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Reprodução/TV Cultura
Reprodução/TV Cultura

Este 8 de março, Dia Internacional da Mulher, celebrado em meio à pandemia do novo coronavírus, realça a importância das mulheres que estão na linha de frente no combate à doença. Entre duplas jornadas de trabalho, elas se dividem entre afazeres e cuidados domésticos e a rotina desgastante de hospitais lotados de pacientes infectados pelo vírus

Nesta data tão importante, o site da TV Cultura entrevistou três mulheres que enfrentam esses desafios, com o intuito de homenagear tantas outras.

Rute Rodrigues - Profissional da limpeza que trabalha na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital 9 de Julho, em São Paulo

“Sempre trabalhei com limpeza hospitalar. (...) Quando surgiu essa vaga meus filhos falaram para eu não aceitar, porque tinham medo que eu me infectasse pelo coronavírus. Também fiquei com medo, mas tive que aceitar porque tenho que trabalhar e buscar meu sustento. É um grande desafio, temos que ter muita atenção para não levarmos o vírus para dentro dos quartos dos pacientes, então nossos cuidados são redobrados ao entrar e ao sair.”

Rute é mãe de cinco filhos, mora com três deles e o marido. Desde que começou no novo emprego, há cinco meses, precisa lidar com o receio de transmitir o vírus para seus familiares, além de enfrentar a rotina tensa de uma UTI. “Às vezes, fico muito triste porque vejo a situação bem de perto, vejo o hospital lotado e os pacientes testando positivo para o vírus. Inclusive, tive colegas que foram infectadas. Quando entrei na UTI, pensei: 'meu Deus, não estou acreditando que estou aqui'. No meu primeiro dia de trabalho, passei mal de tão tensa que fiquei”.

Devido à grande exposição, Rute não encontra os amigos e os familiares, inclusive seus pais, que sofrem de diabetes e hipertensão e estão no grupo de risco da doença. 

No mês passado, ela tomou a segunda dose da vacina contra a Covid-19. “Antes de tomar a vacina, vi que muitas pessoas estavam se recusando a tomar. Senti medo de ter alguma reação, mas depois me senti muito aliviada! É importante lembrar que ainda precisamos continuar com todos os cuidados, até que todo mundo consiga se vacinar”, ressalta.

Para a profissional de limpeza, as mulheres têm grande importância no combate contra a Covid-19. "A maioria dos profissionais que trabalham comigo são mulheres, senão fosse por nós e pelo nosso trabalho de higienização, o que seriam dos médicos e dos enfermeiros? Porque eles não podem trabalhar na sujeira”. 

Para finalizar, Rute lembrou de situações de desacato durante o serviço: “nem sempre recebemos o reconhecimento que merecemos. A gente se esforça, a gente tem uma jornada de trabalho que não é leve e a gente se doa mesmo, mas não temos o reconhecimento que acho que deveríamos ter.”

Rute completou o ensino médio depois de adulta e atualmente voltou a estudar para fazer um curso técnico de enfermagem.




Andreia Queiroga - Fisioterapeuta respiratória, trabalha na UTI do Hospital Universitário Lauro Wanderley, em João Pessoa

“Desde o início da pandemia estou na linha de frente, precisei me isolar da minha família e no começo foi muito difícil. Os pacientes de Covid-19 são altamente instáveis, às vezes a gente está na UTI e vê que a saturação está bem, mas de repente, o paciente precisa ser entubado por conta de uma alteração drástica na hemodinâmica. Isso gera a exaustão do profissional da saúde, porque precisamos ter atenção contínua.”

“Perdemos uma paciente de 23 anos, que não tinha comorbidades, também atendi pacientes que eram atletas e que tiveram 95% do pulmão comprometido por causa da doença”, completa.

Andreia tem 17 anos de experiência na área hospitalar. Para ela, se afastar das pessoas que ama por questões de segurança foi muito difícil. “Nós, profissionais da saúde, não tivemos a opção de ficar em casa porque precisamos estar na linha de frente para cuidar das pessoas, sendo que a gente também tem vida, eu sou mãe e dona de casa, além de ser profissional.” 

”O maior desafio para mim foi manter a calma onde não há calma, além de precisar manter a integridade emocional em meio a um colapso. Ver famílias enlutadas e vidas desfeitas em questão de segundos é muito triste”, completa.

A filha de Andreia tem asma e ficou quatro meses na casa do pai. “Precisei me afastar dela por conta da minha profissão, mas acabou que ela pegou Covid-19 mesmo sem estar em contato comigo.”

Andreia conta também que a maioria de sua equipe é formada por mulheres. Para ela, “nós, mulheres, assumimos muitos papéis, como mãe, dona de casa e administradora. A gente tem esse caráter multifuncional e é por isso que temos uma carga emocional e física tão grande. (...) Falo que não tenho uma jornada de trabalho dupla, porque acho que ela é mais do que tripla.”

Recentemente, ela tomou a segunda dose da vacina CoronaVac contra o coronavírus e não apresentou nenhum tipo de reação ao imunizante. “Foi um momento de esperança. Se a gente não estiver bem como linha de frente, não iremos conseguir dar o nosso melhor para os pacientes.”

Adriana Freitas - Enfermeira do Pronto Socorro do Hospital Beneficiência Portuguesa de São Paulo

“No começo foi bem complicado, era tudo muito incerto porque a Covid-19 até então não tinha tratamento. Fomos trabalhar nos primeiros dias de pandemia e não tínhamos pacientes, porque as pessoas tinham medo de ir para o hospital. Depois, os casos graves começaram a aparecer. Recebemos pacientes com a saturação muito baixa e que precisaram ir direto para a intubação.”

Adriana trabalha há 14 anos no Pronto Socorro do hospital e contou que desde julho o trabalho está muito exaustivo tanto fisicamente, como psicologicamente, por conta do agravamento da pandemia. “As equipes estão reduzidas, sempre tem alguém que foi infectado, ou que está afastado por conta do psicológico afetado.”

“No começo, meu emocional ficou bem abalado porque tudo foi muito diferente, ver de perto o que estava acontecendo me abalou demais porque muitas pessoas não acreditam na doença. Ver jovens em estado grave é muito triste, pareciam cenas de filme de terror”, conclui.

A enfermeira conta que a equipe sentiu o forte efeito  do Natal e do ano novo, período em que muitas pessoas se reuniram. “Recebemos até oito pessoas da mesma família que estavam contaminadas. Em todos esses anos que trabalho no hospital, nunca passamos o período de festas com muitos pacientes, mas nesse ano estava lotado.”

Adriana não é casada e não tem filhos. Atualmente divide sua rotina entre os plantões do Pronto Socorro e os cuidados hiper cautelosos com os pais idosos. No início da pandemia, passou quatro meses sem ver a mãe, e nove sem ver o pai. “Para nós, profissionais da saúde, a doença impactou muito porque não tínhamos coragem de ver as pessoas, a gente tem muito medo de passar o vírus e isso nos isolou demais.”

“Durante os 23 anos em que trabalho na área hospitalar, já vi muita gente morrer, mas nunca tinha passado por uma situação assim, de ter que lidar com uma doença que isola todo mundo, que deixa os pacientes em estado grave e que deprime toda a equipe”, completa.

Adriana também contou que perdeu alguns colegas de profissão, um deles com apenas 32 anos, devido à doença. Além disso, um de seus amigos ficou com uma sequela neurológica, após se recuperar do vírus.

A enfermeira faz parte da linha de frente do combate ao coronavírus em uma unidade de Pronto Socorro formada majoritariamente por profissionais mulheres. “Muitas das minhas colegas são chefes de família e com dupla jornada de trabalho. Além disso, os maridos de algumas delas perderam o emprego em meio à pandemia. Então, eles tiveram que cuidar dos filhos, enquanto elas iam trabalhar.”

No mês passado, Adriana tomou a segunda dose da vacina CoronaVac. “Foi um sopro de esperança. Acredito na medicina e acredito que essa vacina é uma vitória. Fiquei muito aliviada e vou ficar mais ainda quando meus pais forem imunizados.”