Não é todo fã de quadrinho que gosta de ler livros sobre a nona arte. Eu adoro. Curto aprender termos e técnicas, ser apresentado a obras e artistas inovadores, colocar os parcos neurônios para repensar conceitos que já estavam cristalizados na minha mente.
É normal também, quando eu leio bons livros teóricos sobre quadrinhos, voltar para degustar algumas HQs clássicas. Sempre descubro coisas: detalhes, por vezes, mas também questões relevantes, que podem ir de abordagens no formato a questões no roteiro. Forma e conteúdo.
Hoje vou falar aqui brevemente de cinco livros sobre quadrinhos dos quais gostei muito. Se você é como eu, e aprecia estudar o tema, terá uma lista diferente – não há uma maneira única de entender uma forma de arte, qualquer que seja ela. E é ótimo ver que este estudo é infinito, sempre há mais para aprender. Espero voltar ao tema ano que vem, mas abordando cinco outros livros teóricos – que certamente terão feito meus neurônios trabalhar.
“Quadrinhos e Arte Sequencial”, de Will Eisner
Este é o livro teórico preferencial de muita gente. Primeiro, por ser um dos precursores a ser tão completo: aborda da anatomia dos personagens à criação dos roteiros, do “timing” da ação à apresentação das páginas. Segundo, por seu autor: Will Eisner, que dedicou décadas e mais décadas à nona arte.
Eisner foi professor em cursos, autor teórico e, acima de tudo, um sucesso na prática. Seu personagem Spirit – um super-herói que aparecia em histórias curtas e cheias de humor – é referência até hoje entre os principais quadrinistas norte-americanos. E, em uma segunda fase da carreira, Eisner criou algo bem distante do Spirit: graphic novels longas, dramáticas, sem personagens fixos ou ação. É o caso de “Contrato com Deus”, “O Edifício” e tantas outras.
Distantes do Spirit, mas igualmente memoráveis, pela qualidade e pelo rico aproveitamento dos elementos gráficos dos quadrinhos – que ele disseca tão bem aqui em “Quadrinhos e Arte Sequencial”.
“Imageria – O Nascimento das Histórias em Quadrinhos”, de Rogério de Campos
Este livro é um passeio não só por personagens e autores clássicos dos quadrinhos, mas também pela história desta arte.
Rogério de Campos vai aos primórdios dos primórdios e nos apresenta autores e mais autores que não usaram a linguagem das HQs como ela é hoje, mas ajudaram a construí-la. E, por isso mesmo, ver como era o trabalho dos precursores, que não tinham a quem seguir, torna a leitura de sua obra ainda mais admirável – pelos riscos que tomaram, pela qualidade que alcançaram. É o caso de, entre tantos outros, do britânico Francis Barlow no século 17, do pintor William Hogarth no século 18 ou das hilárias histórias do suíço Rodolphe Töpffer no século 19.
“A Arte de Osamu Tezuka – Deus do Mangá”, de Helen McCarthy
O universo dos quadrinhos asiáticos em geral – e dos japoneses, em particular – merece muito estudo. Pela qualidade enorme das obras, pela influência mundo afora, por sua história particular. Aqui no Brasil, entretanto, há pouco material teórico sobre este mundo incrível.
Minha sugestão é o trabalho de Helen McCarthy sobre o prolífico Osamu Tezuka, criador de Astro Boy, “A Princesa e o Cavaleiro” e tanta coisa boa. Aprende-se muito, e ficamos com um gosto de “degustação”: há muito material importante dele inédito por aqui. Eu, por exemplo, adoraria ler “Fênix”, o melhor quadrinho do Tezuka – segundo o próprio Tezuka.
“Escrevendo para Quadrinhos”, de Brian Michael Bendis
O título dá a entender que é um manual de como criar roteiros para quadrinhos. Sim, também é isso, mas não só. Bendis é um dos grandes escritores contemporâneos do gênero dos super-heróis, e seu livro é excelente em abordar diferentes aspectos dos quadrinhos.
Embora com um foco bem específico - a indústria norte-americana dos quadrinhos de super-heróis -, Bendis faz um trabalho relevante que se encaixa em qualquer tipo de quadrinhos. Temos dicas de leituras, dicas, exercícios e até sugestões de como autores iniciantes devem abordar editores – além de uma prosa ótima e informal, característica de seus roteiros.
“Desvendando os Quadrinhos”, de Scott McCloud
Este é o meu favorito. McCloud aborda, didaticamente, diferente aspectos das HQs: linhas, traços, balões, letras, cores... Ele investiga um a um os elementos gráficos e narrativos dos quadrinhos, e expõe os vários usos deles ao longo da história - o capítulo dele sobre internet, que estava surgindo como meio para quadrinhos, é incrível.
Há uma apresentação, que considero interessantíssima, sobre os passos que um artista pode dar com sua obra – e que não vale só para os quadrinhos, mas para qualquer Arte: superfície, habilidade, estrutura, idioma, forma e ideia/objetivo. Este capítulo, em particular, abriu meus olhos até para a maneira como degusto e analiso filmes, livros em prosa e todas as outras formas de cultura que consumo.
“Desvendando” acabou sendo desdobrado em duas continuações, “Desenhando Quadrinhos” e “Reinventando os Quadrinhos”, que mantém a qualidade do primeiro livro.
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