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Divulgação/SBRA
Divulgação/SBRA

Após idas e vindas, o Projeto de Lei (PL) 1184/2003 foi desengavetado pelo deputado Diego Garcia (PODE-PR) e está em tramitação na Câmara dos Deputados. De autoria do senador Lucio Alcantara (PSBD-CE), o documento se tornou motivo de preocupação entre profissionais da saúde, por tentar instituir novas normas para os processos de inseminação artificial e fertilização in vitro (FIV), colocando em xeque direitos até então garantidos.

Em suma, as alterações propostas seriam a proibição do congelamento de embriões, biópsia embrionária e da gestação de substituição (conhecida popularmente como barriga solidária). Além disso, doadores de óvulo e sêmen não poderiam mais ser protegidos pelo anonimato e um número limitado de óvulos poderiam ser inseminados e transferidos a fresco.

No segundo artigo do PL, define-se que a reprodução assistida poderá ser feita exclusivamente por indicação médica. Ao associar a possibilidade desse tratamento apenas aos casos comprovados de infertilidade, acaba excluindo também os direitos de casais homoafetivos.

Diante dessas mudanças, surgiu um movimento entre as diversas sociedades médicas para anular o projeto, porque “não é viável e realmente compromete o tratamento das pacientes em reprodução assistida, pois com número restrito de óvulos, a chance de gravidez é nula”, disse a ginecologista e especialista em reprodução humana, Dra. Adriana de Góes.

Em entrevista ao site da TV Cultura, ela esclareceu os impactos que o PL 1184/2003 pode causar e confirmou que, se aprovado, pode inviabilizar a reprodução assistida no Brasil, especialmente por conta da restrição da quantidade de óvulos.

Como funciona a reprodução assistida?

O texto restringe para dois o número de óvulos que podem ser utilizados no processo de fertilização. Essa quantidade, segundo Adriana, é insuficiente para uma transferência embrionária.

“Para se ter uma noção, quando eu importo óvulos, naturalmente de uma mulher fértil com ótimas chances de gravidez, eu recomendo a importação de oito a 12 óvulos e todos são fertilizados com foco de ter um embrião para transferir, e os excedentes são congelados”, iniciou a ginecologista.

“No processo de estímulo ovariano, uma paciente que tem uma resposta adequada, ela tem mais que cinco óvulos. Se essa pessoa for submetida ao tratamento e eu utilizar apenas dois óvulos para injetar espermatozóide, pode ser que ela não tenha nenhum embrião para ser transferido”, prosseguiu.

Adriana explica que a ideia da reprodução assistida é promover o aumento do número de óvulos, então é necessário ter vários para fertilizar um espermatozoide em cada óvulo e assim, formar um embrião. Em seguida, esse embrião fica em cultivo no laboratório até cinco dias para que os melhores ou o melhor seja transferido.

Ela afirma ainda que, além de impossibilitar o tratamento pelas questões técnicas que explicou, o projeto também impacta financeiramente a vida daqueles que optam pela reprodução assistida.

“Se eu restringir a um número de dois óvulos e os demais óvulos, se houver, eu congelar, essa paciente pode ter nenhum embrião para transferência. Além disso, ela tem um custo adicional de descongelar óvulos que corre o risco de perda. Quando eu congelo óvulos e descongelo, eu tenho um risco de sobrevida do descongelamento de 85 a 90%, mas de qualquer forma, 10% a 15% de perda pode ser muito significativo para uma paciente que já luta com a infertilidade”, argumentou.

Entendendo a dinâmica do óvulo

Para entender melhor como funciona o procedimento da reprodução assistida, a especialista associa o ovário a um cacho de uva, sendo que cada uva é um folículo, e a semente é o óvulo.

“No caso do ovário, nem toda uva tem semente, então eu preciso estimular o crescimento das uvas [folículos]. Depois que eu condicionar, vou ver quais uvas tem sementes. Após isso, cada óvulo vai ser fertilizado por um único espermatozoide. Só que, nem todo óvulo fertilizado, onde eu injeto espermatozoide, evolui para um embrião com divisão normal, e nem todo embrião que está ok no primeiro dia, após a injeção do espermatozoide, permanece estável no laboratório”.

Por isso a importância de ter uma grande quantidade de óvulos para ter sucesso no tratamento.

“Tem uma perda progressiva, um afunilamento do número de folículos em relação ao número de óvulos, em relação ao número de embriões formados e finalmente em relação ao número de embriões em dia 5, que é o embrião apto para o processo de fixação no útero, preferencialmente o que tem mais chance de gravidez. Então se eu restringir o número de óvulos, eu comprometo a possibilidade de transferência embrionária”, contou Adriana.

Tais propostas trazidas pelo PL 1184/2003 vão em desencontro aos números obtidos no 13º relatório do SisEmbrio, conduzido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em que consta um aumento da procura por estes tratamentos. De acordo com o documento, 100.360 embriões foram congelados em 2019 para serem usados em técnicas de reprodução assistida. No caso da fertilização in vitro, foram realizados 44.705 procedimentos, um acréscimo de 1.607 ciclos quando comparados a 2018.

Por enquanto, o texto que começou a ser discutido em 2003, foi devolvido ao relator no dia 16 de agosto deste ano, e, pela repercussão nas redes sociais, deverá ser acompanhado de perto por muitas pessoas que esperam fazer uso das técnicas no futuro e por especialistas que sabem do potencial do tratamento para trazer crianças ao mundo.

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