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Essa é uma história comportada: uma conversa íntima entre pai e filho, ou melhor, um monólogo do pai que monopoliza a cena para desfiar conselhos ao filho que acaba de completar a maioridade. O assunto tratado é esse: como o jovem deve fazer para melhor vestir seu disfarce e, assim, ganhar o respeito da sociedade sem absolutamente carregar nada de substância em seu íntimo? Eis a moral às avessas ventilada por Machado. Tamanho ímpeto sarcástico não viria sem uma revolução formal. Machado de Assis em romances como Memórias Póstumas de Brás Cubas e Dom Casmurro é o que poderíamos chamar de um verdadeiro transgressor da forma usual da escrita de ficção. Inspirado pelos grandes satiristas ingleses, Machado embaralha propositalmente os tempos e cenários de suas histórias para ter um papo franco com o leitor. É como se o escritor trouxesse à tona a própria materialidade da página de papel, lembrando de que o seu interlocutor é parte integrante de um problema em curso, e não meramente um espectador de um território acabado. Sossego não é uma palavra que acompanha a leitura de uma narrativa machadiana. Há muitos buracos e solavancos no meio do caminho. E se Machado houvesse esperado o surgimento do rádio, provavelmente iria revirá-lo de ponta-cabeça na urgência de soprar ao ouvinte alguma coisa que o fizesse sair de sua rotina ordinária.
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