Talvez você não saiba quem foi Jack Kirby, mas conhece seus personagens. O onipresente (e divertido) Universo Cinematográfico Marvel, por exemplo, foi criado a partir de seis filmes, que formaram a sua chamada Fase 1:
Homem de Ferro 1 e 2 – filmes estrelados por Tony Stark, o Homem de Ferro, foi criado por Kirby, Stan Lee, Larry Lieber e Don Heck;
Hulk – Também uma criação de Kirby e Lee;
Thor – Você vai perceber um padrão aqui: mais uma criação de Kirby e Lee;
Capitão América – Criação de Kirby e Joe Simon;
Vingadores – Tanto o grupo Vingadores quanto o antagonista do filme, Loki, foram criados por Kirby e Lee.
Já deu para ter uma ideia de quem é Jack Kirby, certo? Este é o pseudônimo mais famoso de Jacob Kurtzberg (1917-94), que no início da carreira também assinou como Charles Nicholas, Curt Davis e Jack Curtiss.
Deu para ter uma ideia, mas Jack Kirby não fez apenas super-heróis para a Marvel, mas também para a arquirrival DC. E, quando eu disse que há uma enxurrada de Kirby sendo publicada no Brasil neste instante, é possível ver isso. Este trimestre que abre o ano traz quatro obras do grande artista, duas da Marvel e duas da DC:
“Eternos” – Este volume de quase 400 páginas reúne todas as 20 histórias criadas por Kirby e publicadas entre 1976 e 78. Os tais Eternos são poderosíssimos e, por enquanto, desconhecidos. Disse por enquanto porque a Marvel lança, no final do ano, um filme deles, com Angelina Jolie e Salma Hayek no elenco.
“OMAC” – Criado para a DC Comics, Buddy Blank é um supersoldado de um futuro distópico. Graças a avanços tecnológicos, seu corpo é conectado a um satélite inteligente que orbita a Terra. Quando aciona este satélite, ele vira OMAC – sigla em inglês para “o exército de um homem só”. Esta edição está programada para março.
“Quarteto Fantástico” – O mais longevo trabalho da parceria Stan Lee & Jack Kirby – e, para mim, o melhor. Esta edição, prevista para abril, coleta as cinco primeiras histórias de Coisa, Senhor Fantástico, Mulher Invisível e Tocha Humana. Como diria o Coisa: “Tá na hora do pau!”.
“Quarto Mundo” – Quando Kirby trocou a Marvel pela DC, nos anos 70, ele estava com apetite. Em vez de assumir apenas uma revista, criou uma “mitologia” inteira dentro da DC e tocou quatro títulos mensais: Jimmy Olsen, Novos Deuses, Povo da Eternidade e Senhor Milagre. Essa saga ficou conhecida como Quarto Mundo e está sendo lançada, em ordem cronológica, no Brasil – o nono volume desta série (que é o último) está à venda.
Aliás, Kirby não fez só super-heróis!
“Sky Masters da Força Espacial” – Lançada nos anos 50, esta obra de ficção científica coloca lado a lado Kirby e o também craque Wally Wood (1927-81).
Aliás, Kirby não fez só aventuras! Há ainda a série “Young Romance”, de... romance! Até onde eu saiba, inédita no Brasil. Voltando à pergunta do título: será que vale a pena?
Kirby escrevia tão bem quanto desenhava. Mais do que isso: bolava universos inteiros. Ele não criou apenas Etrigan, um demônio que fala rimando (?!?!), mas toda uma ideia diferente de Inferno para a DC. O Thor de Lee e Kirby poderia ser apenas a adaptação de um deus nórdico para a Marvel, mas sua Asgard tem uma arquitetura original e futurista (bem reproduzida nos filmes), assim como um mundo incrível de carismáticos coadjuvantes (também retratados no MCU): Lady Sif, os Três Guerreiros, Odin, Heimdall, Skurge...
Os roteiros de Kirby são criativos (um demônio que fala rimando? Sério?). Não à toa, é referência até hoje para escritores como Alan Moore, Neil Gaiman e Brian Michael Bendis. Sua arte é vibrante, colorida e cheia de energia. Não à toa, é referência até hoje para ilustradores como John Byrne, Tom Grummett e Steve Rude.
Se vale a pena ler Kirby? Para fãs dos gêneros de super-heróis (inclusive os que só entraram em contato com eles por meio dos filmes da Marvel), sim. É a semente de tudo. Para os fãs de quadrinhos em geral, também. Décadas depois, a mitologia kirbyana ainda está presente na Marvel e na DC, tanto nos quadrinhos quanto nos filmes e séries inspirados neles.
Não só acho que vale a pena ler Kirby como torço para que venha mais. Inclusive suas histórias de "Young Romance”, um gênero do qual não sou lá muito fã. Mas, vindo dele, quem sabe eu não me converto?
ps – Há duas biografias sobre Kirby lançadas no Brasil: “Jack Kirby: A Épica Biografia do Rei dos Quadrinhos”, graphic novel de Tom Scioli, e “Jack Kirby: o Criador de Deuses”, do ótimo Roberto Guedes. No site Hábito de Quadrinhos, primo-irmão desta coluna, eu falo da parceria Stan Lee e Jack Kirby, os talentos por trás do Universo Marvel e seus super-heróis e também conto sobre uma história tão icônica criada pela dupla que, nas décadas seguintes, três escritores deram um jeito de colocar seus personagens no meio dessa aventura.
Pedro Cirne é formado em jornalismo, desenhos e histórias em quadrinhos. É autor do romance “Venha me ver enquanto estou viva” e da graphic novel “Púrpura”, ilustrada por 17 artistas dos 8 países que falam português.
REDES SOCIAIS