O candidato à reeleição pelo PL disse que o governo Lula foi o mais corrupto da história do país, e chegou a chamar o petista de "ex-presidiário" por mais de uma vez. Já o ex-presidente afirmou que Bolsonaro está destruindo o Brasil e age com descaso em relação a temas essenciais como educação e meio ambiente.
O debate – organizado pelo jornal Folha de S. Paulo, o portal UOL e as emissoras Bandeirantes e Cultura – marcou o primeiro confronto direto entre o petista e o atual presidente, que são os primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto para as eleições de outubro. Segundo o último Datafolha, Lula lidera com 47%, enquanto Bolsonaro tem 32%, e Ciro Gomes (PDT), 7%.
Além dos três, também participaram do debate os candidatos Simone Tebet (MDB), Felipe d'Avila (Novo) e Soraya Thronicke (União Brasil). Não houve plateia.
Críticas a Bolsonaro
Com exceção de Ciro, que equilibrou seus ataques entre Lula e Bolsonaro e insistiu em declarar que os problemas do país não começaram nesta gestão, os demais presidenciáveis dirigiram suas críticas principalmente ao atual ocupante do Planalto. Por sua vez, Bolsonaro muitas vezes rebateu usando dados controversos e acusando seus adversários de proferir "fake news" a seu respeito.
Uma série de declarações polêmicas do presidente foram trazidas à tona, como um comentário recente sobre a fome no Brasil. Em entrevista na sexta-feira, Bolsonaro disse que não existe "fome para valer" no país, o que Ciro disse ter ficado chocado ao ouvir. "Aberrações que eu já ouvi do senhor", afirmou o candidato do PDT. "Qualquer pessoa que conhece o Brasil, como eu conheço, vê nas ruas pessoas com placas pedindo comida."
Bolsonaro respondeu dizendo que "cada um interpreta as informações como acha melhor". Ele reconheceu que "alguns mais necessitados passam fome, mas não nesse número exagerado", acusando o ex-governador do Ceará de "fazer demagogia" com números sobre a fome.
Ciro citou dados divulgados em junho pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) de que 33,1 milhões de brasileiros não têm o que comer. "Eu considero uma verdadeira aberração termos na testa da administração nacional brasileira um presidente que desconhece", disse o pedetista.
Tebet também fez ataques a Bolsonaro em suas intervenções. Questionada por Thronicke sobre saúde pública e a importância do SUS, a senadora emedebista lembrou sua própria atuação na CPI da Pandemia e condenou a forma como o governo lidou com a crise da covid-19. "Se tivesse tido coordenação do governo federal, nós teríamos uma pandemia melhor resolvida", declarou Tebet.
"Eu não vi o presidente da República pegar a moto dele e entrar num hospital para dar um abraço em uma mãe que perdeu um filho [para o coronavírus]. Eu vi mais do que isso. Eu vi um escândalo de corrupção na compra de vacinas."
A gestão da pandemia voltou a ser mencionada por Ciro, que disse que o Brasil já foi considerado um exemplo em cobertura vacinal, e hoje o que se vê é "propaganda contra a vacina, disputa politiqueira sobre quem é o pai da vacina, propina na compra de vacina. Isso é onde nós estamos, muito próximos do fundo do poço."
Thronicke, candidata do União Brasil (partido que resultou da fusão entre PSL e DEM), tampouco poupou Bolsonaro. A senadora do Mato Grosso do Sul acusou o presidente de proferir mentiras sobre o Auxílio Brasil e sobre não haver corrupção em seu governo. Questionada sobre liberdade religiosa, declarou: "Chega de usar o nome de Deus em vão."
Tema das mulheres domina o debate
As duas senadores e únicas candidatas mulheres no debate trocaram declarações sobre os direitos femininos, que acabaram dominando grande parte do evento.
Tebet prometeu que, se for eleita, garantirá a paridade de gênero entre seus ministros. Lula, por sua vez, disse que não pode assumir o compromisso "numericamente", mas afirmou que vai indicar "as pessoas que tem capacidade para assumir determinados cargos".
Em um dos momentos mais tensos do debate, Bolsonaro atacou a jornalista Vera Magalhães, que havia feito uma pergunta sobre desinformação em relação às vacinas.
"Acho que você dorme pensando em mim, você não pode tomar partido num debate como esse. Vera, você é uma vergonha para o jornalismo", declarou o presidente.
Em outro momento, Tebet disse que também foi alvo de violência política por parte do governo Bolsonaro, manifestou solidariedade à jornalista e acabou sendo também alvo do candidato à reeleição.
"A senhora é uma vergonha para o Senado, não vem com essa historinha de que eu ataco mulheres, de se vitimizar", disse o presidente. Questionado por Tebet sobre por que ele odeia tanto as mulheres, Bolsonaro as acusou de fazerem "joguinho de mimimi" quando condenam suas declarações misóginas.
Lula também expressou apoio às duas, durante suas considerações finais no fim do debate. "Eu me solidarizo com a senadora Simone e com a jornalista que foi agredida", disse o petista.
O mesmo fez Thronicke. "Quando vejo o que aconteceu com a Vera, eu realmente fico extremamente chateada. Quando homens são tchutchucas com outros homens, mas vêm para cima da gente sendo tigrão. Eu fico extremamente incomodada, fico brava."
Ciro e Lula
Ex-aliados, Ciro e Lula também protagonizaram momentos de tensão no debate. Questionado sobre as divisões na esquerda brasileira e as atuais hostilidades com seu ex-ministro, o petista tentou fazer um afago a Ciro, dizendo que o pedetista tem "o coração mais mole do que a língua" e afirmando respeitar seu adversário. Este, contudo, foi mais duro em sua resposta.
Ciro afirmou que Lula é um "encantador de serpentes" que "vai na emoção das pessoas e sempre quer trazer a coisa para o lado pessoal, mas não é pessoal". Segundo o ex-governador, o petista "se deixou corromper" e é responsável pela crise econômica e pela agressividade que se vê hoje no clima político do país.
O ex-presidente rebateu, afirmando que Ciro "diz inverdades" a seu respeito e um dia pedirá desculpas por isso. Ele também cutucou seu adversário por ter ido a Paris após o primeiro turno das eleições de 2018, recusando-se a declarar apoio ao então candidato Fernando Haddad (PT), que acabou sendo derrotado por Bolsonaro no segundo turno.
Tensão nos bastidores
Mas o clima esquentou ainda mais nos bastidores, onde estavam reunidos assessores e convidados dos presidenciáveis. O ex-ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro Ricardo Salles e o deputado André Janones (Avante), apoiador de Lula, protagonizaram uma troca de ofensas e tiveram que ser apartados por seguranças.
Ainda durante o primeiro dos três blocos do debate, os dois chegaram a se levantar, ficar frente a frente e pôr o dedo em riste. Enquanto Salles acusava Janones de "caixa dois", este chamava o ex-ministro de miliciano.
Após a briga, à qual acabaram se envolvendo também outros dos presentes, os seguranças fizeram um cordão de segurança para separar os bolsonaristas dos lulistas no lounge da TV Bandeirantes, durante o intervalo do segundo bloco.
O melhor e o pior desempenho
Ao longo do debate, o instituto Datafolha realizou uma pesquisa com 64 eleitores indecisos, que foram separados em três salas virtuais durante os confrontos entre os candidatos. Os entrevistados avaliaram o desempenho dos presidenciáveis em cada um dos três blocos e, por fim, disseram quem se saiu melhor e pior em todo o evento.
Com suas críticas aos governos Bolsonaro e Lula, Tebet foi a mais bem avaliada, enquanto o atual presidente foi o pior. A senadora do MDB está em quarto lugar nas pesquisas eleitorais.
Depois de Tebet, o candidato que teve o melhor desempenho ao longo do debate foi Ciro, seguido por Bolsonaro e Lula, que ficaram empatados. D'Avila e Thronicke foram os últimos mencionados.
Já entre as avaliações negativas, pouco mais da metade dos entrevistados afirmou que Bolsonaro foi quem se saiu pior no debate. Em segundo lugar aparece Lula, com menos da metade do percentual do atual presidente. O petista é seguido por Thronicke, D'Avila, Tebet e Ciro.
ek (ots)
REDES SOCIAIS