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A Deutsche Bahn, uma das maiores empresas ferroviárias da Europa, tem registrado queda no desempenho nas últimas décadasCancelamentos, greves, atrasos frequentes. Trens alemães são cada vez mais fonte de aborrecimento para passageiros. Com estrutura defasada, estatal Deutsche Bahn fica para trás na comparação com a concorrência europeia.Repetidas vezes nas últimas semanas, a paralisação dos trens causou prejuízos milionários e forçou passageiros alemães a escolherem entre ficar presos em uma estação ferroviária ou em um engarrafamento.

As greves são apenas uma faceta dos muitos desafios enfrentados pelo serviço ferroviário alemão. Os passageiros enfrentam regularmente atrasos prolongados e cancelamentos por diversos motivos que vão além das disputas trabalhistas.

Cancelamentos frequentes

A DB opera a maioria das ferrovias da Alemanha e é responsável por aproximadamente 95% do transporte de longa distância, 67% dos trechos regionais e 42% do transporte de carga. Em 2023,apenas 64% dos trens de longa distância chegaram ao seu destino no horário, ou seja, com menos de seis minutos de atraso, de acordo com um porta-voz da DB. Esses números, entretanto, não incluem os casos em que os atrasos são tão longos que as viagens são canceladas.

Segundo um levantamento de 2023 realizado pela organização sem fins lucrativos Consumer Choice Center (Centro de Escolha do Consumidor), a Alemanha teve seis das 10 piores estações ferroviárias em termos de conveniência para passageiros na Europa. O índice, que avaliou fatores como opções de acessibilidade, conexões de transporte, wi-fi gratuito e cobertura ferroviária, indicou que o sistema ferroviário alemão está muito atrás do de seus vizinhos em termos de serviço e eficiência.

Onde a rede de trens da Alemanha deu errado?

Embora seja de propriedade do Estado alemão, a DB opera como uma empresa privada. Isso envolve a terceirização para subcontratados privados por meio de licitações competitivas e busca de lucratividade. Apesar disso, a empresa também recebe financiamento público e apresenta características de um monopólio.

Andreas Schröder, economista da associação alemã sem fins lucrativos de defesa dos passageiros ferroviários Pro Bahn, disse à DW que as opiniões sobre os desafios enfrentados pela gigante ferroviária alemã estão divididas de acordo com linhas políticas, principalmente devido à dupla estrutura pública e privada da DB.

"No lado esquerdo do espectro político, os críticos atribuem as questões à privatização, fazendo comparações com a eficiência das empresas estatais em países como a Suíça", disse ele.

Por outro lado, acrescentou, "os adeptos de políticas econômicas mais liberais argumentam que a raiz do problema está na falta de concorrência, apontando exemplos de países como a Itália, onde a presença de pelo menos duas grandes empresas resultou em um melhor desempenho".

Contudo, os observadores de ambos os lados do espectro político concordam amplamente que os problemas do DB resultam de anos de investimento inadequado. Os cortes iniciais datam de 2004, quando o orçamento anual atribuído à DB para a construção e modernização de linhas ferroviárias foi drasticamente reduzido de 4 bilhões de euros (R$ 21,4 bilhões) para 1,5 bilhão de euros (R$ 8 bilhões).

"Investimos na indústria automobilística e nas nossas estradas em vez de investirmos nas nossas ferrovias. Funcionou, tornando a Alemanha um centro de trânsito rodoviário, mas é hora de fazer o mesmo com o nosso sistema ferroviário", disse Schröder.

Falta de mão de obra e infraestrutura desatualizada

Décadas de subfinanciamento traduziram-se numa série de outros problemas. Em um relatório publicado em janeiro, a Deutsche Bahn descreveu sua rede ferroviária como "velha" e "propensa a falhas", incapaz de acompanhar o rápido crescimento do tráfego.

Há também uma escassez de novas ferrovias. Em países com sistemas ferroviários eficientes, como Japão, Suíça e Holanda, onde entre 90% e 99% de todos os trens chegam na hora, os trens de alta velocidade têm normalmente uma linha exclusiva. Na Alemanha, trens de alta velocidade como o Intercity Express (ICE) compartilham trilhos com trens regionais e de carga. Apenas algumas rotas são reservadas especificamente para o ICE.

Com mais de 7,6 milhões de passageiros diários, a DB emprega aproximadamente 200 mil pessoas, solidificando a sua posição como um dos maiores empregadores da Alemanha. A SNCF francesa possui uma força de trabalho de cerca de 275 mil pessoas, gerenciando cerca de 10 milhões de passageiros diários. A empresa espanhola Renfe Operadora tem 1,4 milhão de passageiros diários e 40 mil funcionários. A Swiss Federal Railways (SBB), que emprega 34.200 pessoas, movimenta cerca de 1,2 milhão de passageiros por dia.

​Em contraste com suas contrapartes europeias mais avançadas tecnologicamente, que se beneficiam de um maior grau de automação, a DB tem enfrentado uma falta crônica de pessoal, levando a atrasos atribuídos à falta de maquinistas ou operadores de sinal.

"Os sindicatos estão pressionando por melhores condições de trabalho para seus funcionários, na esperança de que isso incentive as pessoas a trabalhar no setor e evite que elas procurem outros empregos", disse Lukas Iffländer, presidente da Pro Bahn, à DW. "Eles têm razão, embora suas exigências possam levar algum tempo para serem atendidas."

A Deutsche Bahn voltará aos trilhos?

A Alemanha já iniciou esforços para reforçar o orçamento da DB. No entanto, Schröder espera que a expansão planejada, a modernização e a manutenção da rede ferroviária exijam um trabalho de construção substancial.

"O processo pode levar anos para dar frutos", disse ele, acrescentando que é provável que cause mais interrupções ao longo do caminho. "Provavelmente precisaremos nos preparar para mais trens atrasados e irregulares."

Schröder também apontou que a modernização do sistema ferroviário em um país densamente povoado como a Alemanha seria mais desafiadora do que em nações menos densamente povoadas.

"Países como a Espanha ou a Suíça têm muito espaço para desenvolver novas ferrovias. Na Alemanha, uma grande dificuldade está em traçar novas rotas ferroviárias através de cidades, comunidades e áreas já alocadas para fins públicos ou privados", explicou.

De acordo com Iffländer, são necessárias reformas, especialmente de organização. Ele argumenta que a DB deve se afastar do modelo de gerenciamento em que uma empresa gigante supervisiona cada projeto. "Veja nosso vizinho do leste, a Polônia, por exemplo, onde os projetos de construção são concluídos mais rapidamente porque são executados por empresas menores", disse ele.

Iffländer também defendeu uma maior supervisão do governo, destacando que a DB tem tradicionalmente desfrutado de um alto nível de poder de decisão. O governo alemão também deveria fornecer diretrizes mais rígidas, segundo Iffländer, priorizando serviços de qualidade e infraestrutura sólida.

"Basicamente, a administração pode decidir onde investir seus fundos", disse ele. "Eles se concentraram na obtenção de lucros, o que beneficia a empresa, mas deixa os passageiros de fora."