Minuto Cultura

As polêmicas em torno de 'Pelo Telephone', apontado como "primeiro samba" do Brasil

No "Dia Nacional do Samba", o site da Cultura mergulhou na história da obra registrada por Donga em 1916


03/12/2021 14h23

Quando se fala em gêneros musicais brasileiros, geralmente, o samba é o primeiro que vem à mente. Diante da importância desse ritmo, é possível entender o porquê dele ter um dia próprio. Nesta quinta-feira, dia 2 de dezembro, é considerado, não oficialmente, o “Dia Nacional do Samba” e o site da Cultura relembra a história daquela que é apontada como a primeira gravação de um samba no Brasil.

Em 6 de novembro de 1916, Ernesto dos Santos, assíduo frequentador de rodas de samba do Rio de Janeiro, mais conhecido como “Donga”, solicitou o registro da canção ‘Pelo Telephone’, ainda com o “ph” no lugar do “f”, de acordo com a grafia da época, no Departamento de Direitos Autorais da Biblioteca Nacional do RJ.

A letra, um tanto quanto sem sentido para quem lê hoje em dia, tinha como melodia uma partitura manuscrita de piano feita por nada menos que Pixinguinha, um dos maiores músicos e instrumentistas do Brasil. Posteriormente à gravação da canção na ‘Casa Edison’, primeira gravadora da América do Sul, a música fez um relativo sucesso para os padrões da época e deu origem a inúmeras paródias e jingles comerciais.

De acordo com a Biblioteca Nacional, dez dias depois da solicitação de registro, Donga anexou ao pedido um atestado afirmando que o “samba carnavalesco” havia sido tocado pela primeira vez em 25 de outubro de 1916, no Cine-Teatro Velho. A instituição efetuou o registro da obra em 27 de novembro de 1916.


As polêmicas ao redor de ‘Pelo Telephone’

O samba ‘Pelo Telefone’ é envolto de muitas polêmicas e incertezas, uma delas é que alguns pesquisadores nem classificam a música como um samba. De acordo com alguns especialistas a melodia é mais um “maxixe”, ritmo criado pela população negra no Rio de Janeiro e muito popular no século XIX.

O professor de etnomusicologia Alberto Ikeda explica que a grande quantidade de sambas diferentes dificulta um enquadramento definitivo da música em um gênero específico. “Falar de samba no singular no Brasil é um grande equívoco. Devemos falar em sambas. Mesmo no Rio de Janeiro existem vários tipos de samba. Aquele samba parecido com ‘Pelo Telephone’, lá de 1916, continua sendo feito até hoje. Não existe essa história de que ‘começou assim, e agora ele é assim’”, expõe.

Outra polêmica se refere à composição da canção. Naquela época era comum que as classes mais populares se reunissem na casa de mães de santo para rituais religiosos e socialização entre os membros das comunidades. Essas mulheres eram figuras de alta hierarquia do candomblé. Pesquisadores apontam que a música teria sido elaborada em uma roda de samba numa das festas na casa da Tia Ciata, uma das mães de santo mais conhecidas do RJ.

Veja Imagens: Webstory: O primeiro samba do Brasil

De acordo com Herom Vargas, professor da Universidade Metodista com linha de pesquisa em processos e práticas culturais, a música foi construída de forma coletiva nas festas, quase que de improviso, o que explica os trechos quase desconexos da letra.

“Ela foi feita na festa, pessoal bebendo, cada um falava uma coisa no improviso. Ela seria esquecida no dia seguinte, essas músicas não eram para serem escritas. Só que, de repente ela começa a ser cantada pela vizinhança no Rio de Janeiro, aí o Donga e o Mauro de Almeida, jornalista, vão lá, escrevem a letra e colocam no nome deles. Isso gera um problema com os amigos, todo mundo vai brigar com o Donga, mas também, curiosamente, ao virar partitura, essa música ganha um outro acesso”, comenta.

O registro e a gravação fizeram com que a obra, essencialmente popular, chegasse a outros lugares e a diferentes classes sociais. “Foi talvez a primeira música que veio de uma origem marginal, negros, analfabetos e gente da periferia que virou disco, partitura e que fez um sucesso muito grande na cidade. Um fenômeno midiático para a época”, diz Vargas.


Dia Nacional do Samba

Ao contrário do que pensam algumas pessoas, o “Dia Nacional do Samba” não é algo institucionalizado oficialmente, nem pelo Brasil nem por estados. Segundo Alberto Ikeda, a data ficou associada ao gênero musical devido ao primeiro ‘Congresso Nacional do Samba’, que aconteceu entre 28 de novembro e 2 de dezembro de 1962.

Neste congresso, foi escrito e aprovado, no último dia, um documento chamado ‘Carta do Samba’. O material visava, dentre outros aspectos, definir o que era o samba. Dois anos depois do evento, um projeto na Câmara do Rio de Janeiro tentou tornar o dia 2 de dezembro uma data oficial em homenagem ao samba. A proposta não foi bem sucedida mas o dia ficou marcado pela relação com o gênero musical.

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