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Crédito: Anderson Marinho
Crédito: Anderson Marinho

Conforme os países passaram a defender e adotar o isolamento social como medida de combate ao novo coronavírus, muitas profissões tornaram-se ainda mais que fundamentais no momento em que o mundo precisa parar e ficar em casa. Por estar na linha de frente da batalha contra a pandemia, o motoboy Anderson Marinho, de 36 anos, resolveu escrever um diário por meio de posts no Instagram, chamado “um motoboy no front de uma guerra biológica”, relatando a sua rotina de trabalho e o que tem visto nas ruas de São Paulo durante a quarentena.

Marinho é formado em jornalismo e trabalha seis dias por semana com entregas por aplicativo. Essa é a segunda vez que exerce a função e, para isso, ele tem enfrentado mudanças na sua rotina, principalmente com relação à higiene. “Eu tenho todo o cuidado que está ao meu alcance. Ao chegar em casa, eu uso uma solução com água sanitária, que eu borrifo na moto, na bag, que é a mochila em que eu carrego os lanches, no capacete, na roupa, em tudo e vou direto para o banho. Além da utilização do álcool em gel, que é constante, que eu utilizo antes e depois das entregas, chegando nos restaurantes e saindo dos restaurantes”, diz.

Por trabalhar em dois horários diferentes, no almoço e na janta, o motoboy dedica cerca de uma hora e meia do seu dia para higienizar suas roupas e equipamentos, sendo que, a cada nova chegada e saída de casa, ele repete o mesmo processo. Ainda que tenha passado por mudanças no que diz respeito à questão sanitária, Marinho afirma que tem enfrentado as mesmas restrições de antes da epidemia para acessar determinados locais e as mesmas taxas de valor em cima das entregas, mesmo que o risco para o profissional agora seja maior. O fluxo de trabalho também continua o mesmo, mas Marinho tem visto uma concorrência cada vez mais acirrada, já que, desde que começou a quarentena, o número de entregadores por aplicativos aumentou.

Apesar de trabalhar como motoboy, o seu lado jornalístico não foi deixado de lado durante o isolamento e, após começar a morar em uma casa em que vivia outro jornalista, a ideia de produzir um diário foi aprimorada.

“Há algum tempo trabalhando na rua, eu já pensava em escrever sobre a minha rotina de trabalho. Sempre gostei de escrever e já era uma ideia que já vinha sendo ensaiada, eu só não sabia como iniciar. Pensei em falar sobre alimentação e o desequilíbrio da alimentação e falar sobre a falta de visibilidade das profissões, como a de motoboy, por exemplo. [...] Quando eu falei para ele desse meu desejo de escrever sobre as tantas coisas que eu vejo por aí, ele me falou ‘acho que agora é um bom momento para você escrever um diário sobre a sua rotina de trabalho, sobre como que está sendo’. Ele me ajudou com algumas ideias, eu fui formulando essas ideias e o diário saiu”, explica.

Na primeira postagem, Marinho ainda não tinha um formato de texto definido, mas, ao longo do tempo, a ideia foi se desenvolvendo e as possibilidades foram surgindo. “O diário tem bastante subjetividade. Eu falo de coisas objetivas, de números, das coisas que estão acontecendo; mas eu procuro captar o que as pessoas estão sentindo, o que eu percebo nos diálogos, as mudanças de comportamento e os medos.”

Um momento marcante foi quando o jornalista encontrou José, um carroceiro idoso, pegando materiais reciclados na rua sem proteção e sem qualquer informação com relação à pandemia. “Ali eu senti o peso da impotência, procurei falar para ele da alimentação, tomar chá de noite... e ele despreocupado. Quando eu perguntei para ele se ele tinha medo do coronavírus, ele falou que só tinha medo de Deus. Essa sensação de impotência me marcou bastante, ali eu senti que a gente não tem muito o que fazer, tem que se cuidar da maneira que pode”, lamenta.

Boa alimentação e higiene são algumas das recomendações que Marinho tenta passar não só para pessoas em situação de vulnerabilidade, mas para qualquer um com quem ele consiga conversar durante as suas entregas. Na periferia ou em bairros nobres, o motoboy ainda vê movimento nas ruas, em muitos casos, por falta de informação, mas em outros, por negligência.

“Muita gente está duvidando, não tem noção, apesar de a mídia estar aí batendo o martelo, falando que é perigoso e tudo mais, as pessoas continuam desrespeitando. [...] Eu acho que esse é um ponto fundamental de a gente ver: uma coisa são as pessoas que não têm acesso à informação e que ignoram o perigo do vírus, outra coisa são as pessoas que sabem com o que nós estamos lidando e, ainda assim, desrespeitam.”

Trabalhando todos os dias nas ruas de São Paulo, o motoboy aproveita para mandar mensagens para os que estão em isolamento e realizando suas atividades de casa. Marinho agradece a colaboração dessas pessoas e pede para que elas continuem em suas residências ajudando no combate ao vírus. Já aos que não estão respeitando a quarentena, o motoboy pede que haja mais pensamento coletivo.

“Eu vejo que são pessoas as vezes que sentem que, por estarem em uma faixa de idade, julgam estarem mais protegidas. Que essas pessoas pensem nas pessoas que têm a saúde mais fragilizada e que podem ser atingidas pelo vírus. Que possam ter esse ato de solidariedade, porque cuidar de si agora é cuidar do outro”, finaliza.