Aliados de Bolsonaro evitam falar em contestação do resultado


Jean-Philip Struck

31/10/2022 01h54

Bolsonaro e filhos mantêm silêncio após derrota. Alguns aliados parabenizam Lula. Outros falam em fazer oposição ao governo do petista em 2023. Em discurso, presidente eleito questiona se Bolsonaro vai reconhecer votaçãoEnquanto Luiz Inácio Lula da Silva (PL) fez dois discursos na noite deste domingo (30710) após a oficialização do resultado do segundo turno, Jair Bolsonaro (PL) optou pelo silêncio. Até a madrugada de segunda-feira, o presidente de extrema direita ainda não havia feito nenhum pronunciamento ou divulgado comunicado sobre a vitória do seu adversário.

Segundo o jornal Folha de S.Paulo, um assessor do presidente comunicou ministros do governo que tentaram falar com Bolsonaro que ele havia ido dormir. Por volta de 22h, as luzes do Palácio da Alvorada foram apagadas.

Os filhos mais velhos do presidente – o senador Flavio Bolsonaro (PL-RJ), o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) –, normalmente ativos nas redes sociais, também permaneciam em silêncio até a publicação desta reportagem.

Apesar de ter feito um uso político sem precedentes da máquina pública e até mesmo recorrido a táticas ilegais para dificultar a circulação de eleitores em redutos de Lula, Bolsonaro acabou sendo derrotado por uma frente ampla que se organizou em torno do seu rival. Com 100% das urnas apuradas, Lula conquistou 50,90% dos votos, contra 49,10% do atual presidente de extrema direita.

Com a derrota, Bolsonaro se tornou o primeiro presidente no poder a perder a reeleição desde que o mecanismo começou a ser aplicado em 1998.

Há expectativa sobre qual vai ser o tom adotado por Bolsonaro quando ele finalmente se pronunciar sobre o resultado nas urnas.

Nos últimos anos, Bolsonaro sistematicamente tentou minar a confiança no sistema eleitoral, antecipando um discurso infundado de "fraude" nas urnas.

Ele também sinalizou diversas vezes que pode não reconhecer uma vitória de Lula, levantando o temor de uma ofensiva semelhante àquela lançada pelo seu ídolo, o ex-presidente americano Donald Trump, que em janeiro de 2021 instigou a invasão da sede do Congresso americano por uma turba de apoiadores radicais – tudo com o objetivo de tentar impedir a oficialização da sua derrota e a vitória do democrata Joe Biden.

Lula, em seu segundo discurso da noite, na avenida Paulista, abordou o silêncio de Bolsonaro e levantou dúvidas sobre como vai ser a transição.

"Em qualquer lugar do mundo, o presidente derrotado já teria ligado pra mim reconhecendo a derrota, ele até agora não ligou. Não sei se vai ligar. E não sei se vai reconhecer”, disse Lula. "Eu preciso saber se o presidente que nós derrotamos vai permitir que haja uma transição para que a gente tome conhecimento das coisas.”

Mais cedo, enquanto a votação ainda ocorria, Lula disse que, caso Bolsonaro se recuse a participar da cerimônia de entrega de faixa presidencial, ele a receberá "do povo brasileiro".

Aliados reconhecem derrota de Bolsonaro

Apesar de toda a retórica golpista de Bolsonaro nos últimos meses, vários aliados do presidente evitaram seguir essa linha em seus primeiros pronunciamentos após o resultado deste domingo. Alguns reconheceram a derrota de Bolsonaro e a vitória de Lula. Outros, afirmaram que pretendem fazer oposição a um governo do petista em 2023.

Um dos principais aliados de Bolsonaro, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), foi a primeira grande liderança política a se manifestar após a oficialização da vitória de Lula

Em pronunciamento, Lira parabenizou o presidente eleito afirmou que "a vontade da maioria manifestada nas urnas jamais deverá ser contestada”.

"Ao mesmo tempo em que aceitamos a vitória, não podemos aceitar revanchismos. A Câmara dos Deputados estará sempre cumprindo o seu papel crucial de casa do povo brasileiro”, completou o presidente da Câmara. Nas últimas, Lira chegou a abraçar algumas pautas do bolsonaismo como uma ofensiva contra institutos de pesquisa, mas evitou endossar as manifestações mais explicitas do ocupante do Planalto contra o sistema eleitoral.

Em seu pronunciamento Lira estava acompanhado do deputado Ricardo Barros (PP-PR), que é líder do governo na Câmara.

O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, indicado por Bolsonaro e que sistematicamente blindou o presidente de investigações desde 2019, adotou um tom semelhante ao de Arthur Lira. Em nota divulgada no site da PGR, Aras parabenizou Lula pela vitória.

O governador eleito de São Paulo, Tarcísio Freitas (Republicanos), um apadrinhado de Bolsonaro que conquistou a única vitória significativa para a extrema direita neste domingo ao derrotar Fernando Haddad na disputa pelo Palácio dos Bandeirantes, também evitou falar em contestação de resultados e indicou como pretende lidar com um governo Lula.

Tarcísio disse que pretende ter uma "relação republicana" com o presidente eleito e que deseja ter o "melhor diálogo possível" com o governo liderado pelo PT a partir de 2023. "Vai ser uma relação republicana [com Lula]. Nós queremos fazer a diferença pelo estado de São Paulo. Então nós vamos zelar pelos interesses de São Paulo, pelos interesses do cidadão de São Paulo" afirmou Tarcísio.

"A partir do momento em que houver convocação para uma conversa [com Lula], nós estaremos lá, e vamos sempre buscar o melhor para o estado de São Paulo", completou o novo governador de São Paulo, que teve Bolsonaro como principal cabo eleitoral na campanha.

A ex-ministra e senadora eleita Damares Alves (Republicanos-DF), uma das principais figuras da ultradireita evangélica associada ao bolsonarismo, usou as redes sociais para reconhecer a derrota do presidente. Ela disse que Bolsonaro deixa "um legado e formou líderes que hoje são senadores, deputados e governadores".

"Perdemos uma eleição, mas não perdemos o amor pelo nosso país. Bolsonaro deixará a Presidência da República em janeiro de cabeça erguida, com a certeza de dever cumprido e amado por milhões de brasileiros", escreveu Damares.

O ex-juiz e senador eleito Sergio Moro, que recentemente se reconciliou com Bolsonaro e se engajou fortemente na campanha do presidente no segundo turno, também evitou falar em contestar o resultado das urnas e disse que vai "estar na oposição em 2023”.

"A democracia é assim. O resultado de uma eleição não pode superar o dever de responsabilidade que temos com o Brasil. Vamos trabalhar pela união dos que querem o bem do País. Estarei sempre do lado do que é certo! Estarei na oposição em 2023,respeitando a vontade dos paranaenses.", escreveu Moro no Twitter.

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