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O vírus da Covid-19 deixou sequelas em algumas pessoas que foram infectadas. Um sintoma apareceu de forma recorrente entre os primeiros casos da doença: a perda do olfato. De acordo com uma pesquisa publicada no Journal of Internal Medicine em janeiro deste ano, cerca de 86% dos pacientes que tiveram o coronavírus de forma leve apresentaram perda do sentido.

O levantamento mostrou que dos 2.581 pacientes de 18 hospitais da França, Bélgica e Itália, o sintoma apareceu em 85,9% dos casos. A pesquisa foi realizada entre 22 de março a 3 de junho de 2020.

No Brasil, os números não foram diferentes. Um estudo da Universidade de São Paulo (USP) realizado desde o início da pandemia, em 20 cidades brasileiras, mostrou que 3% dos contaminados ainda não recuperaram totalmente o olfato. A pesquisa foi divulgada em junho deste ano.

O estudo ainda apontou que após dois meses da doença, 44% dos pacientes recuperaram totalmente o sentido; 23% estão com hiposmia – baixa sensibilidade olfativa – leve; 15% com hiposmia moderada; e 13% com hiposmia severa. O olfato é um dos cinco sentidos dos seres humanos junto com a visão, a audição, o tato e o paladar. O sentido é responsável pela captação de cheiros e odores por meio do nariz.

Pensando na importância do olfato e nas sequelas da Covid-19, a pesquisadora Vanessa Castello, naturóloga especializada em neurociência, resolveu criar um tratamento gratuito para a recuperação do olfato em seu projeto de mestrado na USP.

Ao site da TV Cultura, Vanessa contou sobre o procedimento e a importância de devolver aos pacientes o sentido. O portal também conversou com Mirella Gualtieri, professora no Instituto de Psicologia da USP na área de psicologia sensorial e orientadora do projeto.

Vanessa estuda o olfato como prática clínica e como um facilitador do processo terapêutico antes da pandemia da Covid-19. A pesquisadora afirma que o sentido é uma forma de encontrar memórias e emoções dentro de um contexto clínico.

O projeto da naturóloga surgiu em fevereiro, antes da crise sanitária, a proposta era abranger mais quadros de disfunção do olfato, ou seja, diferentes doenças que fazem alteração no sentido. No entanto, com a chegada da pandemia, ela entendeu que seria importante delimitar para a questão da Covid. “Quando a gente restringiu, pensamos todo o caminho do que já tinha sido observado sobre a memória da digital olfativa e a abordagem da neurociência”, relembra.

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As pesquisadoras explicam que, diferente dos outros tratamentos em andamento, o tratamento desenvolvido por elas será individualizado.

O protocolo vai ser um passo a passo para a avaliação do teste de olfato. O primeiro procedimento será entregue aos voluntários um questionário para observar se a pessoa está com a distorção ou perda total do olfato. Nesta etapa, Vanessa explica que são perguntas sobre determinados cheiros. “É um teste validado e considerado padrão ouro da avaliação do olfato, então a gente vai confirmar a disfunção do olfato através do teste”, ressalta.

O procedimento será focado na memória olfativa de cada paciente para a recuperação do olfato. “O olfato está muito próximo das memórias e emoções. Reabilita-lo é abrir memórias afetivas, porque também devolve para a pessoa a história dela”, afirma Vanessa.

O tratamento levará em consideração o olfato ligado ao centro de processamento de emoção do cérebro. Será um treinamento de recuperação da função olfativa que leva em consideração aspectos como o histórico de vida e identidade individual de cada pessoa.

Etapas do tratamento

Após a aplicação do questionário, as pesquisadoras farão um inventário, para descobrir e identificar quais são as memórias afetivas de cada pessoa. Com isso, elas podem confirmar a “valência” afetiva, ou seja, qual é o valor sentimental daquele odor ou cheiro. Esse procedimento será aplicado em uma escala visual analógica, onde será avaliado a relação do paciente com os aromas apresentados.

A proposta é recuperar o sentido por meio da memória olfativa com odores que foram importantes na vida do paciente. “O olfato tem um peso nas memórias e na emoção. Possibilitar que as pessoas tenham o seu olfato íntegro, é possibilitar que elas guardem as suas memórias, que tenham essa digital olfativa do mundo preservada. Devolver o olfato para as pessoas, é possibilitar que toda essa digital olfativa do mundo não seja perdida”, conta a naturologista.

O que fica prejudicado na questão do olfato depois de tanto tempo sem funcionar não é a primeira sensação, são as conexões mais profundas que a gente tem, nas áreas centrais do sistema nervoso. “Quando a gente pensa que essas vias que são compartilhadas por processos afetivos, por processos cognitivos, a gente consegue entender que a gente pode usar a memória afetiva e olfativa a nosso favor”, afirma a especialista em neurociência.

O passo seguinte ao inventário é a montagem do treino com quatro potinhos. Nos recipientes, as pesquisadoras colocarão substâncias e uma tabela para o paciente acompanhar e fazer a marcação ao longo do dia durante um mês. “Depois de 30 dias, repete tudo de tudo, a gente vai ter três baterias, são 90 dias fazendo esse treino, a cada 30 dias um treino modificado, pensando na valência dos cheiros. A gente espera ir mudando e trazendo resultados de mudança de como a pessoa está se relacionando com os aromas, como ela está se sentindo”, relata Vanessa.

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Vanessa e Mirella também irão aplicar testes de depressão e qualidade de vida. Será observado se gera impacto na qualidade de vida e nas emoções. “Não é apenas reabilitar o olfato, é observar o quanto isso impacta na nossa emoção e no dia a dia'', argumenta Vanessa.

O tratamento será oferecido de forma gratuita e começará a ser aplicado em janeiro de 2022. Serão dois grupos: um grupo controle, metade estarão em um grupo controle que vão receber o treino clássico e modificado para no final da pesquisa ocorrer a comparação dos resultados.

“Eu sou absolutamente convencida de que a gente vai propor um estudo de relevância muito grande. Tem pessoas passando por dificuldades que elas não imaginavam, só pela perda do sentido do olfato, a importância se dá por isso. A participação é totalmente gratuita, é um estudo que está sendo desenvolvido na universidade pública, com uma aluna de mestrado com bolsa de agências de fomentos de pesquisa. Isso é financiamento de dinheiro público, é um tratamento que naturalmente vai ser oferecido sem custo nenhum para quem participar da pesquisa”, ressalta Mirella.

Além do procedimento

Para participar é necessário morar em São Paulo, ou em regiões próximas para ir à USP uma vez por mês. Com a delimitação da região, as envolvidas no projeto criarão um grupo de apoio para incentivar que as pessoas mantenham a estimulação do olfato. “O grupo é para que mesmo de forma caseira, as pessoas mantenham a estimulação do olfato, para que elas não se sintam desmotivadas”, afirma Vanessa.

A desenvolvedora do projeto conta que é surpreendente observar o impacto da perda de olfato na população brasileiro. Segundo ela, era um tema distante da população “de repente todo mundo percebeu que tem um olfato e ele impacta em muitas funções da nossa vida”.

Para mais informações sobre como participar do tratamento, é necessário entrar em contato com Vanessa Castello pelo endereço: (vanessacbpereira@usp.br).