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Gravidez na infância: Entenda quais são os riscos de uma gestação precoce

Os quadros mais comuns são de desnutrição, eclâmpsia e hemorragia


01/07/2022 14h26

Nas últimas semanas, a gravidez na infância entrou em discussão após o site The Intercept Brasil e o Portal Catarinas divulgarem o caso de uma criança de 11 anos que engravidou em decorrência de um estupro.

O caso aconteceu em Santa Catarina. Em 20 de junho, a juíza Joana Ribeiro Zimmer apareceu em um vídeo constrangendo a criança de 11 anos, e tentou convencê-la a não realizar um aborto, procedimento que é legal em casos como esse.

No episódio em Santa Catarina, o Ministério Público Federal (MPF) informou que o procedimento de interrupção de gestação foi realizado na menina de 11 anos. Mas o caso não é isolado, em 2020 outro fato parecido aconteceu no Espírito Santo.

Uma criança de 10 anos, grávida após ter sido estuprada pelo tio, teve o pedido de realização do aborto negado pelo Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes (Hucam). A menina conseguiu realizar o procedimento de interrupção somente após uma decisão judicial.

O site da TV Cultura conversou com a obstetriz Mariana Betioli, formada em Obstetrícia. Bertioli explica quais complicações uma menina de 11 anos pode sofrer durante a gestação e quais são os riscos para o bebê.

A especialista afirma que é um erro a concepção de que a menina está pronta para ser mãe logo após a primeira menstruação. Um dos motivos de que a gravidez precoce seja classificada como de risco é pelo fato de que o corpo dela não está preparado para geração de um feto.

“Essa fase da vida é muito muito arriscada para a saúde da menina. O corpo dela não está formado. Por isso, o risco de morte é de quatro a cinco vezes maior do que numa mulher de 20 anos a 25 anos. Então, [a menina] precisa de todos os nutrientes que o corpo recebe. Se precisar competir entre os dois [corpo e feto], o corpo vai favorecer o feto e a criança vai ficar desnutrida”, pontua.

A desnutrição é um dos problemas mais sérios que a criança pode enfrentar, no entanto, não é o único. O período ainda pode desencadear outras questões de saúde, que aparecem mais próximas do parto: o parto prematuro, já existe um maior risco de rompimento prematuro da bolsa.

Além disso, é possível que a menina sofra hemorragia. Segundo a obstetriz, a hemorragia pós-parto é a segunda maior causa de morte materna no mundo. “Muitas e muitas mulheres morrem de hemorragia pós parto e o risco fica muito aumentado no caso de uma criança”, acrescenta.

Outros fatores também são desenvolvidos. A menina pode desenvolver hipertensão durante a gravidez, pré-eclâmpsia e eclâmpsia. A especialista explica que eclâmpsia é pode levar à morte.

A eclâmpsia é um quadro no qual a mulher tem várias convulsões, o que pode levar a danos cerebrais e físicos. “É uma situação de muito alerta e muita atenção. Se o quadro se desenrola para uma eclampsia é muito complicado. As consequências são tanto para a gestante, quanto para o feto. São consequências muito sérias, como o rompimento do útero”, ressalta.

Após a gestação, ainda é possível que a mãe tenha outras doenças, como problemas cardíacos, diabetes gestacional, que pode gerar uma predisposição ao desenvolvimento de uma diabetes tipo 2 ao decorrer da vida.

Parto

Mariana ainda afirmou que a gravidez na infância não leva dificuldades apenas no período gestacional, na hora do parto a menina ainda pode sofrer mais riscos.

“Os ossos da pelve não estão formados, então o parto ele se torna mais difícil no caso de uma criança. Como o corpo não está plenamente desenvolvido, a passagem do bebê na hora do nascimento pode ter várias complicações. Uma cesárea resolve em partes esse problema, mas tem vários outros o risco”, disse.

A especialista destaca que o feto também está em risco em uma situação de gravidez precoce. O bebê pode não ter uma boa formação, além de ter a probabilidade de nascer com dificuldades respiratórias, anomalias graves e síndromes congênitas.

Saúde mental

A saúde mental também é um fator importante quando a gravidez na infância é colocada em pauta. Mariana disse que algumas síndromes psicológicas podem aparecer ao longo da gestação, e ainda, após o parto. A depressão pós-parto, tentativa de suicidio e psicose pós-parto são alguns exemplos.

“As questões emocionais não são menos importantes. A chance dessa criança abandonar o bebê e não cuidar do bebê é muito grande. Praticamente todos os casos são fruto de uma de um estupro, então é uma questão muito séria que essa mulher leva pra vida toda”, complementa.

Saúde pública

De acordo com Mariana, episódios de gravidez na infância devem ser tratados como questão de saúde pública e precisam ser discutidos com responsabilidade. Além disso, o assunto ainda é um debate que deve ser feito no âmbito da educação sexual.

“Quando a gente olha a questão da educação sexual, se a gente priva as crianças e os adolescentes da educação sexual, a gente está prejudicando as mulheres. No final das contas, os índices de estupros acontecem muito mais com mulheres. Falta informação sobre contraceptivos e acesso a contraceptivos seguros”, argumenta.

“A educação sexual acaba caindo muito nas costas das mulheres. Todas as consequências disso estão nas costas dessas mulheres. Enquanto a gente não colocar as mulheres ali no centro do problema, e lutar pela vida e pela saúde delas, a gente vai estar priorizando a religião e a política sem colocar no centro a saúde dessas pessoas [que é o mais importante”, finaliza Mariana.

Dados de gravidez precoce

Apesar de os casos terem ganhado repercussão no Espírito Santo e em Santa Catarina, os números de gravidezes no período da infância não são isolados no país. De acordo com os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, de 2019, o Brasil registrou uma média anual de 26 mil partos de mães com idades entre 10 a 14 anos.

O levantamento mostrou ainda que a cada hora, quatro meninas de até 13 anos são estupradas no país. Números do Ministério da Saúde ainda revelaram que em 2014 nasceram 28.244 filhos de meninas entre 10 e 14 anos e 534.364 crianças de mães com idade entre 15 e 19 anos.

Ainda que as informações indiquem um índice elevado de casos, especialistas na área da saúde apontam que a gravidez na infância é risco tanto na vida da menina, quanto na vida do bebê.

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