O caso foi noticiado nesta quinta-feira (15/06) pelo jornal alemão taz. Sob pressão de adversários dentro da própria AfD, de acordo com a reportagem, von Storch afirma em carta entregue ao grupo parlamentar de cooperação bilateral que lamenta pela forma "nada diplomática" com que se expressou e que as palavras tenham dificultado o trabalho do grêmio.
Apoiadora declarada do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), antifeminista e cristã-fundamentalista, von Storch estava na comitiva de cinco deputados que viajou ao Brasil no início de maio e postou as palavras poucos dias após participar de uma agenda oficial com Moraes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O ministro é desafeto declarado do Bolsonarismo.
"Tivemos a ‘honra' de conhecer o maior criminoso do Brasil: Alexandre de Moraes", escreveu von Storch à época numa postagem que acabaria deletando mais tarde. "O coração de todo totalitário se derrete ao ver o poder desse senhor."
Durante a viagem ao Brasil ela também havia se encontrado com o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente de extrema-direita, a quem se referiu como "portador da esperança dos conservadores brasileiros".
No final de maio, a deputada fez uma sequência de postagens sobre o Brasil. Em um deles, a neta de Lutz Graf Schwerin, nazista que foi ministro de Finanças de Adolf Hitler, reitera as críticas a Moraes, acusando-o de violar a Constituição e os direitos humanos, atentar contra a separação de poderes e perseguir conservadores – inclusive parlamentares estrangeiros.
A deputada também já questionou a legitimidade do processo eleitoral brasileiro que levou à derrota de Bolsonaro.
Deputada diz lamentar escolha de palavras, não conteúdo
Segundo o taz, em reunião com o partido von Storch teria avaliado como um erro as palavras que escolheu para se expressar, mas não o conteúdo do que disse.
Tratada como ofensa pela imprensa alemã, a declaração sobre Moraes não foi bem recebida no Brasil – o governo brasileiro convocou o embaixador alemão e expressou seu descontentamento, ao passo que o embaixador brasileiro na Alemanha declarou que não participaria mais de eventos em que a deputada estivesse presente.
Constrangidos, os demais membros do grupo parlamentar de cooperação bilateral passaram a pressionar pela saída da deputada. Um deles, o social-democrata Manuel Gava (SPD), questionou em declaração ao taz o interesse de von Storch em um intercâmbio produtivo entre os dois países e referiu-se ao comportamento da deputada como "vergonhoso e indigno".
Em requerimento interno à legenda encaminhado no início desta semana, ao qual o taz teve acesso, 11 correligionários de von Storch no Bundestag argumentavam que a atitude dela prejudicou a relação entre os dois países, fechou as portas da embaixada brasileira ao partido e inviabilizou agendas oficiais no Brasil. Como reparação, os colegas sugeriram que a deputada se desculpasse oficialmente e tivesse seu direito de fala no Parlamento suspenso por seis semanas legislativas.
O caso foi encaminhado à liderança da bancada da AfD – da qual von Storch faz parte – para análise e decisão sobre eventuais sanções.
Quem é von Storch?
Ativa em círculos de direita desde seus tempos de faculdade, Beatrix von Storch, de 52 anos, chegou a trabalhar como advogada, mas no fim dos anos 2000 deixou a profissão para se dedicar à política em tempo integral. Ela é casada com Sven von Storch, de quem adotou o sobrenome em 2010.
Sven, membro de uma família alemã que se fixou no Chile após a derrota da Alemanha na Segunda Guerra Mundial, dirige junto com sua mulher vários coletivos e lobbies ultraconservadores na Alemanha, que promovem ideias antimigratórias e "valores cristãos" e se opõem ao casamento gay.
Em 2013, veículos da imprensa alemã levantaram a suspeita de que o casal havia embolsado 98 mil euros que haviam sido doados para um desses coletivos dirigidos por Sven. Beatrix von Storch negou irregularidades e disse que sacou o dinheiro para colocá-lo em um cofre como medida de prevenção.
Sven também costuma publicar textos no site Freie Welt – ligado aos coletivos do casal – advertindo contra o que chama de "grande reset" mundial e a "ideologia de gênero", entre outros temas que costumam ser explorados pela direita mundial, inclusive a bolsonarista.
Um partido de ultradireita
Em 2013, Beatrix Von Storch se filiou ao AfD, à época ainda uma sigla majoritariamente eurocética moderada que contava com vários liberais. Inicialmente, os fundadores tinham como objetivo combater o uso do euro como moeda e promover a volta do marco alemão.
Mas a AfD rapidamente se converteu de maneira veloz em um agrupamento ultranacionalista e anti-imigração entre 2014 e 2015. A deputada foi uma das responsáveis por essa guinada. Como resultado, vários fundadores deixaram a sigla, afirmando que o partido havia se tornado um veículo "iliberal", que se distanciou do seu propósito original.
De fato, a AfD é hoje um guarda-chuva para diferentes grupos de ultradireita, como arquiconservadores, fundamentalistas cristãos e ultranacionalistas. Muitos membros também são acusados regularmente de nutrir simpatias pelo nazismo.
Em 2020, por exemplo, um ex-porta-voz da sigla causou indignação ao ser gravado afirmando que se "orgulhava de sua ascendência ariana" e se descrevendo como "um fascista". Meses depois, ele foi novamente gravado sugerindo que imigrantes deveriam "ser mortos com gás".
Outros membros de destaque da sigla também foram alvo de críticas por posições abertamente racistas ou que minimizavam o nazismo.
ra/cn (ots)
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