Fundação Padre Anchieta

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Todo mundo é ou já foi criança. Ninguém nasce adulto (a não ser o Benjamin Button, personagem fictício do cinema, interpretado pelo Brad Pitt, que nasce idoso e vai ficando jovem com o passar dos anos). Portanto, podemos afirmar que as crianças testemunharam a história da humanidade. Mas você já parou pra pensar o que era ser criança antigamente? Como era a infância antes do celular? Antes da luz elétrica? Ou antes mesmo da roda? Então, prepare-se para uma viagem no tempo: vamos visitar a molecada que brincou neste planeta antes da geração alpha.

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Nossa primeira parada é na pré-história. Durante muito tempo, chamamos esse período como "o mundo dos homens das cavernas”. Afinal, dentro da nossa cultura patriarcal, era natural que os homens fossem os protagonistas. Até pouco tempo, a maior parte dos fósseis encontrados eram do sexo masculino e supunhamos que eram heróis, valentes e corajosos, caçadores de grandes animais. Enquanto isso, as mulheres ficavam como coadjuvantes, supostamente isoladas dentro das cavernas com suas crianças.

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Mas um dia, encontraram dois esqueletos de mulheres, a Lucy e Luzia, e a partir daí o papel feminino na pré-história passou a ser estudado. E as descobertas foram incríveis: os fósseis femininos contaram que eram elas que auxiliavam no corte das carnes e no deslocamento dos grandes animais abatidos, além de coletarem folhagens, frutos e raízes comestíveis, garantindo o sustento de todo o grupo. E, surpresa: faziam tudo isso com a ajuda das crianças!

Quando pensamos em cavernas, lembramos também daquelas pinturas que atravessaram o tempo e hoje ainda estão colorindo muitas paredes pelo mundo. Esses desenhos eram feitos, na maioria das vezes, por mulheres e crianças, que desenvolveram suas habilidades artísticas enquanto estavam nas cavernas. Passavam o tempo desenhando rituais e feitiços para ajudar os homens na caça, fazendo personagens de histórias e fazendo desenhos despretensiosos em dias de chuva.

Através do tamanho das mãos e da força empregada nos sulcos, foi possível até detectar a idade dos pequenos artistas. Por exemplo, na Caverna dos Cem Mamutes, em Rouffignac, na França, existem desenhos de animais feitos por crianças de 3 a 7 anos que viveram há 13 mil anos.

Caverna dos Cem Mamutes

Avançando no tempo, chegamos na antiguidade clássica, onde a educação variava de acordo com a classe social e o sexo. Até o ano de 318, o infanticídio não era crime, e crianças "não desejadas” por qualquer motivo - por serem deficientes ou do sexo não esperado, por exemplo - viravam escravas ou eram mortas. O estado decidia.

A criança que tivesse a sorte de passar por essa peneira já enfrentava uma nova provação assim que completasse seis anos, pois os meninos eram retirados das suas famílias e iam para uma espécie de escola militar do governo. Como a alfabetização não era uma opção, ficavam aprendendo os treinamentos básicos militares, algumas noções de sobrevivência, aprendiam a manusear armas e até a dirigir uma biga (um tipo de carroça de combate movida por cavalos). A partir dos 16, já eram considerados adultos e passavam a fazer parte do exército que defendia o Estado.

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Já as meninas eram separadas da família no começo da adolescência e ficavam morando com outras mulheres até o casamento. Não podiam ter contado com o sexo oposto, eram submissas e viviam sempre sob a tutela de um homem: o pai, um irmão, o marido e até do filho, caso ficassem viúvas.

Avançando no tempo, chegamos aos Celtas - um povo que trabalhava com agricultura e que habitou uma parte da Europa até o ano 500 DC. Crianças deficientes ou amaldiçoadas também eram abandonadas nas florestas e a infância era muito curta, pois os casamentos aconteciam a partir dos 12 anos de idade. Parece que ser criança na Europa antiga não era nada fácil. Porém, durante esse curto período de infância, as crianças celtas podiam brincar bastante e havia muito material para exercitar a imaginação. Como eram de uma cultura que respeitava a natureza, cresciam com liberdade e aprendiam sobre as estações, as plantas, os animais e tudo ao redor.

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A educação era por meio da oralidade e era comum passarem longas horas em volta das fogueiras, ouvindo histórias contadas pelas mulheres da comunidade e os sacerdotes.

Na mesma época, os Vikings, povo que habitava a Escandinávia, tinham uma noção de família bem desenvolvida. As crianças eram livres antes da idade adulta e, durante o curto verão da região, as brincadeiras aconteciam no coletivo, como jogar bola de couro, jogos de tabuleiro ou brincar de bonecas de madeira e pano. Durante o inverno, se divertiam deslizando nos lagos gelados com patins feitos de lâminas de ossos. Treinamento de guerra, só nas brincadeiras, usando escudos de madeira e espadas de gravetos, sem a responsabilidade de se tornarem guerreiros ainda pequenos e nem pressões do Estado.

Vic, o viking

Na Idade Média, a infância ficou minúscula: durava o tempo da amamentação. Assim que a criança ficasse um pouco maior, já era vestida como um “miniadulto em treinamento”. Meninos e meninas recebiam deveres iguais aos adultos e a ingenuidade e imaturidade eram tratadas como defeitos a serem abolidos logo. Por não haver distinções entre as idades, tinham que aprender as tarefas do dia a dia, trabalhar e ajudar os mais velhos nos serviços. Era comum, entre as classes mais desfavorecidas, que as crianças fossem distribuídas como serventes aos mais ricos e, quando isso acontecia, a passagem pela família era tão breve que as crianças nem criavam muitos vínculos de afeto com o pai e a mãe.

Idade Média

Enquanto isso, no mesmo período, as crianças indígenas na América, aproveitavam uma estrutura social de muito respeito. Todas eram criadas pelo coletivo e seu bem estar era de responsabilidade da comunidade. Tinham o direito de brincar livres na natureza, enquanto aprendiam os afazeres, como pescar, cozinhar e confeccionar produtos. Muitas vezes, misturavam diversão com responsabilidade. Os rituais de passagem da infância para adolescência eram marcados de acordo com cada cultura, mas sempre respeitando a maturidade física individual.

Indígenas

A partir do renascimento, no século XVIII, as crianças europeias finalmente voltaram a ser reconhecidas e respeitadas, ao mesmo tempo que passaram a ter um espaço maior no seu meio social. Nascia na sociedade moderna a concepção de infância. E essa grande evolução tem um nome: escola. Desde então, a criança foi saindo de sua posição de invisível e se tornou parte fundamental na família. Hoje, ela tem um estilo de roupa que respeita seu corpo, ganhou seu espaço, a atenção dos familiares, se senta à mesa, tem comida própria, saúde, brinquedos e reina feliz, protegida por todos e estudando. Com todos esses cuidados, ela pode escolher seu caminho como adulta.

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Mas é claro que na prática, muitas e muitas crianças vivem hoje como se estivessem em alguma sociedade do passado, vivenciando os horrores das problemáticas que o mundo já deveria ter superado. Algo que parece tão longe, num tempo tão distante, pode estar acontecendo na rua de trás da sua casa. Será que um dia, todas as crianças do mundo terão seus direitos básicos respeitados pelos adultos? Se hoje você é criança, um dia será adulto. E, se é adulto agora, um dia foi criança. Portanto, esTe texto faz parte da sua história. Um pedacinho do seu passado está aqui. E o futuro, que seja leve como a infância deve ser! Faça sua parte!

Helena Ritto é atriz, contadora de histórias, arteeducadora, apresentadora, atriz de voz e escritora.