Estamos na Semana das Mães. Eu gosto da data e, claro, de escolher presentes bacanas – pelo menos, espero que sejam bacanas... Para a coluna desta semana, pensei em abordar ótimos quadrinhos que abordassem a maternidade. Mas pensei de novo, e resolvi um “formato híbrido”: três HQs com este tema, e três outras escolhidas por alguém com muito mais lugar de fala do que eu: dona Rita, minha mãe. Vou começar pelas sugestões dela.
“Mafalda”, de Quino
Esse eu tinha certeza que estaria na lista dela – todo Natal, um dos presentes que dou para dona Rita é um Calendário Mafalda do ano seguinte...
O argentino Quino criou uma obra-prima com a sua tira “Mafalda”, lançada entre 1964 e 1973. A personagem-título é uma menina argentina de classe média que, como toda criança, tenta entender o mundo a seu redor. Há ingenuidade, ironia, humor e doçura para abordar temas sérios, como pobreza e injustiças sociais, mas tudo fica muito melhor sob o talento do Quino.
“Tintim”, de Hergé
O mundo não é só humor: pode ser engraçado e ter, ao mesmo tempo, uma enorme dose de aventura. O belga Hergé criou 24 aventuras estreladas pelo jornalista Tintim, um jovem topetudo (nos dois sentidos) sempre envolvido em dificílimos mistérios. As histórias ficam ainda mais bacanas graças à presença de seus hilários e levemente atrapalhados amigos, como o capitão Haddock, o cientista professor Girassol e os policiais gêmeos Dupont e Dupond (consegue distinguir um do outro? Preste atenção aos bigodes!).
Aqui, dona Rita não quis se restringir a apenas um personagem, embora o mineiro Henfil tenha criado excelentes protagonistas: Graúna, Fradim, Bode Orelano, Ubaldo (o Paranoico)... Para ela, qualquer livro dele é um achado. E eu concordo: com um olhar preciso e uma sinceridade dolorosa, Henfil expunha, em seus cartuns ou HQs, a dureza de um Brasil socialmente injusto e essencialmente cruel com sua população. Crítica social, com muito humor... e inteligência.
“Baby Blues”, de Jerry Scott e Rick Kirkman
Agora são as minhas sugestões, começando por “Baby Blues”, dos norte-americanos Jerry Scott (roteiros) e Rick Kirkman (desenhos). A dupla retrata um casal que acaba de ter sua primeira filha. O resultado é quase insano para eles, tal a falta de sono e o excesso de cansaço e insegurança – meu Deus, será que estamos fazendo a coisa certa ao educá-la? Ela está com 37,1º de febre, devo ir ao pronto-socorro? Após quatro meses, ela finalmente dormiu noventa minutos consecutivos, será que isso é normal, devemos acordá-la? São dúvidas neste estilo que permeia o cotidiano desta família, e não é preciso ser pai ou mãe para apreciar seu humor – a tira é publicada diariamente há 34 anos nos EUA e continua um sucesso.
“Nori e Eu”, de Sonia Ninomiya e Masanori Ninomiya
Lançado há cinco anos, este quadrinho nacional autobiográfico é forte, tocante e te faz pensar. A coautora Sonia Ninomiya narra como foi educar Nori e a dificuldade em conseguir um diagnóstico correto para ele: seu filho está no espectro autista – a ilustração, aliás, fica a cargo do próprio Nori. A segunda parte torna o livro ainda mais incrível: Nori não só o desenha, mas também roteiriza, trazendo sua versão da história. Me tocou profundamente.
“Você é Minha Mãe?”, de Alison Bechdel
Não é exagero: a norte-americana Alison Bechdel é um dos grandes nomes de quadrinhos no mundo no momento. Seus três livros mais recentes são reflexões profundas e densa a partir da vida dela, suas manias e relacionamentos. Em “Você é Minha Mãe?”, Bechdel reflete sobre sua mãe, uma mulher inteligente e artística, mas que viveu por décadas em um casamento infeliz. Para tentar entender esta mulher complexa – e, claro, a si mesma – Bechdel recorre a livros de psicanálise, muitas conversas com a própria mãe e uma enorme capacidade de reconhecer e exibir seus problemas internas, com uma crueza e honestidade que podem até chocar.
Conclusão, explicação e dedicatória
Na semana passada, não consegui publicar uma coluna e deixo aqui a explicação. Perdemos dona Elza, mãe de dona Rita e, portanto, minha avó materna. Este será o primeiro Dia das Mães sem o carinho e a amizade dela. Dedico esta coluna a ambas, por uma série tão grande de coisas boas que fizeram por mim que nem faz sentido eu tentar resumir aqui.
Pedro Cirne é formado em jornalismo, desenhos e histórias em quadrinhos. É autor do romance “Venha me ver enquanto estou viva” e da graphic novel “Púrpura”, ilustrada por 17 artistas dos 8 países que falam português.
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