- A TV Cultura promoveu um debate com candidatos à Prefeitura de São Paulo neste domingo (15), diretamente do Teatro B32, em São Paulo.
Participaram da sabatina os candidatos Guilherme Boulos (PSOL), José Luiz Datena (PSDB), Marina Helena (Novo), Pablo Marçal (PRTB), Ricardo Nunes (MDB) e Tabata Amaral (PSB).
Apesar de regras terem sido estabelecidas previamente com as equipes dos candidatos, uma agressão foi registrada durante o quarto bloco. Datena agrediu Marçal com uma cadeira, após ser provocado pelo ex-coach.
Ao longo da edição, o projeto Aos Fatos checou as falas e dados apresentados pelo candidato. Veja abaixo as avaliações: - “[Datena] é alguém que responde por assédio sexual” — Pablo Marçal
Pablo Marçal usa contra José Luiz Datena uma acusação antiga e já arquivada. Em 2019, o apresentador foi denunciado por assédio sexual contra a repórter Bruna Drews, do programa Brasil Urgente. Segundo a acusação, Datena teria dito frases de teor sexual à jornalista durante confraternização entre colegas de trabalho em 2018. Na época, o apresentador chamou as acusações de “calúnia e delírio”.
Nove meses depois, as acusações foram retiradas pela própria denunciante por meio de uma carta registrada em cartório. O processo foi arquivado pela Justiça naquele ano. Depois, a repórter afirmou ter sido induzida a voltar atrás da denúncia e reforçou as acusações nas redes sociais, mas o processo não foi reaberto.
Além disso, a denúncia feita contra Datena era de assédio sexual, não abuso ou estupro, como insinuado por Marçal em outros momentos ao longo do debate. Antes de mencionar a acusação por assédio sexual, o empresário recorreu a uma gíria usada para pessoas acusadas de estupro em presídios para se referir a Datena. “Tem alguém aqui que é ‘jack’”, disse Marçal. Não existem denúncias de estupro — passadas ou presentes — contra José Luiz Datena.
A falsa acusação de estupro foi o motivo central do embate entre os candidatos, que culminou na agressão de Datena contra Marçal e na expulsão do tucano. - “A questão do hospital da Cachoeirinha, os médicos desejaram e fizeram um remanejamento do atendimento” — Ricardo Nunes
Ao ser questionado sobre a restrição do serviço de abortos legais nos hospitais municipais de São Paulo, o prefeito argumentou que a direção do hospital Vila Nova Cachoeirinha decidiu remanejar os atendimentos para outros hospitais. A fala de Nunes, no entanto, omite o contexto da decisão, que foi acompanhada de orientações ilegais da própria prefeitura e foi questionada pela Justiça.
Em dezembro de 2023, a prefeitura suspendeu a realização de abortos legais no Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha, um dos estebelecimentos referência nesse tipo de atendimento.
Na época, a Secretaria da Saúde argumentou que iria priorizar cirurgias eletivas e mutirões cirúrgicos. A pasta afirmou também que estaria apurando suspeitas de procedimentos irregulares na instituição. No entanto, por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação), a Agência Pública mostrou que a secretaria não registrou nenhuma denúncia de aborto ilegal nos últimos anos.
Nunes também omite que o hospital Vila Nova Cachoeirinha era o único estabelecimento no estado a realizar o procedimento em gestações de mais de 22 semanas. Na mesma época da restrição, a Secretaria de Saúde do município alterou diretrizes em seu site oficial e passou a considerar que o aborto legal seria “a interrupção da gravidez, nos casos previstos em lei, até a 22ª semana”.
Essa definição é falsa, pois, conforme explicou Aos Fatos em reportagem anterior, a lei brasileira não define prazo máximo para a realização do aborto legal. O procedimento pode ser solicitado, sem limite do tempo gestacional, quando a gravidez traz risco de vida à mãe, resultou de estupro ou quando o feto é anencéfalo.
A orientação da prefeitura, portanto, feria a lei. Após as críticas, a secretaria retirou a orientação do site.
De acordo com a ONG Projeto Vivas, a interrupção do serviço de aborto legal fez com que ao menos 20 mulheres tivessem atendimento recusado entre dezembro de 2023 e janeiro de 2024. Algumas precisaram, inclusive, ir a outros estados para realizar o procedimento.
Em 19 de junho, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes determinou que os hospitais de São Paulo comprovassem que estavam realizando procedimentos de aborto legal.
Mesmo assim, denúncias publicadas na imprensa revelam que mulheres que procuraram atendimento em outros hospitais da cidade tiveram o serviço negado mesmo depois da decisão da justiça:- Em junho deste ano, a GloboNews publicou uma reportagem sobre duas mulheres que tiveram abortos negados porque estavam com gestações avançadas;
- Um mês depois, o canal revelou mais um caso de uma mulher que teve o procedimento recusado e foi encaminhada para um hospital federal;
- Em agosto, a GloboNews noticiou mais três casos de atendimentos negados na capital.
- Em junho deste ano, a GloboNews publicou uma reportagem sobre duas mulheres que tiveram abortos negados porque estavam com gestações avançadas;
- “Eu inaugurei 18 [UPAs]” — Ricardo Nunes
Nunes repete um dado exagerado que citou durante entrevista ao Roda Viva na última segunda-feira (9) e também no Flow Podcast, no dia seguinte. Das 18 UPAs listadas pela Secretaria Municipal de Saúde, três delas foram inauguradas antes de o emedebista assumir a prefeitura de São Paulo:- A UPA Jabaquara, entregue em abril de 2021, quando Bruno Covas (PSDB) ainda era o prefeito, e Nunes, seu vice;
- A UPA 24h Vera Cruz, inaugurada em 2018 pelo prefeito João Doria (PSDB);
- E a UPA Santo Amaro, entregue em 2018, também na gestão Doria. Nunes foi responsável pela transferência do local e pela ampliação da unidade em junho deste ano.
- A UPA Jabaquara, entregue em abril de 2021, quando Bruno Covas (PSDB) ainda era o prefeito, e Nunes, seu vice;
- “O Ricardo Nunes botou empresas ligadas ao tráfico de drogas no transporte” — Guilherme Boulos
- Não é verdade que o atual prefeito foi o responsável pela contratação de empresas de ônibus ligadas ao tráfico de drogas. Os contratos de concessão entre a SPTrans e as companhias UPBus e Transwolff, investigados pelo Ministério Público por suspeitas de ligação com a facção criminosa PCC, foram firmados em 2015, durante a gestão de Fernando Haddad (PT).
Os contratos ocorreram em caráter emergencial, ou seja, sem licitação. Segundo Jilmar Tatto (PT-SP), então secretário de transportes e atual deputado federal, a prefeitura tinha o objetivo de fazer uma nova licitação mas não conseguiu devido a questões levantadas pelo TCM (Tribunal de Contas do Município) e que, por se tratar de um serviço essencial, a legislação permitia o contrato emergencial.
A licitação foi realizada somente em 2019 ,na gestão de Bruno Covas (PSDB), após decisão do TCM. A prefeitura então assinou 32 contratos para concessão de linhas de ônibus por um prazo de 15 anos. À época, Ricardo Nunes ainda era vereador. - “Eu vou fazer aquilo que lamentavelmente o governador vetou quando foi aprovado na Assembleia Legislativa, que é garantir psicólogos em todas as escolas municipais de São Paulo” — Guilherme Boulos
O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) vetou o projeto de lei que buscava regulamentar a contratação de psicólogos e assistentes sociais para as escolas públicas da rede estadual, não municipal.
O PL 637/2023, que foi aprovado na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), tinha como objetivo regulamentar a lei 13.935/2019, que foi aprovada pelo Congresso Nacional e dispõe sobre a prestação de serviços de psicologia e socioassistencial nas redes públicas de educação básica em todo o território nacional. Em 2019, o então presidente Jair Bolsonaro (PL) vetou a lei, mas teve a decisão derrubada pelo Congresso.
O governo Tarcísio de Freitas justificou a decisão pelo veto afirmando que o projeto aprovado pela Alesp é inconstitucional, visto que a criação de atribuições e encargos a órgãos públicos só pode ser feita pelo Executivo. Além disso, alegou que a Secretaria de Educação estadual já estava desenvolvendo um programa similar.
Atualmente, a Prefeitura de São Paulo conta com o Naapa (Núcleo de Apoio e Acompanhamento para Aprendizagem), cuja equipe inclui psicólogos, psicopedagogos e assistentes sociais. Em 2023, a gestão de Ricardo Nunes anunciou a contratação de 24 novos profissionais para integrar o núcleo, o que significaria um aumento de 25% da equipe. - “Quase 80 pessoas já perderam sua vida [por causa do ar poluído]” — Tabata Amaral
A candidata cita um dado publicado pela Folha de S.Paulo no último dia 9 com base em números divulgados pela Secretaria Municipal de Saúde. Segundo a reportagem, 76 pessoas morreram na capital por síndrome respiratória aguda grave entre agosto e a primeira semana de setembro deste ano. Não há, no entanto, como relacionar essas mortes diretamente à fumaça decorrente das queimadas que ocorrem no país.
Além de ser causada pela inalação de fumaça e gases tóxicos, a síndrome respiratória aguda grave pode ser uma consequência do agravamento de doenças como a gripe e a Covid-19. Ela se caracteriza por falta de ar, desconforto respiratório e coloração azulada dos lábios.
O número de mortes causados pela síndrome neste ano é, inclusive, menor do que o registrado no mesmo período nos últimos dois anos:- Em 2023, a capital teve 126 óbitos por síndrome respiratória aguda grave;
- Em 2022, foram 264 mortes.
- Em 2023, a capital teve 126 óbitos por síndrome respiratória aguda grave;
- “Falando do Nunes, eu mostrei já no outro debate que na rede da prefeitura tinha sim um programa chamado Saúde para Todos e vários outros problemas que a gente vê aí com linguagem neutra, inclusive mudança de gênero para crianças” — Marina Helena
É verdade que em dezembro de 2020 a Secretaria Municipal de Saúde lançou o programa Saúde para Todes, com uma série de vídeos divulgados para dar visibilidade a ações de atendimento à população LGBTQIA+ em São Paulo. Atualmente, as peças estão fora do ar.
No entanto, a candidata desinforma ao citar um suposto programa de mudança de gênero para crianças.
A prefeitura tem um protocolo “para o cuidado integral à saúde de pessoas trans, travestis e com vivências de variabilidade de gênero no município de São Paulo”, publicado em abril de 2023.
Dentre outros tópicos, o documento prevê o bloqueio hipofisário, uma técnica não-hormonal com o objetivo de retardar o desenvolvimento de características corporais por meio do bloqueio da produção de hormônios responsáveis pelas transformações da puberdade.
A literatura médica considera possível o início do bloqueio a partir dos 8 anos, quando inicia-se a puberdade, mas o protocolo estabelece que as ações são voltadas para “adolescentes considerando a faixa etária de 10 a 20 anos”.
A técnica é reversível, não tem efeito permanente e pode ser interrompida a qualquer momento. Portanto, não constitui uma “mudança de gênero”, como afirmado pela candidata, mas uma forma de atrasar o início da puberdade, sendo inclusive uma intervenção também utilizada em casos de puberdade precoce.
Além disso, o CFM (Conselho Federal de Medicina) estipula que indivíduos que recebem bloqueadores puberais precisam atender a diversos critérios e participar de protocolos de pesquisa em instituições de referência. A aplicação de hormônios só pode ocorrer a partir dos 16 anos, enquanto a cirurgia de readequação de gênero tem como idade mínima os 18 anos.
Como funcionou o debate
Ao todo, o debate contou com cinco blocos. No primeiro, foram feitas perguntas programáticas a todos os candidatos. Entre o segundo e o quarto bloco, o candidato fez perguntas para o outro candidato. O quinto e último bloco foi dedicado às considerações finais.
A transmissão aconteceu pela TV Cultura, app Cultura Play, site da emissora e seus canais no Youtube, Facebook e Tik Tok, além da Rádio Cultura FM (103,3).
Roda Viva | 2º turno
No segundo turno, a emissora promoverá um Roda Viva especial com os dois candidatos que irão disputar a Prefeitura de São Paulo. O programa terá dois blocos de 25 minutos e outros dois de 20 minutos cada.
Com tempos iguais de participação, os entrevistados ocuparão o centro jornalístico de forma alternada, seguindo a ordem que será decidida por sorteio 30 minutos antes do início da edição, com a presença de assessores dos dois candidatos. No quinto bloco, eles permanecerão juntos no estúdio para as considerações finais.
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