Fundação Padre Anchieta

Custeada por dotações orçamentárias legalmente estabelecidas e recursos próprios obtidos junto à iniciativa privada, a Fundação Padre Anchieta mantém uma emissora de televisão de sinal aberto, a TV Cultura; uma emissora de TV a cabo por assinatura, a TV Rá-Tim-Bum; e duas emissoras de rádio: a Cultura AM e a Cultura FM.

CENTRO PAULISTA DE RÁDIO E TV EDUCATIVAS

Rua Cenno Sbrighi, 378 - Caixa Postal 66.028 CEP 05036-900
São Paulo/SP - Tel: (11) 2182.3000

Televisão

Rádio

O presidente Jair Bolsonaro estava determinado a usar as manifestações de 7 de Setembro para galvanizar apoiadores e marcar uma posição ainda mais firme em sua tática de enfrentamento aos demais Poderes. A dimensão dos atos pode até ter ficado aquém dos cálculos de alguns cientistas políticos. Mas a realidade é que o mercado sentiu o baque: o day after da Bolsa foi de ressaca, com o Ibovespa abrindo em queda de 2% e aprofundando as perdas até quase 4%.

Por enquanto, apesar das bravatas de Bolsonaro, o mercado ainda não enxerga que haja espaço para algum tipo de ruptura, nem por meio de um golpe nem por um processo de impeachment contra o presidente. Mas o tecido institucional está ainda mais esgarçado, o que torna o ambiente menos propício para o andamento de pautas econômicas que exigem a construção de consensos. E os protestos iniciados por alguns grupos de caminhoneiros simpáticos ao governo podem jogar mais lenha nessa fogueira se a mobilização se espalhar nos próximos dias.

O 6 Minutos conversou com especialistas para saber em que medida os ventos que tomaram a avenida Paulista e a Esplanada dos Ministérios em 7 de Setembro podem afetar as perspectivas do mercado.

O que os atos de 7 de Setembro trazem de novo? “De novo, nada: já é bem conhecida a tática de Bolsonaro de tensionar cada vez mais as regras do jogo, testar limites e recuar, morder e assoprar”, responde Fabio Klein, consultor econômico da Tendências Consultoria. “A questão é o grau: agora ficou explícito que ele partiu para o tudo ou nada.”

O tamanho das manifestações mostra que, mesmo com a popularidade em queda, Bolsonaro ainda tem uma base cativa que não é nada desprezível, algo entre 25% e 30% dos eleitores. Porém, ao mesmo tempo em que busca se aproximar desses seguidores mais fervorosos, ele acaba se distanciando de outros públicos e, principalmente, dos demais atores do jogo político.

“Ele está se isolando cada vez mais, promovendo a fraqueza do próprio governo, ao criar tensões. Ao voltar a atacar a derrota do voto impresso, que havia dito que aceitaria, ele se mostra pouco confiável”, complementa o economista. “Ele tem um perfil autoritário e anárquico, que não joga com as regras do jogo. Como se negocia com um cara desses?”.

No dia seguinte às manifestações, o Ibovespa caiu quase 4% e o dólar teve a maior alta em quase um ano. É o efeito Bolsonaro derretendo o mercado? É claro que existe uma relação de causa e efeito entre esses números e as manifestações. Mas a crise institucional que o Brasil atravessa já vem de alguns meses de conflitos entre Bolsonaro e os demais poderes, e os atos de 7 de Setembro representam apenas mais um passo nessa escalada. Assim, boa parte dessa deterioração já estava precificada pelo mercado.

“O Brasil já vinha performando bem abaixo dos seus pares. O problema dos pagamento dos precatórios pelo governo, a revisão para baixo das projeções de crescimento (que agrava a relação dívida x PIB) e a própria reforma tributária, nos moldes que estão sendo discutidos, aumentaram muito o risco fiscal”, explica Daniel Miraglia, economista-chefe da Integral Group.

Mesmo assim, diz ele, o mercado se surpreendeu com o tamanho das manifestações e com o tom belicoso do presidente, ao desafiar explicitamente o STF. “Isso não estava completamente no preço. E o cenário deve ficar mais desafiador daqui para a frente. Ainda estamos a um ano das eleições, mas já antecipamos completamente essa discussão.”

A interlocução com os demais Poderes tende a ficar mais difícil. Como isso pode impactar as pautas econômicas de interesse do mercado? O andamento dessas pautas tende a ser paralisado. Muitos temas, como a questão do parcelamento dos precatórios, dependem de uma costura de soluções entre o governo e o Congresso Nacional – e, com o bombardeio institucional de Bolsonaro, deixa de existir um ambiente favorável a acordos. Nesse sentido, o cancelamento das votações do Senado nos dias 8 e 9 de setembro, por decisão do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, é bastante simbólico.

Por outro lado, na opinião do economista da Integral Group, o provável congelamento da reforma tributária pode ser até positivo para o mercado.

“Não é essa a reforma que o mercado quer. Ela mais complica que simplifica a vida do contribuinte, eleva a já pesada carga tributária das empresas e vai limitar o crescimento potencial que o Brasil consegue ter com a inflação dentro da meta”, justifica. “Foi quando esse projeto [de reforma tributária] foi enviado para o Congresso, em julho, que o Brasil começou a se descolar negativamente dos pares.”

O caldo de um eventual impeachment de Bolsonaro começa a engrossar? Há controvérsias. Boa parte dos agentes econômicos ainda está cética quanto à possibilidade de alguma ruptura radical, seja uma tentativa de golpe por parte do presidente, seja um processo de impeachment contra ele. A aposta corrente do mercado é que a guerra institucional continuará cozinhando em fogo brando até o fim do mandato.

Ao mesmo tempo, a postura sempre agressiva de Bolsonaro vai fortalecendo o entendimento por parte dos demais atores políticos de que não vale a pena insistir no diálogo com ele. E eles podem começar a buscar alternativas.

“Talvez essa seja a novidade depois de 7 de Setembro: a constatação de que não dá mais para colocar panos quentes. ‘O que a gente faz com esse cara?’. A animosidade é tamanha que fica difícil avançar com qualquer agenda, inclusive outras pautas de interesse da Câmara, do Senado, da equipe econômica. Isso começa a gerar prejuízos até para o Centrão”, diz Klein. “Quando Bolsonaro não vê atendidos os interesses específicos da própria claque, ele simplesmente não joga junto.”

Ele acrescenta que os requisitos jurídicos, econômicos e sociais para a instauração de um processo de impeachment já existiam há um bom tempo e ficaram ainda mais presentes com os excessos cometidos por Bolsonaro nas manifestações. Mas essas bases materiais precisam ter legitimação política, o que esbarra na figura do presidente da Câmara, Arthur Lira, que detém o poder de comandar ou não o processo.

“Não está claro, na avaliação de perdas e ganhos dele, se o impeachment de Bolsonaro traria mais custos ou benefícios. Como ficariam o presidencialismo de coalizão, a troca de favores, o andamento das pautas, sob um governo do general Mourão, que é um não-político?”, pondera Klein. “Já se sabe que Bolsonaro está começando a atrapalhar, mas sua saída gera incertezas. E Lira jamais iniciaria um processo sem a certeza de que haveria quórum suficiente para ele passar.”

Como devem ficar os indicadores macroeconômicos daqui para a frente? “A única certeza é de que teremos muita volatilidade. Pode ser qualquer coisa: o dólar subir e derreter, a Bolsa cair e depois subir”, afirma Flávio Oliveira, head de renda variável da Zahl Investimentos. “O cenário é imprevisível, e o que gera turbulência é justamente a incerteza quanto ao andamento da resolução dos problemas que são importantes. Teremos alguma reforma, ela será água com açúcar? Ninguém sabe.”

Ele diz que a crise política acabou entrando na frente das crises econômica e sanitária e isso impede o andamento das outras agendas. “Se o presidente tivesse maior popularidade, as reformas econômicas andariam melhor. Mas agora a energia do ente político está direcionada para a própria sobrevivência.”

Klein acha difícil a Bolsa se recuperar enquanto as tensões políticas provocadas por Bolsonaro continuarem presentes. Para ele, uma melhora substancial dependeria de um esforço coordenado dos demais Poderes para acomodar e neutralizar essas tensões. “Eles precisariam tirar esse problema da frente e voltar a ter um debate propositivo, no sentido das reformas”, conclui.

O que pode fazer a situação piorar ainda mais? O discurso de Bolsonaro conseguiu inflamar a categoria dos caminhoneiros, e alguns grupos fizeram paralisações em estradas. E desta vez a pauta vai além da alta no preço dos combustíveis: influenciados pelo presidente, agora eles resolveram pedir a cabeça dos ministros do STF.

“Quando era apenas o diesel não era bom, mas era mais simples, porque só atingia a Petrobras e esbarrava de raspão no risco país. Com a pauta do STF, a coisa se torna mais preocupante, pois fica muito mais difícil estancar o movimento”, afirma Miraglia. “Esse risco impactou muito o mercado, que agora [na quarta-feira] entrou em uma onda de ‘zerar’ o Brasil.”

Ele diz que será preciso acompanhar de perto esse movimento, que começou na região Sul e já atinge dez Estados, para ver o quanto a mobilização irá se espalhar. “Já vimos que as consequências de uma paralisação dessas podem ser muito sérias.”