Perninha! Não se trata exatamente de um palavrão. Mais correto seria dizer que se trata de um termo cunhado, como tantos outros, para situações específicas. Chinelinho, por exemplo. Quem é do ramo já os ouviu, e não faria cara de paisagem se visse alguém ser tratado desse jeito. Que me perdoem aqueles que por ventura não tenham intimidade suficiente com o futebol para ter uma noção clara do que se quer dizer no momento em que se recorre a esses termos. Em linhas gerais, chinelinho é o cara que não é muito dado a grande esforços e vira e mexe é visto de chinelo pelas dependências do clube, sem condição de jogo, se ocupando de outros cuidados enquanto o time treina ou joga.
Já o termo "perninha" foi meio consagrado dias atrás quando o técnico do São Paulo, Fernando Diniz, o colocou entre um punhado considerável de palavrões, na hora de dar uma cobrada forte no jogador Tchê Tchê, um de seus comandados. Seria algo meio como preguiçoso. Diniz também usou o adjetivo mascarado, mas esse transborda as quatro linhas e tenho certeza que no seu meio de convívio alguma figura a essa altura já deve ter deixado bem claro do que se trata. É do jogo da vida. Mas se escolho o tema é com a intenção de tratar justamente desse linguajar que desde sempre acompanhou o jogo de bola. Pra não dizer os modos, o que exigiria um tratado.
Confesso pra vocês que essa falta de polidez não me espanta. Mas estou longe de considerar argumento cabível afirmar que sempre foi assim e por isso sempre será. A história mostra que o jogo de bola já teve seus lordes. Poucos, é verdade, mas que devem nos servir de prova de que outros comportamentos são possíveis. O que destoa mesmo nessa história é ver um cara como Fernando Diniz envolvido nela como protagonista, alguém que desde sempre me pareceu muito interessado em dar ao homem por trás do jogo um tratamento diferente. E ao ver suas ideias tendo a crer que continua sendo. Poderia ser só um desses momentos em que o cara não segura a onda, mas é fato que em outras ocasiões ele já agiu de modo a corroborar essa imagem.
A maneira como se fala, como se trata os outros, muda a olhos vistos. Termos são banidos nos obrigando a rever conceitos. E esse papo de que no futebol é assim não cola. O próprio jornalismo viveu essa transformação. Desde sempre ouvi histórias de nomes brilhantes que insistiam em tratar subordinados de redação aos palavrões, quase aos tapas. Não duvido que alguém triunfe usando esse tipo de comportamento. Até porque o futebol tem lá suas peculiaridades, e como tem. Mas achar que só é possível tirar o máximo de uma equipe aos berros e distribuindo palavrões me soa, além de ultrapassado, como uma tática ruim, rasa. É mais ou menos como dar uma de perninha quando se tem de encontrar outras soluções, caminhos que tenham a ver com o que o passar do tempo costuma exigir de nós.
Vladir Lemos é jornalista, apresentador Revista do Esporte e diretor de Esporte da TV Cultura.
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