Se for o caso, as ajudas só devem ser concedidas às corporações que deixarem o mercado russo de forma rápida e completa. Não pode haver apoio estatal para companhias como Ritter Sport, Metro, Globus, Bayer, Henkel ou Knauf, que seguem fazendo dinheiro na Rússia.
Ao pagar impostos a Moscou, elas financiam os assassinatos desumanos na Ucrânia, tornam-se colaboradoras da guerra – do mesmo modo que as francesas Leroy Merlin, Total ou Auchan. Todas elas se aferram ao Kremlin, com frequência apelando para argumentos deslavados – como sua suposta responsabilidade para com os empregados russos – e se eximem de qualquer corresponsabilidade no derramamento de sangue.
Pergunta: elas se referem aos funcionários que, pelo menos em grande parte, elegeram o regime Putin? Ou àqueles cidadãos que apoiam a "operação militar especial" do chefe do Kremlin no país vizinho? Propaganda estatal não serve de desculpa para tudo, pois uma boa parte da população de fato está mesmo do lado de seu líder.
Humanidade e respeito à vida não são grátis
Empresários que sigam operando na Rússia se deparam com um dilema: continuar lucrando e assim garantir o futuro econômico de sua organização, ou aceitar os prejuízos e pôr em perigo postos de trabalho?
Contudo quem olha nos olhos das mães agonizantes de Mariupol, ou as centenas de milhares de crianças desesperadas em fuga, sabe imediatamente o que deve fazer. A pressão econômica sobre Moscou não é um ato arbitrário: ela tem como finalidade parar com o assassinato na Ucrânia. Valores como humanidade ou respeito à vida não se preservam de graça.
As companhias ocidentais que optem por permanecer na Rússia têm também uma responsabilidade perante seus quadros na Alemanha e na União Europeia. Pois quem é que gosta de trabalhar para alguém que faz negócios com criminosos de guerra?
Por isso, mais cedo ou mais tarde, todas as companhias ocidentais terão que sair do país agressor. Os clamores no Ocidente para que elas sejam boicotadas ainda não começaram, mas há muito os preparativos estão em andamento.
Além disso, com suas "ações reativas", o aparato estatal moscovita cuida para que as firmas ocidentais no país não tenham futuro: os lucros empresariais não podem mais ser transferidos em divisas vivas. E quem precisa de papel sem valor com "rublo" escrito em cima?
Aprender com os erros históricos alheios
No fim das contas, está também óbvio que com, digamos, um cessar-fogo, a conjuntura só tende a piorar. Para sobreviver, Putin terá que retornar à economia planejada, ao controle total da vida política, econômica e cultural.
Como nos tempos da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), terão preferência as empresas nativas. A Rússia, que vive da exportação de matérias-primas, se transformará no posto de gasolina barata da China. Pequim vai explorar o império de Putin sem pena, num processo que pode durar décadas.
Nesse ínterim, não há praticamente nenhuma esperança de que os russos se livrem desse sistema. Quem acredita nisso é ingênuo, nunca viveu na Rússia. Como na época soviética, a maior parte da população vai se recolher à vida privada ou emigrar. Enquanto cada família tiver a sua casa de campo, a tradicional datcha, entre Kaliningrado e Vladvostok ninguém morre de fome.
O sonho de Putin de um retorno da União Soviética talvez seja realidade por alguns anos. Mas empresas ocidentais não podem contribuir para ele. Antes, deveriam aprender com os erros históricos alheios: até 1938, a IBM ou a Ford ainda faziam negócios com a ditadura nazista da Alemanha. Depois tiveram que suar muito para se explicar.
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Miodrag Soric é jornalista da DW. O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.
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