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Política Ambiental: Diretor do IPAM diz que governo Lula deve priorizar a criminalização de atividades ilegais

Eugênio Pantoja ainda faz um retrospecto do que foi discutido na COP27


22/11/2022 17h31

Nas últimas semanas, líderes, autoridades e especialistas se reuniram na 27° conferência do clima da Organização das Nações Unidas, a COP 27, para debaterem sobre questões ambientais. O evento ficou marcado por uma declaração de António Guterres, secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em que disse que o mundo está em “caos climático”.

Segundo o relatório da ONU, os últimos oito anos foram os mais quentes da história. “O último relatório global é de caos climático crônico. Como a WMO mostrou claramente, mudanças em velocidade catastrófica vão devastar vidas em todos os continentes. Os últimos oito anos foram os mais quentes registrados, fazendo cada onda de calor mais intensa, especialmente para as populações vulneráveis. O nível do mar está subindo duas vezes a velocidade do que nos anos 1990, ameaçando países insulares e bilhões de pessoas nas faixas costeiras”, disse.

Neste contexto, autoridades de diversos países discutiram acordos em uma tentativa de mitigar os danos que causam impactos no meio ambiente. A conferência que aconteceu em Sharm el-Sheikh, no Egito, acabou no último domingo (20). Após o encerramento, os países definiram acordos e metas para serem seguidos nos próximos anos. A participação do Brasil ficou marcada pelo discurso do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Para falar sobre a COP27 e o discurso de Lula, o portal da TV Cultura conversou com Eugênio Pantoja, diretor de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial do IPAM - Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. O advogado esteve presente na programação e acompanhou as movimentações e pautas discutidas.

Segundo Pantoja, ele esperava metas mais arrojadas e audaciosas de alguns países, principalmente sobre os assuntos que envolvem as emissões ao meio ambiente relacionadas ao uso de combustível fóssil. No entanto, de acordo com o especialista, o debate não se estendeu devido à guerra na Ucrânia.

Pantoja acredita que em Glasgow, na COP26, no ano passado, houve anúncios mais propositivos em relação ao que foi visto neste ano, ele aponta a falta de debates sobre ações. “Alguns assuntos ficaram aquém do esperado para uma COP que se pretendia ser de implementação. Eu vejo que Glasgow teve mais anúncios propositivos em termos de ação do que propriamente a COP27”, afirma.

Alguns tópicos foram destaques durante os dias da conferência: Fundo de perdas e danos; regras financeiras; combustíveis fósseis; créditos de carbono; questão do metano entre outros.

O principal assunto discutido foi o fundo de perdas e danos. A medida visa a criação de um fundo para indenizar os países mais vulneráveis às mudanças climáticas, o projeto foi apresentado pela União Europeia e em 48 horas um acordo foi fechado, ainda não há detalhes de como o fundo aconteceria. “A criação do fundo foi talvez a grande notícia, porém ainda sem metas de captação de quanto cada país vai enviar então, acho que isso ficou em falta”, ressaltou o diretor de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial do IPAM.

Outro assunto foi colocado no evento, o aumento da temperatura do planeta. Segundo António Guterres, o "nosso planeta ainda está na sala de emergência". "Precisamos reduzir drasticamente as emissões agora — e esta é uma questão que a COP não abordou. A linha vermelha que não devemos cruzar é a que leva nosso planeta acima do limite de temperatura de 1,5ºC".

No entanto, Pantoja aponta a falta de outros temas. “Os acordos relacionados ao artigo 6, que regulamenta também o mercado de carbono no mundo, essa pretensão poderia também ter sido mais ampla, poderia ter um avanço maior, mas não tivemos. Claro que certamente vai ficar próximo para a próxima conferência, já com outra configuração e com o Brasil certamente retomando o seu protagonismo nessa discussão e apresentando também em suas bases para estruturar esse mercado”, disse.

Participação brasileira

O discurso de Lula foi o destaque da participação brasileira. O petista fez uma declaração de 33 minutos na quarta-feira (16). Na fala, ele afirmou que o Brasil estava de ‘volta’ ao debate climático global e fez promessas para zerar o desmatamento, prometeu a criação do Ministério dos Povos Originários e ofereceu o Brasil como sede da COP 30, em 2025.

O Brasil não vive um bom momento da sua política ambiental, nos últimos anos, houve aumento do desmatamento, sucateamento de órgãos que fazem a defesa do meio ambiente, entre outros. Na visão de Pantoja, a vitória de Lula e as declarações sobre o tema indicam uma volta do protagonista do país no debate sobre o meio ambiente.

O especialista afirma, no entanto, que o futuro presidente terá dificuldades para restabelecer o protagonismo em âmbito internacional, principalmente na redução do desmatamento na Amazônia. Os dados do IPAM indicam que o desmatamento em terras públicas federais na Amazônia cresceu 56,6% de agosto de 2018 a julho de 2021 em comparação com período semelhante de 2015 a 2018.

“O desafio de reduzir o desmatamento não é simples. Vai exigir um conjunto de medidas estruturantes, como é um problema estruturante, requer também medidas estruturais para que seja reduzido. O desafio de reestruturar também uma política pública, não só a proteção da Amazônia, mas em termos de mudança do clima. É uma medida essencial que não é simples, e que não vai ser rápida, mas é um processo”, ressalta Pantoja.

Outra questão importante na visão do especialista é a retomada dos órgãos de controle, segundo ele, as instituições são importantes para a volta do protagonismo do país e também no trabalho contra o desmatamento, por exemplo.

“Com uma desconstrução e desestruturação dos órgãos que você acaba dando mais possibilidade para que os criminosos se utilizem dessa fragilidade e fiscalização para atuar. ICMBio, Funai, o Ibama e outros órgãos vão ser necessários para a retomada de reestruturação”, argumenta.

A promessa de Lula no discurso foi zerar o desmatamento até 2030. A medida, de acordo com Pantoja, é possível, mas precisa estar alinhada a um conjunto de ações, em especial políticas públicas apresentadas pelo governo federal. Ele ainda lembra que entre 2004 e 2012 o país reduziu a porcentagem em 84%.

Política ambiental

Para o desmatamento zero, o advogado cita quatro ações para serem adotadas: ordenamento territorial fundiário, comando e controle estabelecido, governança reestruturada, medidas de conjuntos de instrumentos econômicos, a alternativa econômica associada à medida de serviços ambientais e ações relacionadas ao código florestal do artigo 41. “Com essas medidas é possível alcançar essa meta, mas para vai precisar fazer oito anos em quatro, o processo vai ter que ser bem acelerado”, afirma Pantoja.

Como primeira política pública ambiental do novo governo, o especialista aponta para o combate ao crime dentro das florestas, assim como o combate à mineração e ao garimpo ilegal.

“Um elemento bem importante que eu destacaria, com necessidade imediata para reduzir desmatamento de forma imediata, não tem outra medida que não seja o comando do controle. Essa reestruturação dos órgãos ambientais da política de combate à criminalidade, é bom destacar que ninguém, pelo menos dentro do IPAM, está querendo criminalizar atividade econômica, é preciso deixar muito claro que precisa criminalizar os criminosos. Ninguém está querendo criminalizar a pecuária ou agricultura, mas é preciso respeitar o Código Florestal”, disse.

Ainda no discurso na COP, Lula cobrou países ricos pelo cumprimento dos acordos climáticos, criticou o governo Bolsonaro pela devastação do meio ambiente; pediu a inclusão de mais países no Conselho de Segurança da ONU e o fim do privilégio do veto de alguns países; prometeu punir garimpo, mineração, extração de madeira e agropecuária indevida; falou sobre a criação de Aliança Mundial pela Segurança Alimentar; e propôs a Cúpula dos Países Membros do Tratado de Cooperação Amazônica, com Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela.

Após o resultado do segundo turno da eleição presidencial, a Noruega afirmou que irá reativar o Fundo Amazônia, o repasse estava suspenso desde 2019. O país interrompeu o pagamento em razão da alta nos casos de desmatamento e das políticas ambientais do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL).

O Fundo Amazônia foi criado em agosto de 2008, por meio do Decreto nº 6.527, o objetivo da iniciativa é captar doações para investimentos em prevenção, monitoramento, combate ao desmatamento, de promoção, conservação e do uso sustentável da Amazônia Legal. O repasse é gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que também faz captação de recursos e monitora os projetos apoiados.

O bloqueio das doações da Noguera e da Alemanha começou a partir de uma decisão do à época ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Em 2019, ele extinguiu os colegiados Comitê Orientador e o Comitê Técnico.

Com as decisões, a Noruega interrompeu os repasses já em agosto de 2019. O país suspendeu R$ 133 milhões por não concordar com a política ambiental de Salles. A área com alertas de desmatamento na Amazônia Legal cresceu 85,3% em 2019 em comparação com 2018, segundo os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Assim como a Noruega, a Alemanha suspendeu cerca de R$ 155 milhões naquele ano.

O especialista ainda conta o que observou na COP27 as conversas dos outros países com o Brasil.

“Todo o compromisso que o presidente eleito já anunciou é positivo. Ele já tem colocado em suas falas primeiro sobre a retomada do Fundo Amazônia, a reinserção do Brasil com o protagonismo internacional no tema de clima e meio ambiente. O respeito e a valorização às populações tradicionais e povos indígenas. Essa retomada de estratégias nacionais para reduzir o desmatamento e o fortalecimento dos órgãos de ciência na Amazônia. Esse conjunto de informações trouxe um novo ambiente para a própria conferência”, disse.

“Nós percebemos essas interlocuções com representantes de outros países. Eu penso que essas medidas trazem um conjunto de outros potenciais benefícios que o Brasil pode adquirir. A gente ouviu as discussões com Noruega, Alemanha, França, Reino Unido, Estados Unidos com o interesse em aumentar, fortalecer e restaurar a cooperação internacional de uma forma mais estruturada com o Brasil”, completa Pantoja.

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