Para entregar essas promessas, Lula precisará manter uma relação produtiva com o Congresso, onde serão analisados projetos de lei e de emendas à Constituição de interesse do novo governo – como a reforma tributária e a definição de uma nova âncora fiscal. Uma base segura de deputados e senadores também é útil como escudo contra fortes instabilidades políticas.
Lula já levou isso em consideração na composição de seus ministérios. Ao dar pastas a PDT, MDB, PSD e União Brasil – que não integravam a sua coligação de campanha – o petista ampliou, formalmente, sua base em 160 deputados e 34 senadores.
A fidelidade dos congressistas à orientação de seus partidos, porém, varia muito. O MDB, por exemplo, é grande mas fragmentado regionalmente, de acordo com os interesses de caciques estaduais. E o União Brasil, resultado da fusão entre Democratas e PSL, é uma legenda de direita, distante da orientação do novo governo, e tem nos seus quadros o ex-juiz e senador eleito Sergio Moro, antípoda de Lula.
Por outro lado, é possível que o governo consiga obter o apoio eventual de congressistas que não estão em sua base formal, de partidos como PP, Republicanos e Cidadania, negociando projeto a projeto.
As novas legislaturas da Câmara e do Senado tomam posse em 1º de fevereiro, quando serão eleitas as suas novas mesas diretoras, cujo resultado também pode influenciar a governabilidade de Lula.
Base formal maior que no Lula 1
É impossível prever com exatidão qual será o tamanho da base real do presidente. Uma projeção aproximada é considerar os congressistas de partidos da coligação de campanha de Lula e os que ganharam ministérios. Segundo essa metodologia, o novo governo terá na largada uma base de 282 deputados e 46 senadores.
Trata-se de uma base de deputados 16% maior e uma de senadores 84% maior do que a que Lula tinha no início do seu primeiro governo, em 2003. Suficiente para aprovar projetos de lei e bloquear processos de impeachment, mas inferior ao necessário para aprovar uma emenda à Constituição. O escândalo do mensalão, que eclodiu em 2005, teve em sua gênese uma tentativa do governo de ampliar sua base por meio da compra de apoio político.
Após as eleições de 2006, 2010 e 2014, vencidas por Lula e por Dilma Rousseff, o PT ampliou seu arco de alianças para mais de 300 deputados e 40 senadores. Essa base esfacelou-se no segundo governo Dilma, em meio a outro escândalo de corrupção, a Operação Lava Jato, combinado com grave recessão e protestos de rua.
Jair Bolsonaro elegeu-se com o discurso de que faria uma "nova política" e não governaria sob o presidencialismo de coalizão, no qual o presidente dá espaço em seus ministérios a partidos que o apoiam no Congresso – seu primeiro gabinete deu preferência a militares e pessoas sem filiação partidária.
Esse formato mostrou-se insuficiente para que o governo Bolsonaro tivesse sucesso em iniciativas legislativas e o deixava exposto a um possível impeachment, e acabou abrindo espaço, a partir de 2020, para a entrada de nomes do Centrão no gabinete e uma nova forma de cooptação de apoio parlamentar, o orçamento secreto.
Lula terá "boa largada"
A cientista política Márcia Ribeiro Dias, professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), diz que "tamanho da base não quer dizer confiabilidade", mas avalia que Lula terá uma "boa largada" no Congresso para iniciar o governo.
"Na Câmara, a base está entre o Lula 1 e o Lula 2. No Senado, é idêntica à do Lula 2, que foi um governo de crescimento e estabilidade. A confiabilidade dessa base dependerá da capacidade de articulação política, mas sabemos que Lula tem grande expertise nisso", diz.
O desafio será grande. A nova legislatura tem uma orientação política mais à direita, e o PL, partido de Bolsonaro e que reúne parte dos congressistas de extrema direita, elegeu a maior bancada na Câmara deste ano, com 99 deputados.
Dias, no entanto, pontua que os adversários "muito ideológicos" do governo serão a minoria, e que o perfil do vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB), deverá contribuir na tarefa de Lula de atrair alguns congressistas mais conservadores e a "parte mais fisiológica" do Congresso.
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