Coluna Vladir Lemos

A sedução dos importados

Fosse mais arrumadinho, tivesse outra fama, quem sabe os estrangeiros aceitassem vir ganhando menos. Enquanto a gente não chega lá, e vai saber se vamos chegar, o futebol brasileiro vai fazendo pelos técnicos estrangeiros o que não se dispõe a fazer pelos nossos


26/02/2021 18h33

Acho curiosa a maneira como os clubes brasileiros têm tratado de um tempo para cá a questão dos treinadores. Difícil dizer qual pode ter sido o estopim para esse crescente desembarque de técnicos estrangeiros por aqui. Talvez um efeito colateral do discurso médio da crônica esportiva defendendo a ideia de que a falta de brilho do nosso futebol estaria intimamente ligada à falta de sintonia dos profissionais brasileiros com as tendências mundiais. Creio que a aprovação de um maior número de jogadores estrangeiros por equipe também teve lá seu papel para que os cartolas passassem a olhar o mercado do nosso continente de outro jeito.

Mas quando falamos estrangeiros fica a impressão de que se trata de um movimento global. O que não é verdade. Em linhas gerais a onda costuma se restringir à nossa América sulista, com predominância fortemente argentina. Os portugueses são mais recentes. O que tem me saltado aos olhos nesse movimento todo é a exigência dos clubes na hora de escolher alguém de fora. Por mais que a atual temporada tenha nos convencido de que os treinadores de casa têm lá suas virtudes, são capazes de dar um caldo, a coisa anda desequilibrada. 

Se isso já havia ficado claro quando o Palmeiras optou por contratar Abel Ferreira sem que ele tivesse no currículo um título sequer, agora , de certa forma, essa impressão se renova com o Santos contratando Ariel Holan. Nos dois casos caberia o argumento de que não eram as primeiras opções. Como é verdade que, ao contrário de Abel, Holan chega trazendo na bagagem um título continental. De qualquer modo fica muito claro que o sarrafo na hora de contratar um estrangeiro tem sido colocado bem mais baixo.

A questão econômica poderia justificar isso, o que em geral não tem acontecido. Custam caro. E é interessante notar que quem andou sendo lembrado para a vaga foi Fernando Diniz. Todos sabem que se há uma coisa que pesa com relação ao ex-treinador do São Paulo é justamente a ausência de títulos. Tenho certeza de que em dado momento , se você é do tipo que gosta de falar de futebol, deve ter ouvido alguém defender a teoria de que se tivesse conquistado um título com o time do Morumbi Fernando Diniz passaria a outro patamar. O que li é que a razão do clube santista ter dito não a Diniz foi o desentendimento recente dele com um dos jogadores do time que dirigia.

Não deixa de ser um argumento. Mas creio que seria mais honesto alegar que se tratava de um técnico que não agradaria a maioria. E se muita gente não vê em Diniz virtudes suficientes pra comandar um time não custa lembrar que se trata de um treinador cujo patamar salarial - pelo que tem sido noticiado - está em total acordo com sua condição de contestado. Seria aposta, seria. Mas Ariel Holan também é. Fosse mais arrumadinho, tivesse outra fama, quem sabe os estrangeiros aceitassem vir ganhando menos. Enquanto a gente não chega lá, e vai saber se vamos chegar, o futebol brasileiro vai fazendo pelos técnicos estrangeiros o que não se dispõe a fazer pelos nossos. ​

Vladir Lemos é jornalista, apresentador Revista do Esporte e diretor de Esporte da TV Cultura.

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