A suspeita é de que o ex-presidente e membros de seu círculo familiar e pessoal teriam se beneficiado de um esquema de inserção de dados fraudulentos nos sistemas do Ministério da Saúde para obtenção de cartões vacinais, visando assegurar a entrada dos investigados nos Estados Unidos e burlando exigências sanitárias das autoridades americanas.
Em seu depoimento, Bolsonaro negou ter pedido a inserção de dados falsos em sua carteira de vacinação e no de sua filha. Ele também afirmou o ex-ajudante de ordens da Presidência tenente-coronel Mauro Cid, seu ex-braço direito, nunca comentou com ele sobre certificados de vacina. O ex-presidente alegou ainda que só soube do caso quando esse foi revelado pela imprensa.
O depoimento de Bolsonaro durou mais de três horas. O ex-presidente respondeu a cerca de 60 perguntas.
Bolsonaro disse que não sabe mexer no ConecteSUS e que Mauro Cid era quem gerenciava sua conta no aplicativo. Ele afirmou que, se foram feitas alterações no sistema do Ministério da Saúde, elas ocorreram "à sua revelia, sem qualquer conhecimento ou orientação". Ele disse ainda não acreditar que seu ex-auxiliar tenha arquitetado a ação criminosa.
No depoimento, Bolsonaro destacou ainda que sempre afirmou que não tomou vacina contra covid-19 e por isso não tinha motivos para emitir certificados pelo sistema do ministério. O ex-presidente também alegou que sua filha entrou nos Estados Unidos como não vacinada e que não sabe quem gerencia as contas delas no ConecteSUS.
Atos antidemocráticos
À PF, Bolsonaro também negou ter participado ou orientado "qualquer ato de insurreição ou subversão contra o Estado Democrático de Direito" e disse duvidar que Cid tenha apoiado pautas golpistas. "Cid é um militar altamente qualificado, primeiro lugar em todos os cursos militares em que é graduado, sendo portanto um militar disciplinado e que jamais compactuaria com atos subversivos", diz trecho do depoimento.
Bolsonaro também foi questionado sobre o ex-major do Exército Ailton Gonçalves Moraes Barros, apontado como operador das fraudes nos cartões de vacina em Duque de Caxias (RJ). Barros também teria trocado mensagens com Cid sobre um eventual golpe de Estado. O ex-presidente disse ter não ter um relacionamento pessoal com Barros, apenas contatos esporádicos e "principalmente em momentos eleitorais". Ele negou ainda ter conhecimento sobre a suposta tentativa de golpe na qual Barros estaria envolvido.
Barros foi candidato pelo PL a deputado estadual no Rio de Janeiro em 2022. Ele se apresentou como "01 do Bolsonaro no Rio de Janeiro" durante a campanha. Ele conseguiu a suplência durante a eleição. Durante a campanha, ele publicou fotos ao lado do presidente.
Em 2006, quando ainda estava no Exército, Ailton Barros foi apontado como negociador, com traficantes do Comando Vermelho para a devolução de dez fuzis e uma pistola roubados de um quartel. O caso vazou para a imprensa e Barros acabou expulso do Exército pouco depois, após acumular uma série de processos na Justiça Militar que incluíam tentativa de abuso sexual de civis em acampamentos, mentiras em depoimentos e humilhação de militares de menor patente.
O caso das vacinas
Em 3 de maio, a PF realizou buscas na residência de Jair Bolsonaro em Brasília e prendeu seis pessoas, entre elas assessores do ex-presidente, incluindo Cid.
A operação, batizada de Venire, investiga a inserção de dados fraudulentos de vacinação contra a covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde, que teriam sido usados para garantir a entrada nos Estados Unidos de Bolsonaro e membros do círculo familiar e pessoal do ex-presidente, burlando a exigência de imunização.
O esquema investigado pela PF aponta que dados falsos de vacinação teriam sido inseridos em dois sistemas do Ministério da Saúde – o Programa Nacional de Imunizações e a Rede Nacional de Dados em Saúde – entre novembro e dezembro de 2022, com o objetivo de gerar comprovantes fraudulentos de vacinação.
Segundo a TV Globo, os sistemas adulterados do Ministério da Saúde chegaram a indicar que duas doses de vacinas da Pfizer contra covid-19 teriam sido aplicadas em Jair Bolsonaro. Após a operação, o ex-presidente negou que ele e a filha tenham se imunizado.
Os suspeitos de participarem do esquema são investigados, segundo a PF, pelos crimes de infração de medida sanitária preventiva, associação criminosa, inserção de dados falsos em sistemas de informação e corrupção de menores. De acordo com a PF, Bolsonaro tinha ciência da inserção fraudulenta de dados nos sistemas do Ministério da Saúde.
cn (ots)
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