"Salve, rapa! Salve, massa!"

Como diz Mano Brown, Mano a Mano parece Jurassic Park só vem monstro!

E no episódio desta semana que a coluna apresenta com exclusividade não será diferente. Muita gente pode não reconhecer o nome, mas a história, com certeza, já fez parte da vida de muitos apreciadores da música negra no Brasil.

Asfilófio de Oliveira Filho, mais conhecido como Dom Filó, personalidade e referência da cultura black no Brasil é o convidado do Mano a Mano, podcast apresentado por Mano Brown no Spotify.

A importância da história do movimento negro no Brasil, as batalhas da cultura black [que seguem até hoje] e suas derrotas e conquistas permearam as mais de duas horas de papo do episódio que a plataforma disponibiliza nesta quinta-feira (16).

A gravação aconteceu na última quinta (9) em um estúdio na zona oeste de São Paulo. Eu, como convidada, acompanhei a aula ao vivo. Digo aula sem qualquer exagero. Como ouvinte já tive essa sensação várias vezes e, presencialmente, veio a confirmação de que o clima contribui para o resultado. De um lado um MC contemporâneo àvido por conhecimento, com forte poder de escuta. De outro, um ícone carioca que vivenciou a construção da cena black numa época de recursos escassos.

É muito impressionante a expectativa pela chegada de Brown, mesmo que seja para uma pequena plateia. Arrisco dizer que é a mesma do público do Racionais enquanto o espera soltar as primeiras rimas em cima do palco. A responsável pelas comidinhas ansiosa pela aprovação das guloseimas, a produtora preocupada se o amigo iria curtir o quadro com imagem de Ogum que encomendou para presenteá-lo e a equipe técnica cuidando dos últimos detalhes para que a gravação ocorresse sem qualquer imprevisto. E assim foi até o final.

Ao chegar, Mano Brown acompanhado pela mulher e empresária Eliane Dias, cumprimenta um a um e cola na jornalista Semayat Oliveira. É hora de trocar ideias sobre alguns pontos a serem abordados pelo convidado. Eles chegam ao ponto de que é importante colocar as referências dos livros citados nos episódios. Aliás, obras, autores, referência e assuntos sobre formação intelectual é o papo principal nos bastidores.

Eliane Dias relembra que José Luiz Griot, antigo dono de uma livraria especializada em cultura negra na galeria Metrópole, no centro de São Paulo, envia inúmeros livros ao companheiro. Outro livro citado nos bastidores é o best-seller internacional "Sapiens - Uma Breve História da Humanidade", de Yuval Harari. Ary Nogueira, sócio da agência Gana, comenta passagens da obra e presenteia Brown com "Amanhã Vai Ser Pior", de Marcelo Conde, e "Okê Oxossi", de Abdias Nascimento.

Vindo do Rio de Janeiro, Dom Filó desembarca em São Paulo sob chuva e chega ao compromisso munido de mais livros. Ele oferecer a Brown exemplares de "Black Rio nos 70: A Grande África Soul", de André Diniz; "Dançando na Mira da Ditadura - Bailes Soul e violência contra a população negra nos anos 1970", de Lucas Pedretti, além de "Lábios de Cuba Libre", de Altay Veloso.

Ao longo das mais de duas horas de conversa, com uma forte chuva caindo do lado de fora, Mano Brown mostra que tem sede de conhecimento. Ele deixa claro também gosta de uma boa cronologia. É puxando pelos fatos do passado, sobre as festas pretas, moda retirada das capas dos discos que ele conduz o papo com Dom Filó, que por vezes esquece algumas palavras e se desculpa com a frase "o HD está cheio", em referência ao termo técnico usado para citar armazenamento dos computadores. Lá do meu canto dá vontade de soltar um "sim, cheio de conhecimento". A propósito, por vários momentos, é difícil se manter calada diante dos "arquitetos" da música.

A narrativa sai dos primórdios do Renascença, clube dedicado ao fomento das manifestações culturais da comunidade negra, situado em Andaraí, no Rio de Janeiro, passa pela fundação da Black Rio nos anos 1970, o boicote das gravadoras, as roubadas em São Paulo até a criação da Cultne TV, plataforma que reúne o maior acervo da cultura negra da América Latina.

Idealizador do projeto, Dom Filó cita com orgulho os conteúdos sobre esporte, cultura, política, turismo, gastronomia, arte, música e literatura do povo negro. Tudo on line e gratuito, sem ter que fazer cadastro. É só se jogar e se surpreender com o material. Acesse aqui. 

O Mano a Mano derruba a conclusão de estudos que podcasts devem ter em média 22 minutos. O papo de Brown com Dom Filó teria fôlego para muito mais de duas horas. Assim como aconteceu com outros convidados que você pode relembrar clicando abaixo.

Essa é a segunda temporada do podcast. A primeira estreou em 26 de agosto do ano passado. Brown mostra a diversidade de convidados desde os primeiros episódios quando recebeu nomes como Glória Maria, Wagner Moura, Gloria Groove, Taís Araújo e Lázaro Ramos, Ludmilla, Vanderlei Luxemburgo, Fernando Holiday, Drauzio Varella, entre outros. O programa com a participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi o mais escutado no Spotify no Brasil em 2021.

Mano a Mano tem direção criativa de Spotify Studios e GANA e produção de Spotify Studios, Mugshot e Boogie Naipe.

Livros e quadro que Brown recebeu de presente

Quadro da Ori FineArt: https://orifineart.com.br/
Siga no Instagram

Sapiens - Uma Breve História da Humanidade
Autor: Yuval Harari

Amanhã Vai Ser Pior
Autor: Marcelo Conde

Okê Oxossi
Autor: Abdias Nascimento

Black Rio nos 70: A Grande África Soul
Autor: André Diniz

Dançando na Mira da Ditadura - Bailes Soul e violência contra a população negra nos anos 1970
Autor: Lucas Pedretti

Lábios de Cuba Libre
Autor: Altay Veloso

Serviço
Mano a Mano com Dom Filó
Apresentação: Mano Brown
Onde: Spotify - gratuito para ouvir e baixar
Quando: 16 de junho - quinta-feira

Adriana de Barros é apresentadora do programa Mistura Cultural nas mídias digitais da TV Cultura e da Rádio Cultura Brasil, editora do portal da TV Cultura, jurada de música da APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte de São Paulo) e jurada de música do Prêmio Arcanjo de Cultura.

Siga @DriBarrosReal