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Vinte anos após a ocupação, fábrica gerida pelos próprios trabalhadores ainda luta por seus direitos

"Nossa pauta sempre foi a defesa dos empregos e dos direitos", aponta Pedro Santinho, Coordenador do Conselho de Fábrica da Flaskô


28/03/2023 08h19

Você já imaginou uma fábrica sem patrões? É assim que opera - ou, ao menos, operava - a Flaskô, produtora de reservatórios e tonéis plásticos gerida pelos próprios trabalhadores.

Início

No dia 12 de junho de 2003, operários da empresa sediada em Sumaré (SP) decidiram tomar a fábrica e passar a administrá-la, uma vez que os grupos Cipla Interfibra e Holding Brasil (HB), seus antigos proprietários, entraram em falência.

Em entrevista exclusiva ao site da TV Cultura, Pedro Santinho, Coordenador do Conselho de Fábrica da Flaskô, afirma que a primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gerou nos funcionários uma “empolgação de ter os seus direitos atendidos”. “Empolgados, iniciou-se uma luta com a ocupação da fábrica para defender os empregos e os direitos”, completa o advogado.


Administração

No início da ocupação, questões como organização e remuneração eram um desafio. Por se tratar de uma “experiência nova”, o tema é debatido “permanentemente”, explica Santinho.

Inicialmente, eram realizadas assembleias diárias. Depois, passaram a ser reuniões semanais, até que foram consolidadas as assembleias mensais. “Só assembleias elegiam conselhos e comissões de fábrica, que faziam a gestão”, conta o coordenador.

“Nos primeiros meses, nós adequamos o salário para trabalhos iguais entre homens e mulheres - que eram menores para as mulheres. Colocamos um teto salarial equivalente ao operário mais qualificado da fábrica e organizamos esse processo todo”, reforça o advogado.


Desafios

Atualmente, a Flaskô não está produzindo. Isso se deve a um corte de energia, imposto pelas dívidas milionárias acumuladas pelos antigos donos da fábrica, que nunca foram quitadas. Diante da situação, Santinho diz o que os trabalhadores mais visam no momento: “O objetivo imediato é a nossa própria sobrevivência, a manutenção da fábrica e tentar tratar essa possibilidade da retomada da produção, tendo em vista que agora temos um governo diferenciado, o governo de um operário.”

“Os desafios nesse período todo sempre foram ligados à própria manutenção da sobrevivência da fábrica. Nossa pauta sempre foi a defesa dos empregos e dos direitos, com a compreensão que a única saída diante da situação real da fábrica, que havia deixado milhões em dívidas, era a estatização da fábrica pelo governo”, alega.


Governo Bolsonaro

Até 2019, a fábrica conseguiu se sustentar. No entanto, o primeiro ano do mandato de Jair Messias Bolsonaro (PL) frente à Presidência da República trouxe o que, até hoje, atravanca a produtividade da Flaskô.

“A gente conseguiu manter a produção até o início do Governo Bolsonaro, quando uma das ameaças mais constantes que havia, que era o corte de energia, ocorreu”, ressalta Santinho. O advogado também entende que um dos objetivos por trás da decisão pode ter sido o de “acabar com essa experiência de resistência contra o desemprego e o fechamento das fábricas no país".

O coordenador conclui que a experiência dos trabalhadores com o último mandatário foi “das piores”: “A gente havia sobrevivido há 17 anos na época e, sem mais nem menos, eles cortaram nossa luz por dívidas antigas dos patrões e acabaram completamente com a interlocução. Então, o que era pelo menos uma interlocução com o governo, com vista em manter os empregos, se tornou, na verdade, um ataque.”


Mobilização

Embora reconheça que a mobilização dos próprios trabalhadores seja fundamental no combate ao desemprego e à precarização no país, Santinho fala que não há uma “receita”. Ele também alega que um ponto fundamental para a reivindicação de direitos é a organização.

“A questão da mobilização das pessoas é uma questão bastante importante. É muito difícil passar uma receita. Grande parte da mobilização se dá em defesa dos seus próprios interesses e, com o processo de consciência e de educação permanente, todo mundo pode participar, principalmente com as organizações. Os sindicatos - por mais que muitos entendam que eles não têm um papel hoje a cumprir - estão ali para defender esses interesses, mesmo quando aqueles que estão apresentados no momento não cumprem com isso. É papel dos trabalhadores fazer dessa ferramenta uma ferramenta que seja eficiente”, frisa.

Outro ponto fundamental, segundo Santinho, é a defesa da indústria: “É a defesa central da classe trabalhadora, porque sem a gente defender os empregos industriais - que são aqueles que fazem a produção nacional, que empregam com melhores salários, que permitem saber organização e a luta dos próprios trabalhadores em sindicatos e associações - fica muito difícil (...) essa pauta é atual, é uma pauta que a gente pretende levantar para discutir com todo mundo."

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