Jadson Lima - AGÊNCIA CENARIUM
MANAUS (AM) - O governador de Roraima, Antonio Denarium (Progressistas), foi citado em uma investigação que apura os assassinatos de dois produtores rurais, identificados como Jânio Bonfim de Souza, 57 anos, e Flávia Guilarducci de Souza, 53 anos. Após a menção ao nome de Denarium em depoimento de um dos suspeitos de executar o crime, o Ministério Público de Roraima (MP-RR) apontou possível obstrução à Justiça e pediu que os autos do processo sejam encaminhados à Procuradoria-Geral da República (PGR), uma vez que o governador tem foro especial por prerrogativa função.
A citação a Denarium foi feita pelo seu então coordenador de segurança, o capitão da Polícia Militar (PM-RR), identificado como Helton John Silva de Souza. Além do governador, o militar também comprometeu os comandantes da PM de Roraima, o coronel Miramilton Goiano de Souza, e a delegada-geral da Polícia Civil de Roraima (PC-RR), Darlinda de Moura Viana.
As investigações apontam que uma disputa de terras resultou nos crimes de homicídio, praticados contra o casal em abril de 2024 na Vicinal do Surrão, localizada município do Cantá (RR), distante 24 quilômetros de Boa Vista.
Helton John, que teve a prisão decretada pela Justiça, prestou novo depoimento de quase duas horas no dia 27 de junho 2024. O militar afirmou que presenciou o irmão do investigado Caio Porto, identificado como Tiago Porto, reunido com Denarium na sede do Palácio do Governo de Roraima após o crime, em 24 de abril de 2024. E descreveu detalhes.
"Por volta das 10h eles vinham descendo. E quem vinha descendo? O governador [Antônio Denarium] e o Tiago [Porto] que já vinha conversando com ele e vinham várias pessoas. Eles passaram por mim e o governador atravessou para fazer uma filmagem [para chamar o] último comício [da eleição suplementar do município] de Alto Alegre (RR)", diz o militar em um trecho do depoimento.
De acordo com Helton John, Tiago Porto foi até ele e afirmou que Denarium fez uma ligação para a atual delegada-geral da Polícia Civil de Roraima (PC-RR), Darlinda de Moura Viana, mas ela não teria o atendido inicialmente. O investigado também disse que uma servidora do Governo de Roraima, identificada apenas como Lidiane, passou o contato da delegada-geral da PC-RR para Tiago.
"Ele [Tiago Porto] falou que o governador ligou para a delegada-geral da PC-RR duas vezes e não conseguiu. [Denarium] não estava sabendo o que estava acontecendo e pediu para a Lidiane passar o número da delegada para que ele [Tiago] conversasse diretamente com ela", afirmou o investigado em outro trecho.
O ex-segurança de Denarium também disse às autoridades que a delegada retornou ao governador minutos depois. Eles conversaram ao telefone. Após a ligação, diz o depoente, Tiago atravessou e conversou novamente com Denarium. "O Tiago atravessou lá e aí [Denarium] falou lá: Pode ligar e fala direto com ela. Ele atravessou [novamente] até o seu veículo que estava estacionado ao lado e foi embora. Aí eu falei: Então [o Caio] vai se apresentar", diz o militar em outro trecho do depoimento.
Comandante da PM citado
Além do governador Antonio Denarium, o capitão da PM também citou no mesmo depoimento o comandante-geral da Polícia Militar de Roraima (PM-RR), coronel Miramilton Goiano de Souza. Helton John entrou em contato com Miralmilton por volta das 19h do mesmo dia em que ocorreram os crimes.
"Eu estou precisando falar com o senhor [...] Aí ele falou: 'Vem aqui em casa' e perguntou: 'É grave?' Respondi que era salgado e perguntei: 'Mas aqui pelo WhatsApp?'. Ele afirmou que [a ferramenta] era confiável", relembra início da conversa que tiveram por um aplicativo de mensagem.
Em seguida, o investigado narra às autoridades que perguntou ao chefe da PM se ele estava ciente da situação ocorrida no Cantá e confessou que estava no local durante os assassinatos. O coronel Miralmilton, diz o depoente, o questionou por que não deu voz de prisão a Caio Porto.
"O senhor está sabendo da situação na região do Cantá? Ele respondeu: 'Tô, lá da família Porto, né!' Eu tô ali naquele meio [...] eu estava lá [..] fui lá só acompanhar uma proposta e o Caio pegou e fez isso aí tudo. [...] eu tenho que explicar uma situação que vai demorar um pouco. Queria saber se eu posso falar com o senhor", afirmou o investigado.
De acordo com Helton John, o coronel Miramilton teria questionado o então segurança de Denarium se ele estava com o seu aparelho celular no momento do crime. O militar afirmou que sim e então o comandante da PM pediu que ele trocasse de aparelho telefônico e aguardasse as investigações.
"Ele perguntou: 'Tava com celular lá?' Aí eu disse: .Tava'. Ele falou: 'Então troca!', diz o depoente em outro trecho do depoimento.
Desmembramento da investigação
No oficio que encaminhou à PGR, o MP-RR desmembrou a ação judicial que investiga o caso. De acordo com o órgão, a citação de autoridades por possível envolvimento no caso deve ser apurada em outras instâncias da Justiça, porque as autoridades citadas têm foro especial por prerrogativa de função, o chamado foro privilegiado. No entanto, o órgão sustenta que os executores do crime - que não têm foro privilegiado - devem continuar sendo investigados pela Vara do Tribunal do Júri de Roraima.
"Os fatos noticiados em relação ao Comandante Geral da Polícia Militar merecem apuração, sem prejudicar o andamento do processo em relação aos executores que estavam presentes na cena do bárbaro crime", diz trecho do documento.
Veja documento do Ministério Público de Roraima (MP-RR) na íntegra.
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