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Estamos no final do ano (e que ano, diga-se de passagem). Natal e Réveillon trazendo as tradicionais promessas de “vou mudar” e reflexões, mas, também festas (via videoconferência) e muito panetone, não nos esqueçamos do panetone. Ou seja, pitadas de espiritualidade com diversão.

Esse clima me faz lembrar de uma das séries que mais amo nos quadrinhos, lançada no Brasil infelizmente de forma incompleta: o Sr. Destino do grande escritor norte-americano J. M. DeMatteis.

O Sr. Destino é um dos primeiros super-heróis da DC Comics, criado em 1940 na chamada Era de Ouro dos quadrinhos norte-americanos. Kent Nelson conseguiu seus poderes mágicos lendo livros de ocultismo da Biblioteca de Alexandria, no Egito, cortesia do escritor Gardner Fox e do ilustrador Howard Sherman.

Quase cinco décadas depois, J.M. DeMatteis pega o personagem para escrever. A princípio, em uma minissérie em quatro números. Depois, com o sucesso, em sua revista mensal. O roteirista manteve sua ligação com misticismo e supervilões uniformizados, mas resolveu ampliar o escopo para a jornada de uma vida. Ou vidas.

O início começa com um final: Kent Nelson, o Sr. Destino original, morre. E a identidade de Sr. Destino recai sobre Eric Strauss, um menino de dez anos cujo corpo foi envelhecido artificialmente para virar adulto - sim, sei que é estranho, mas estamos falando de uma obra de super-heróis e de magia.

Aos poucos, DeMatteis cria um maravilhoso rol de personagens ao redor de Eric – todos com um pé no sobrenatural, mas profundamente humanos. Seu tutor é Nabu, uma espécie de criatura divina que ajudava o Sr. Destino original; Petey, um hilário demônio vindo de outra dimensão; e Linda, a madrasta que ele mal conhecia e que tem, embora ela mesma não saiba, uma ligação com a magia.

A série de DeMatteis foi uma viagem, tanto espiritual quanto hilária, pelo universo da DC Comics. Teve muita magia, claro, porque é um personagem essencialmente místico, mas foi além disso. Apareceram de heróis desconhecidos, como Andrew Bennett (“Eu... Vampiro”), a grandes vilões – com uma das mais incríveis interpretações de Darkseid, criatura assustadora que você verá no filme da Liga da Justiça a ser lançado ano que vem.

Mas, acima de tudo, o Sr. Destino foi uma viagem com muito coração. As inseguranças de Eric e Linda e o amor que sentem um pelo outro vão crescendo e envolvendo a nós, leitores, em um mundo de caos provocado pela magia (um personagem é um cadáver ambulante) cuja única constância são os relacionamentos humanos. Amizade, carinho, companheirismo – amor em muitas de suas formas.

Quando uma pessoa que você ama se aproxima da morte, como lidar com isso? É uma dor imensurável. Isto ocorreu em uma passagem do Sr. Destino, e o discurso de um personagem muito espiritualizado da série me marcou. Sei, por entrevistas, que DeMatteis e eu temos religiões diferentes. A fé do personagem que faz o discurso não é explicitada. E que importa se fosse? Importa o conteúdo, certo? Pois aqui vai um trecho dela:

“Algumas almas viajam lado a lado em cada encarnação. Seus vínculos são tão poderosos... Seus carmas são tão fortes... Que não importa o quanto se distanciem, elas nunca estão a mais do que um batimento cardíaco de distância. Centenas de milhões de encarnações humanas... Você imagina quantas delas nós dois passamos juntos? Todas. Todas! Como mãe e filho, como amigos, como mestre e discípulo, marido e mulher, irmãos, irmãs, rivais, amantes, até mesmo inimigos! Nós sempre estivemos juntos e sempre estaremos... até que nossas danças cheguem a seu infindável término!”

A fase de DeMatteis com o Sr. Destino teve 29 histórias, das quais apenas 18 foram publicadas no Brasil – as quatro primeiras na antiga “Super-Homem”, as demais em “DC 2000”, ambas da editora Abril. Este material nunca foi republicado, nem lá fora, nem aqui. No ano passado, o próprio DeMatteis escreveu sobre ela no Facebook:

“Se há uma série minha que eu adoraria ver novamente impressa, em uma edição coletiva, é a Sr. Destino. Todos esses anos depois, ela permanece próxima e querida ao meu coração, profundamente gravada em minha alma.”

Na minha também, DeMatteis. Muito obrigado a você por isso.

Aproveito para desejar um feliz Natal e um ótimo 2021, cheios de amor e magia, para você e sua família, leitor.

Pedro Cirne é formado em jornalismo, desenhos e histórias em quadrinhos. Nascido e criado em São Paulo, é filho de um físico luso-angolano e de uma jornalista paulistana.

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