Fundação Padre Anchieta

Custeada por dotações orçamentárias legalmente estabelecidas e recursos próprios obtidos junto à iniciativa privada, a Fundação Padre Anchieta mantém uma emissora de televisão de sinal aberto, a TV Cultura; uma emissora de TV a cabo por assinatura, a TV Rá-Tim-Bum; e duas emissoras de rádio: a Cultura AM e a Cultura FM.

CENTRO PAULISTA DE RÁDIO E TV EDUCATIVAS

Rua Cenno Sbrighi, 378 - Caixa Postal 66.028 CEP 05036-900
São Paulo/SP - Tel: (11) 2182.3000

Televisão

Rádio

PORTO VELHO (RO) - Movimentos sociais e organizações ambientais foram surpreendidos com uma lei que modificou a Política Estadual de Governança Climática e Serviços Ambientais (PGSA) em Rondônia. O projeto de lei 5.868/2024, aprovado pela Assembleia Legislativa e sancionado pelo governador Marcos Rocha (União Brasil), centraliza o controle do Fundo Estadual de Governança Climática e Serviços Ambientais (Funclima) e exclui a participação social em decisões sobre o futuro ambiental do Estado.

A medida foi criticada por entidades que acusam o Governo de Rondônia de enfraquecer um dos princípios fundamentais da política ambiental. À CENARIUM, o gestor ambiental e conselheiro da Organização Não Governamental (ONG) Kanindé, Edjales Benício, afirmou que há três pontos polêmicos na legislação. Para Benício, a lei sancionada em setembro deste ano permite interferência política em decisões ambientais no Estado.

"Há três pontos polêmicos nessa lei. Primeiro, que o conselho do fundo é colocado como órgão diretivo e não deliberativo, ao contrário do que está na PGSA. Os planos setoriais serão aprovados pelo fórum, mas a aprovação final será feita pela Sedam [Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental]. Terceiro que a titularidade do carbono é atribuída ao governo do Estado, o que é contestado, pois a legislação em tramitação no Congresso Nacional afirma que a titularidade pertence aos povos indígenas e comunidades tradicionais", declarou.

Edjales Benício é conselheiro da ONG Kanindé (Divulgação)

Entre as principais mudanças promovidas pela nova lei está a reconfiguração do Conselho Gestor do Sistema Estadual de Governança Climática e Serviços Ambientais (SGSA). Antes composto por uma divisão equilibrada entre representantes do governo e da sociedade civil, o conselho agora é dominado por membros nomeados diretamente pelo governador. A participação local foi radicalmente reduzida, restando apenas um representante municipal, o que, na prática, silencia as comunidades mais afetadas pelas mudanças climáticas.

O gestor ambiental também apontou que a falta de debate público ou consulta ao Fórum Estadual de Mudanças Climáticas é vista como uma violação dos compromissos anteriores de governança democrática e transparente. A decisão foi tomada sem qualquer consulta ao grupo e gerou preocupações entre ativistas e especialistas sobre a transparência e o impacto das mudanças.

Centralização de poder

Antes composto por uma divisão equilibrada entre representantes do governo e da sociedade civil, o SGSA agora é dominado por integrantes nomeados diretamente pelo governador do Estado. A participação de ambientalistas e representantes diretos da sociedade foi radicalmente reduzida, restando apenas um representante municipal.

O biólogo e ambientalista Marcelo Ferronato, da Organização Não Governamental (ONG) Ecoporé, disse à CENARIUM a ausência de participação das comunidades agrícolas tradicionais, diretamente afetadas pelas mudanças climáticas no Conselho Gestor, é uma falha grave. Ele também afirmou ser desmotivador a dedicação de tempo à atividades em meio a insegurança na legislação.

"Essas comunidades, que sofrem diretamente os efeitos da degradação ambiental, têm um conhecimento profundo e específico que pode contribuir para políticas mais eficazes. A exclusão delas limita a representatividade e enfraquece o processo decisório. Além disso, é desmotivador para todos os profissionais envolvidos, como nós, que dedicamos tempo e inteligência às câmaras técnicas, enquanto mudanças são feitas sem consulta e sem transparência. Isso compromete diretamente o sucesso da política climática no Estado", destacou.

Marcelo Ferronato é biólogo e ambientalista (Reprodução/Redes Sociais)
Falta de regulamentação

Outro ponto considerado preocupante pelas lideranças sociais é o uso potencialmente indevido dos recursos do Fundo Estadual de Governança Climática. A nova legislação permite que os recursos captados pela comercialização de créditos de carbono sejam utilizados sem a regulamentação necessária para garantir sua aplicação em projetos ambientais adequados.

Ferronato apontou ainda que a concentração de controle sobre os fundos na Secretaria de Desenvolvimento Ambiental (Sedam) e a exclusão do papel fiscalizador da sociedade representam um risco para a transparência e a eficácia das políticas ambientais do Estado.

"Quando essas mudanças são feitas de forma súbita e sem comunicação, como ocorreu recentemente às vésperas de uma reunião do Fórum, a confiança nos processos de governança ambiental é severamente comprometida. A exclusão das partes interessadas viola os princípios de boa governança e desvaloriza o papel da sociedade civil e dos especialistas que dedicam tempo a essa agenda", elencou.

Carbono

Edjales Benício destacou que a decisão sobre o manejo do carbono não pertence ao Estado. De acordo com o conselheiro e ambientalista, a titularidade do carbono não é do Estado, mas de indígenas. Para ele, a lei que está tramitando no Congresso Nacional estabelece que a titularidade do carbono pertence aos povos indígenas e às comunidades tradicionais.

"Para as comunidades tradicionais, essa titularidade deve estar prevista no plano de manejo das unidades de conservação. Portanto, a legislação deixa claro que a titularidade não é do governo do Estado, como afirmado por alguns, mas sim dos povos indígenas e das comunidades tradicionais", defendeu.

Indígenas e trabalhadores rurais apontam ameaça do carbono em evento (Fundação Rosa Luxemburgo)

A nova lei introduz o conceito de "crédito de carbono jurisdicional", alinhando Rondônia com os mercados globais de carbono. No entanto, críticos apontam que essa mudança exclui as comunidades que deveriam ser as principais beneficiárias desses recursos, aprofundando ainda mais o abismo entre a política ambiental do Estado e as necessidades das populações mais vulneráveis.

Impactos em comunidades

As novas regras também afetam diretamente as iniciativas de pagamento por serviços ambientais (PSA). Projetos voluntários que historicamente incentivavam pequenos agricultores e comunidades tradicionais a participarem da preservação ambiental, foram excluídos da repartição de benefícios. Com essa mudança, as comunidades que há anos contribuem para a conservação da floresta enfrentaRrão uma perda de incentivos financeiros, favorecendo grandes corporações e interesses privados.

O ambientalista da Ecoporé ressaltou que a exclusão dessas comunidades da repartição de benefícios impacta gravemente suas vidas. "Comunidades tradicionais e pequenos agricultores dependem de mecanismos como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) para sustentar suas práticas de conservação e gerar renda. Quando são excluídas, perdem o incentivo para continuar preservando o meio ambiente, e sua subsistência fica ameaçada", frisou.

Governo inerte

Em meio à maior seca da história de Rondônia e uma onda de queimadas que atingiu o Estado nos últimos meses, o governador Marcos Rocha tem se mantido distante das discussões sobre a crise. Enquanto o mundo debate soluções para mitigar os impactos das mudanças climáticas, o chefe do executivo estadual sancionou a alteração da legislação ambiental sem qualquer aviso prévio, ignorando o agravamento da situação local.

"A gestão do governador Marcos Rocha tem sido, no mínimo, decepcionante no que se refere às políticas ambientais e à crise climática. Além de não regulamentar leis ambientais essenciais, como a Lei n° 4.437/2018, o governo tomou a decisão de revogar o caráter deliberativo do Conselho Gestor e centralizar o controle dos recursos na Sedam, sem qualquer consulta à sociedade. Isso nos pega de surpresa e compromete anos de esforços conjuntos", disse Marcelo Ferronato.

Marcelo Ferronato em um evento ambiental (Reprodução/Redes Sociais)

Edjales concordou com a observação. Para ele, a gestão é considerada um desastre. De acordo com o ambientalista, as ações da atual gestão levou o Estado de Rondônia ao que classificou como retrocesso na conservação ambiental.

Suas ações têm levado a um retrocesso na conservação ambiental. Especificamente, ele tentou regularizar o garimpo, o que não é de sua atribuição, especialmente em rios binacionais, e essa legislação foi julgada inconstitucional. Além disso, houve tentativas de reduzir o Parque Estadual de Guajará-Mirim e desafetar reservas, também consideradas inconstitucionais", destacou Edjales.

'Desgaste emocional'

A luta pela agenda climática em Rondônia é considerada desgastante e enfrenta inúmeros obstáculos. Os ambientalistas e lideranças locais que defendem a preservação da floresta amazônica e o combate à mudança climática precisam lidar com a falta de apoio público e o avanço de interesses ligados ao agronegócio e à exploração de recursos naturais.

"É importante enfatizar o desgaste emocional e institucional que essas decisões causam. Nós, que nos dedicamos à agenda climática, estamos investindo tempo e inteligência nas câmaras técnicas e nos debates. No entanto, essas mudanças são feitas sem consideração pelo trabalho que foi realizado. Teria sido mais honesto e direto encerrar de vez o Fórum e o Conselho, já que suas funções foram esvaziadas. A sensação de desrespeito é profunda, e isso afeta não só a eficácia da política climática, mas também a motivação dos envolvidos", finalizou Marcelo.

Leia mais: MPF defende uso de helicópteros para emergências médicas em Rondônia