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Foto: Reprodução
Foto: Reprodução Kaleidoscope Chamber Collective

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Uma das mais candentes questões musicais do século 19 foi a da verdadeira guerra que travaram os compositores que defendiam o primado da música absoluta e a chamada música de programa. Exemplo máximo e guru da música absoluta é, por exemplo, Beethoven. Do outro lado, o campeão é sem dúvida Franz Liszt, que adorava compor estimulado por um quadro.

O CD desta semana põe, lado a lado, figuras que à primeira vista encarnam cada canto deste ringue estético. De um lado, Brahms, campeão da música absoluta; do outro, a hoje desconhecida Louise Héritte Viardot (1841-1918), que só é citada por causa de seu sobrenome: era a filha mais velha da lendária soprano Pauline Viardot. Pauline, aliás, foi a solista na estreia da “Rapsódia para contralto” de Brahms.

Kaleidoscope, ótimo grupo de músicos radicados em Londres, interpreta dois quartetos de piano e cordas: o famoso terceiro quarteto de Brahms, em dó menor, seu opus 60; e o quarteto no. 1, opus 9 de Héritte-Viardot, que leva o subtítulo “No Verão”.

O que parece separá-las na verdade as une: ambas as obras têm motivação extramusical. Louise era cantora, mas adoeceu e com a ajuda de Clara Schumann atuou como professora de canto no Conservatório Hoch de Frankfurt. Compôs cerca de 300 obras.

Um detalhe normalmente ignorado é que o quarteto famoso de Brahms, no qual ele começou a trabalhar em 1855 e só concluiu em 1874, tem sim motivação programática. Na carta que enviou a seu editor Simrock, Brahms escreve que a capa da partitura deveria ter uma imagem, uma cabeça, com uma pistola apontada para ela. O compositor escreveu: “Agora você já pode ter uma ideia da música! Por isso, vou te enviar minha fotografia!” No excelente texto do encarte, o musicólogo Nicholas Marston escreve que Brahms aqui remete ao livro “Os sofrimentos do jovem Werther”, que Goethe publicou em 1774, no qual o amor de Werther por Charlotte, não correspondido, levou-o ao suicídio. A Charlotte de Brahms era Clara: ele começou a compor seu quarteto pelo movimento lento, o terceiro, em 1855, ano em que Robert já estava internado no sanatório de Endenich, onde morreu em julho de 1856. Poucos meses depois, em outubro, conta Marston, Clara anotou em seu diário que Brahms “compôs um adagio maravilhoso para o seu quarteto” que qualificou de “profundo!”. Este adagio foi substituído já em 1873 por um Andante que, no entanto, permanece “profundo”.

Ou seja, Brahms, o campeão da música absoluta, fazia música de programa. E das mais emocionalmente intensas, a ponto de sugerir uma capa com uma figura baseada em sua aparência com uma pistola apontada para sua cabeça! A estreia em 18 de novembro de 1875 também foi esteticamente ecumênica: na plateia estava o casal Wagner (Richard e Cosima), campeões da “obra de arte total” e da “música do futuro”.

Já o quarteto opus 9 de Héritte-Viardot dá uma boa ideia do alto nível de domínio da criação musical durante o século 19. Ela só foi professora de conservatório, não se estabeleceu firmemente como compositora. E escreveu 300 obras. Daí o espanto que provoca a audição deste quarteto.

Ele também tem quatro andamentos e, como o opus 60 de Brahms, coloca o andamento lento após o scherzo, em vez da ordem mais convencional, em que o andamento lento é o segundo. Eles explicam sua motivação claramente nos títulos: "Manhã na Floresta", "Moscas e Borboletas", "Mormaço" e "Noite sob o Carvalho".