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Não existe homenagem mais correta do que ouvir com atenção a obra de um grande músico. Isso vale tanto para Bach, Beethoven, Mozart e quanto para Duke Ellington, Pixinguinha, Quincy Jones e Bobby McFerrin. Ele completa 75 anos nesta terça-feira, dia 11. Há mais de uma década permanece silencioso, devido ao mal de Parkinson. Mas sua obra permanece original, decisiva, perfeita para afastar qualquer tipo de preconceito.
Nascido em Nova York e criado em Los Angeles numa família musical, Bobby tem música nas veias, como diria o saudoso Zuza, e sua ampla tessitura vocal de quatro oitavas lhe permitiu construir uma obra sem paralelo no mundo da música. Seus parceiros tanto foram grandes músicos populares quanto estrelas clássicas como o violoncelista Yo-Yo Ma, com quem gravou “Hush” em 1996.
O CD desta semana na Cultura FM é outro exemplo notável de como dois artistas plenos exercem seu ofício com inteira liberdade - e ousadia. No caso de “The Mozart Sessions”, de 1996, McFerrin convocou seu grande amigo e parceiro Chick Corea e a Saint-Paul Chamber Orchestra.
No repertório, dois concertos para piano muito conhecidos de Mozart: o no. 20 e o no. 23. Só que as liberdades que eles se outorgam em relação às partituras mozartianas podem chocar. Já na primeira faixa, o “Allegro” inicial do concerto no. 23, em lá maior, catálogo Koechel 488, você toma um susto: eles acrescentaram a palavra “Prelúdio” – e Allegro. É que a música começa com a voz inconfundível de McFerrin improvisando sobre o tema do Allegro acappella, ou seja, sem acompanhamento, até que aos 50 segundos entra o piano solo de Chick Corea improvisando, até que pouco antes dos 2 minutos eles rumam para a partitura de Mozart e a orquestra começa a participar.
Descrevi este movimento para vocês terem uma ideia das “liberdades” deliciosas que eles tomam com Mozart. Muito adequadas, aliás, se pensarmos que o próprio Wolfgang cansou de estrear concertos para piano em que só havia terminado as partes da orquestra – as suas, do piano solista, ele improvisava. Outro detalhe que todo músico dos séculos 18 e 19 praticava: as cadências eram improvisadas. Hoje em diga, os maiores pianistas tocam cadências escritas há cem, 150 anos. Não enfrentam o desafio de improvisar.
Exemplos desse tipo se multiplicam por este álbum fabuloso, com direito a prelúdios improvisados no primeiro movimento de cada um deles. E fechando com uma “canção para Amadeus”. As cadências são, claro, improvisadas por Chick Corea. Como Mozart e todo músico de seu tempo faziam.
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