“A meu ver, o esporte eletrônico é uma indústria de entretenimento, não é esporte”. A fala é da ex-jogadora de vôlei e nova ministra do Esporte, Ana Moser. Em entrevista ao UOL, ela afirmou que não pretende investir no segmento dos esportes eletrônicos, chamado de eSports. A declaração da ministra gerou revolta no universo do esporte eletrônico.
Após a fala, gamers e outras personalidades da área usaram as redes sociais para criticar o posicionamento da ministra. "A parte boa disso é que a gente nunca precisou nem vai precisar dessa galera para dizer se é ou não esporte", afirmou Gaules, uma das principais vozes dos eSports no país. O ex-jogador de Free Fire e CEO do Fluxo, Bruno “Nobru” Goes, também enfatizou a falta de conhecimento da ministra sobre o ecossistema dos jogos competitivos.
O site da TV Cultura conversou com Pedro Oliveira, CEO e co-fundador da OutField, empresa de inteligência, estratégia e investimentos no esporte, games e entretenimento, que avaliou o posicionamento de Ana Moser e a reação como uma “discussão superada” e “desnecessária”.
“A fala da ministra gerou uma pequena frustração porque para grande parte desse mercado de eSports, eu incluso, é uma construção superada, se é esporte ou não é esporte. Trazer isso de volta à tona traz também um desgaste até desnecessário, porque é um mercado que não conta com o governo”.
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Por isso, ao avaliar o impacto da fala de Ana Moser, Pedro entende que é mínimo nesse mercado. Ele explica que os esportes eletrônicos, como a ministra mesmo diz, têm uma dinâmica diferente do esporte tradicional.
“Existe a figura do dono do jogo que é o dono da propriedade intelectual e que, por consequência, é responsável por regular tudo que acontece dentro dele. Diferente dos esportes tradicionais que são de domínio público. O futebol não tem um dono, por exemplo, então é como ela mesma dissemina que acaba sendo diferente desde do princípio”, exemplifica o consultor de gestão esportiva.
O mercado dos eSports tem crescido e evoluído durante os últimos 30 anos por conta da internet e da mobilidade de poder jogar em de qualquer lugar, com qualquer pessoa, independente da localização geográfica. Ao mesmo tempo, foi um segmento construído de forma que hoje é capaz de se autorregular. O negócio se retroalimenta com os donos dos jogos que os promovem, o que cria competição, fãs e torcida, esses que se tornam jogadores e também compram o jogo.
“O mercado já é sustentável financeiramente falando, independentemente de participação governamental”, diz Pedro Oliveira, que reconhece que o segmento “nasceu à revelia aí das entidades públicas”.
Esporte ou entretenimento?
Uma semana após dizer que disse que não pretende investir em esportes eletrônicos, Ana Moser usou as redes sociais para responder algumas críticas. A ministra reforçou sua posição pela ação interministeriais, podendo incluir, por exemplo, o Ministério da Cultura.
Pedro considera a abordagem válida, projetando que o Ministério da Cultura poderia olhar para o mercado de games de outra forma e consiga trazer diferentes medidas que o afetem positivamente, da mesma forma que o Ministério da Fazenda poderia construir algum tipo de tributação que se aplique melhor à realidade deste segmento.
“Um dos únicos pontos da fala da Ministra do Esporte que eu concordo é ela comparar com o mercado do entretenimento porque a gente vive no mundo hoje em que tudo é entretenimento”, diz o consultor de gestão esportiva.
Pedro argumenta que o esporte no geral entrou em uma “embalagem de entretenimento”, e cita como exemplos o mercado americano e a NBA, principal liga de basquete profissional da América do Norte, e o mercado europeu com o futebol. Para ele, no fim, todos disputam a atenção do consumidor, seja para jogar, se divertir ou competir.
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“A finalidade do esporte, seja ele tradicional ou eletrônico, é social”, defende Pedro Oliveira, “Eu entendo a fala da Ana Moser e concordo no sentido de ‘eu não quero me preocupar com eSport, eu já tenho problemas o suficiente no outro lado’ e de fato ela tem, então essa abordagem multifacetada pode ajudá-la nesse sentido”.
Política e jogos eletrônicos
Segundo o consultor de gestão esportiva, os eSports buscam impacto social, e vê a relação desse mercado com o Ministério do Esporte no futuro com um ponto de interrogação: “Havia uma aproximação do mercado com o governo para que houvesse mais projetos sociais para impactar comunidades carentes e de oportunidade para pessoas desenvolvendo em novas carreiras. Então o principal dano está nisso de não saber como será essa aproximação, de trabalhar projetos em paralelo”.
“Pelo lado do mercado todo mundo continua aberto pra conversar pra pensar e trabalhar, mas pelo lado do governo aparentemente não”, diz o CEO e co-fundador da OutField, empresa de inteligência, estratégia e investimentos no esporte, games e entretenimento.
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