis sobre sua eficácia.

Uma dica recorrente se refere à linguagem, que precisa ser simples e direta para alcançar o público-alvo. Até aí, nada muito novo na comunicação. Tanto a publicidade quanto o jornalismo utilizam há décadas o texto coloquial, mas com o cuidado para não sair da linha da correção gramatical e ortográfica, pilares do idioma e – por extensão – da nação.

Mas o que se diz atualmente sobre o uso do português em publicações nas mídias sociais é bem diferente do tom acessível da escrita. Nesta semana, assisti a três vídeos de influenciadores digitais diferentes, mas com a mesma orientação sobre o texto nas redes: escreva como se estivesse falando numa festa, em uma roda de amigos. À parte do inconveniente da aglomeração em tempos de pandemia, a orientação não faz sentido.

Primeiramente, a sugestão parte do pressuposto de que todos falam do mesmo jeito em uma roda de amigos a ponto de o comportamento virar uma regra universal, o que facilmente se comprova como falso. Nem mesmo uma única pessoa fala com a mesma postura, entonação e linguagem em grupos distintos.

Ao final das apresentações, fiquei com a impressão de que o conteúdo, a qualidade do produto ou serviço, a clareza da imagem utilizada e a utilização das palavras-chave adequadas seriam condições secundárias para o êxito de uma campanha digital. Bastaria escrever em como se estive na arquibancada para alcançar seu público.

De quebra, a recomendação ainda ostenta um certo verniz elitista, na medida em que se sabe da falta de domínio do idioma que alguns estratos sociais demonstram nas ruas. Em nenhum dos três vídeos que assisti considerava-se trocar o “nós” pelo “nóis” ou o “vamos” pelo “vai”, por exemplo. Então, de qual festa ou roda de amigos estamos falando?

Pelo que entendi, a ideia é escrever na forma coloquial e não uma reprodução da forma oral da língua. Então, ficaria combinado que não seria “nós vamos” nem “nóis vai” a expressão adequada para as redes sociais, mas algo como “a gente vai”. Em vez de “envie-nos seus comentários” ou “envia os comentário pra nóis”, o ideal seria escrever apenas “envie seus comentários”.

Estamos de acordo que a mensagem chega mais rapidamente e uma maior quantidade de receptores se puder ser mais abrangente, estar acessível e mais pessoas. Também não se pode condenar quem tenta de tudo para, honesta e corretamente, aparecer na tela dos celulares e computadores.

A questão é que não há estudo ou pesquisa confiável que indique que uma publicação teve seu sucesso potencializado pela simples troca do “nós” por “a gente”, do “para” por “pra” ou por ignorar os tempos verbais nas orações. Alguns poderão argumentar que também não há comprovação do contrário, ou seja, de que o uso de linguagem rasteira e incorreta prejudica o alcance da publicação. Está criada a “cloroquina” da comunicação digital.

Ricardo Fotios é jornalista, professor universitário e pesquisador de temáticas relacionadas ao uso de tecnologias no ecossistema da comunicação e da cibercultura. É autor de Reportagem Orientada pelo Clique (Appris, 2018).