Após um ano de pandemia, entregadores de aplicativos continuam na luta por direitos trabalhistas
“Tudo abre e fecha e nós continuamos na rua trabalhando na linha de frente sem perspectiva da imunização contra Covid-19 para esse grupo”, diz entregador de São Paulo
02/06/2021 13h05
O relatório anual de acidentes da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) da cidade de São Paulo, divulgado pelo órgão na última quinta-feira (27), mostrou que das 809 pessoas que perderam a vida no trânsito em 2020, 345 foram de motocicletas. Dessas mortes, os óbitos de motofretistas (incluídos os entregadores por aplicativo) representam 16% do total.
Enquanto a pandemia da Covid-19 fechou empresas, escolas e comércios, obrigando adaptações para o trabalho remoto, alguns profissionais, como entregadores, não conseguiram aderir a quarentena justamente para atender aqueles em situação de isolamento social.
Aumento do uso de aplicativos de entrega
Para entender essa realidade, o especialista em Tecnologia, Inovação e Tendências Arthur Igreja explicou como a pandemia aumentou drasticamente a demanda por entregadores e disse não ver motivos para acreditar que essa influência vai passar.
“Pela necessidade de se proteger, aplicativos de entrega foram adotados em uma velocidade espantosa nesse momento. Mesmo pessoas que se vacinaram contra a Covid-19 e retomaram a sua vida em alguma medida em outros hábitos, esse da entrega ficou, porque a pessoa se deu conta que ela perde menos tempo e tem uma série de conveniências”, explicou Igreja.
Sobre a proteção ao funcionário, ele destaca a importância do vínculo formalizado para cobrir os riscos diários, tanto no trânsito quanto na hora do contato com o cliente. “O fato é que eles estão em contato com objetos de muitas pessoas. Então os aplicativos e até o governo encontram esse desafio de garantir que eles tenham condição de se proteger, porque eles tão incrivelmente expostos” disse.
Esse risco envolve também ciclistas. O relatório da CET apontou um crescimento da bicicleta como ferramenta de trabalho pelos entregadores de aplicativo. Com isso, 37 ciclistas perderam a vida nas ruas e avenidas da capital em 2020.
“Tudo abre e fecha e a gente continua na rua trabalhando na linha de frente. Está na hora de colocar entregadores no grupo prioritário para a vacina Covid-19”, disse o entregador Alexandre Brocco, 36. Ele faz entregas com sua bicicleta há dois anos em São Paulo, já passou por aplicativos como UberEats, Rappi, e hoje trabalha tanto pelo iFood quanto pelo Delivery Center.
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Além da vacina, Alexandre trouxe uma reivindicação comum entre os entregadores: o reajuste de salário. “As empresas deveriam pagar mais, não só distribuir máscara e álcool em gel, mas um salário digno e um suporte melhor, principalmente pelos custos de logística que bancamos por nossa conta. A bike, o capacete, o colete, o tênis, a luz traseira, a luz no capacete, minha bag, é tudo meu. Os equipamentos são caros, é muito difícil comprar as coisas de segurança necessárias para trabalhar”, completou.
SindimotoSP
Gerson Cunha, vice-presidente do SindimotoSP (Sindicato dos Mensageiros Motociclistas, Ciclistas e Moto-Taxistas do Estado de São Paulo), ressaltou as condições precárias de trabalho a que este grupo é submetido.
“As condições de saúde e de trabalho do motofretista de aplicativos em São Paulo hoje são precárias, quase uma semi-escravidão”, afirmou. Gerson contou que o sindicato vem lutando para conseguir o vínculo trabalhista para entregadores, a fim de lhes garantir mais direitos.
“O Ministério Público do Trabalho, junto com o SindimotoSP, ajuizou ações civis públicas na Justiça do Trabalho e estamos aguardando o reconhecimento ou não do vínculo trabalhista”, explicou o vice-presidente do sindicato.
Essa conquista envolveria férias, décimo terceiro salário e também o seguro para acidentes. O também entregador de aplicativos em São Paulo Alexandre Ribeiro da Silva, 46, entende que não são todos os entregadores que desejam ter esse vínculo trabalhista mas, para ele, algumas garantias são necessárias.
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“Não temos seguro nenhum. Eu sofri um acidente outro dia e se tivesse ficado impossibilitado de trabalhar, estaria sem receber nada”, comentou o ciclista que faz entregas desde abril de 2020. Alexandre ainda cita um seguro do aplicativo iFood, que caracteriza com uma “piada”: “Você vai no hospital particular, gasta o seu dinheiro e depois o iFood te repõe. Quem vai ter cinco, 10 mil reais para gastar assim? Se você passar em frente de um hospital desse você já paga”.
Em março deste ano, o aplicativo iFood divulgou o Seguro Acidentes Pessoais, com o valor das indenizações. Entretanto, como pontuou Alexandre, o entregador que sofreu o acidente deve procurar "por atendimento médico, efetuar o pagamento dos procedimentos referentes ao tratamento necessários, sejam eles médicos, hospitalares ou odontológicos, e guardar os comprovantes das despesas".
Por isso, sindicatos como o SindimotoSP lutam pela inclusão dos mensageiros, motociclistas, ciclistas e moto-taxistas no grupo prioritário para a vacinação contra Covid-19. Para o vice-presidente do sindicato, é uma questão de saúde que parece estar sendo ignorada, mesmo este grupo estando em contato diário com moradores de toda a cidade.
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