Alta do dólar inquieta economias, e não só as emergentes


Uwe Hessler

17/04/2024 14h22

Não é só no Brasil: moeda americana está se fortalecendo e causando preocupação em todo o mundo. Principal motivo é perspectiva cada vez mais distante de queda dos juros nos EUA.O fortalecimento do dólar desde o início de 2024 tornou-se uma grande preocupação em países de todo o mundo, causando temores não apenas nas economias emergentes, mas também em países industrializados avançados.

As moedas do G20, grupo que reúne as maiores economias do mundo, estão quase todas se desvalorizando. A lira turca lidera o declínio desde o início do ano, com mais de 8%. No mesmo período, o iene japonês caiu 8% e o won, da Coreia do Sul, 5,5%.

Nos últimos sete dias, o dólar disparou também em relação ao real. A moeda americana se valorizou mais de 5% nesse curto espaço de tempo e valia por volta de R$ 5,25 nesta quarta-feira (17/04).

Essa tendência de alta da moeda dos EUA se verifica também nas economias desenvolvidas, com o dólar australiano, o dólar canadense e o euro em queda de 4,4%, 3,3% e 2,8%, respectivamente.

Por que o dólar está subindo?

O principal impulso por trás da alta do dólar é a perspectiva cada vez menor de que o Banco Central dos EUA reduza suas taxas de juros em breve. O índice de preços ao consumidor (CPI), divulgado na quarta-feira passada, subiu um pouco acima das expectativas do mercado, o que significa que a inflação continua acelerando nos EUA.

Consequentemente, os investidores reduziram suas apostas em possíveis cortes nas taxas de juros pelo Fed, o que impulsionou a alta do dólar.

Além disso, as crescentes tensões no Oriente Médio após o ataque sem precedentes do Irã a Israel também impulsionaram a moeda americana devido ao seu status de porto seguro.

E embora muitas economias em todo o mundo estejam experimentando um crescimento moderado, os indicadores econômicos dos EUA, desde os números de emprego até as vendas no varejo, superam consistentemente as expectativas.

Se várias economias emergentes ainda oferecem rendimentos mais altos em seus títulos do que os EUA, essa diferença está caindo. No início do ano passado, a taxa de juros do Brasil era de 13,75%, a do Chile era de 11,25% e a da Hungria, de 13%.

Desde então, os bancos centrais dessas três economias reduziram suas taxas básicas, diminuindo a vantagem de rendimento para os possíveis investidores. Atualmente, a Selic está em 10,75% ao ano.

No Brasil, há ainda o fator local. O dólar disparou nesta terça-feira depois de o governo anunciar a revisão da meta fiscal para 2025, que passou de um resultado primário de 0,5% para zero.

"Tem muita coisa que está fazendo com que o mundo esteja atento ao que está acontecendo nos Estados Unidos, e o dólar está se valorizando frente às demais moedas. Eu diria que isso não explica tudo o que está acontecendo no Brasil, mas explica dois terços", comentou o ministro das Finanças, Fernando Haddad, minimizando a relação entre a revisão da meta fiscal e a alta do dólar.

Riscos para os emergentes

Países em desenvolvimento são particularmente sensíveis aos efeitos negativos da alta do dólar, pois esse aumento faz com que os juros de suas dívidas em dólar subam, aumentando a sua carga total de juros.

De acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), um aumento de 10% do dólar reduziria o Produto Interno Bruto (PIB) das economias emergentes em 1,9% após um ano, com efeitos econômicos adversos que durariam mais de dois anos.

Em 2022, quando um fortalecimento semelhante do dólar estava em andamento, o Sri Lanka entrou efetivamente em default com a desvalorização de sua moeda. Outras economias emergentes tentaram evitar a desvalorização de suas moedas aumentando as taxas de juros antes do Fed em 2021 e 2022.

No início de 2024, muitos acreditavam que as taxas de juros dos EUA cairiam até o fim do ano e que a alta do dólar seria contida. Mas agora há sinais de que o dólar pode estar apenas no início de uma longa curva de valorização e que o retorno aos patamares anteriores pode demorar mais do que o esperado.

BC interveio no câmbio

Governos de alguns países emergentes já começaram a agir. No início de abril, o Banco Central do Brasil interveio no mercado de câmbio pela primeira vez no terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Embora governo e Banco Central não tenham explicado claramente suas intenções, o palpite no mercado é de que o objetivo era controlar a desvalorização do real.

O Banco Central da Indonésia vem intervindo para sustentar a rupia, que está em seu nível mais baixo em quatro anos, oscilando em torno de 16 mil rupias por dólar. O Banco Central da Turquia também aumentou sua taxa de juros em 5 pontos percentuais, para 50% em março, em resposta à desvalorização da lira e à aceleração da inflação.

No entanto, aumentar as taxas de juros, com o objetivo de conter a inflação, também tem um efeito negativo na economia, pois o encarecimento do crédito desestimula o consumo e desacelera o crescimento.

O analista Kota Hirayama, da SMBC Nikko Securities, afirma que o risco de um retorno da inflação está aumentando nas economias emergentes devido às taxas de câmbio e ao aumento dos preços do petróleo.

"Entretanto, é improvável que esses países aumentem as taxas de juros. Em vez de reagir com a política monetária, é provável que respondam temporariamente à desvalorização de suas moedas por meio de intervenções para ganhar tempo", afirmou, numa nota aos investidores.

A China, por exemplo, está usando sua fixação diária de moeda para apoiar o yuan, e alguns bancos estatais chineses estão vendendo reservas em dólares. O Banco da Indonésia está mais ou menos fazendo o mesmo, pois usa suas reservas cambiais para comprar rupias.

G20 abordará a força do dólar

Essas preocupações não se limitam apenas às economias em desenvolvimento: o Japão e outros países desenvolvidos estão nervosos com a contínua desvalorização de suas moedas.

O ministro das Finanças do Japão, Shunichi Suzuki, disse que o dólar deverá estar na pauta da próxima reunião dos ministros das Finanças e dos presidentes dos bancos centrais do G20, que será realizada esta semana em Washington, nos EUA. "Já discutimos a fuga de capitais anteriormente", declarou.

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